“Ele não era perfeito.” A frase, repetida, amiúde, pelo bisneto de Aristides de Sousa Mendes, Silvério de Sousa Mendes, pretende deixar claro que, ao longo da sua vida pessoal e profissional, o cônsul Aristides de Sousa Mendes cometeu erros e teve falhas. Mas tudo isso fica colocado num plano secundaríssimo, quando comparado com a acção que o leva a merecer, hoje, um lugar no Panteão Nacional: o acto de desobediência ao regime de António de Oliveira Salazar, ao passar milhares de vistos aos refugiados que bateram à porta do consulado português em Bordéus, França, em 1940, quando ali exercia as funções de cônsul.
Gémeo de César de Sousa Mendes, Aristides cursou Direito em Coimbra, como o irmão, e ingressou na carreira diplomática. Teve 14 filhos com a sua mulher Angelina, e a numerosa família acompanhou-o pelos vários países em que exerceu uma posição consular, de Zanzibar a Bordéus. Teve também uma outra filha, fruto de uma relação com a francesa Andrée Cibial, com quem se casaria após a morte da primeira mulher. Alvo de um processo disciplinar pelo seu acto de desobediência, foi afastado da carreira diplomática e impedido de exercer advocacia pelo regime ditatorial. Sem meios dignos de subsistência, morreu na miséria, em Lisboa, na Ordem Terceira de S. Francisco. Reconhecido internacionalmente como herói, tardaria em sê-lo também em Portugal, mas em 1987 o então Presidente da República, Mário Soares, concedeu-lhe a título póstumo a Ordem da Liberdade, e no ano seguinte a Assembleia da República reintegrou-o no serviço diplomático. Marcelo Rebelo de Sousa atribuiu-lhe a Grã-Cruz da Ordem da Liberdade em 2017.