Exposição
Em Guimarães, Joana BC expõe aquilo em que pensa, mas não diz — “por uma questão de educação”
Joana BC deixou a cidade para ir viver no campo há dois anos; volta para apresentar dois trabalhos em Guimarães. Até 23 de Outubro, os visitantes do Centro para os Assuntos da Arte e Arquitectura podem descobrir o universo da antiga professora das Belas Artes do Porto.
O Centro para os Assuntos da Arte e Arquitectura (CAAA), em Guimarães, acolhe, até 23 de Outubro, a exposição Coisas em que eu penso mas que não digo (por uma questão de educação), da artista Joana BC. Esta mostra desdobra-se em dois trabalhos da autora — A vida de Parsimim, de 2018, que ganha agora vida em livro, e o mais recente Geografia sentimental: como se monta um oásis.
Quem entra na primeira sala do CAAA encontra duas séries de 23 colagens — A vida de Parsimim (segundo a senhora que lê as palmas das mãos) e O meu nome é Parsimim —, bem como um extenso mural. Parsimim é “uma personagem completamente inventada”, diz a artista, apesar de admitir que, de certa forma, podia ser a própria. As mãos são o elemento que liga as colagens e o mural. Aliás, a pintora destaca três elementos constantes no seu trabalho: as mãos, os olhos e os cabelos, pela simbologia que reconhece a cada um deles. “As mãos, pelo que dizem sobre nós; os olhos, pelo que vemos ou como percepcionamos a vida através deles, e os cabelos como força vital, sempre em crescimento e que testemunham todas as eras pelas quais passamos.”
Ao P3, Joana BC refere que o seu “trabalho é sempre muito biográfico”. Pretende dizer “coisas sérias a brincar." Mas adverte que “não se trata de uma linguagem infantil": "Trata-se de dizer as coisas de uma forma menos agressiva visualmente, embora os temas, muitas vezes, o sejam.”
Na segunda sala está o seu trabalho mais recente, Geografia sentimental: como se monta um oásis, um reflexo da experiência da artista que há dois anos deixou o Porto para ir viver para o interior, perto da Serra da Estrela, “com toda a beleza e a crueldade que isso implica”. O legado da avó despertou-a e inspirou-a. Antigas revistas — de croché, de costura e de culinária — e os novelos de lã da antiga loja familiar tornaram-se o “recreio” da artista plástica. Desse tesouro nasceu esta série de colagens, que procura questionar a “posição da mulher na sociedade de hoje, como ela é vista, a pressão que existe sobre ela, o machismo que ainda se nota”. “As coisas vêm ter comigo e depois faço algo com elas”, revela a artista.
Os textos e os títulos são “realmente importante em todos os trabalhos”, diz Joana BC. É um “labor paciente que os acompanha", adianta a artista, e que faz com esses elementos se tornem parte integrante da obra. Para ela, as colagens são como um “anti-post do Instagram": "Se no Instagram se dispensam os textos, nas colagens são complementares.” A cultura do Instagram é algo que confunde a artista, apesar de também estar presente naquela rede social.
Aos 35 anos, optou por outro modo de vida. No interior, "há uma maior comunhão com o dia, com as estações — e tempo para criar", admite a antiga professora da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto (FBAUP), cidade que trocou por uma aldeia da Serra da Estrela, onde cultiva o que come e encontra sintonia com a natureza.
Formada na FBAUP e na Slade School of Fine Art, em Londres, Joana BC trabalha sempre sozinha. “Há a questão da manualidade, da atenção, do cuidado em que cada ponto é um desenho, cada ponto é um traço. E essa energia, essa dedicação é muito importante”, confessa. Até porque recorre a materiais que lhe “dizem muito e pelos quais tem o máximo respeito”.
Texto editado por Amanda Ribeiro