Fuga de João Rendeiro “gera grande desconforto social”, mas é do foro judicial, diz ministra da Justiça
Numa semana difícil para o Governo, o Conselho de Ministros atirou ao lado. Nem uma palavra sobre os “equívocos” em torno do chefe de Estado-Maior da Armada ou o conflito aberto entre os ministros das Finanças e das Infra-Estruturas por causa da CP. Apenas a fuga de João Rendeiro à Justiça mereceu alguns comentários.
A julgar pela conferência de imprensa final do Conselho de Ministros desta semana, a reunião do Governo deixou de fora todos os temas políticos escaldantes da semana: o confronto com o Presidente da República sobre a exoneração e substituição do chefe de Estado-Maior da Armada (CEMA), o conflito em campo aberto entre o ministro das Infra-Estruturas, Pedro Nuno Santos, e o ministro das Finanças, João Leão, em torno da falta de meios para a CP que culminaram com a demissão do seu presidente do conselho de administração, e mesmo a fuga de João Rendeiro à Justiça.
Apenas este último tema mereceu alguns comentários da ministra da Justiça — que estava no briefing para anunciar a aprovação de novas regras de insolvência —, mas para dizer que o problema é do “foro judicial” e não do Governo. “Este resultado gera grande desconforto social e também desconforto entre agentes da Justiça”, reconheceu Francisca Van Dunen, mas logo frisou que se trata do resultado de “decisões tomadas no âmbito do poder judicial, nas quais o Governo não intervém”.
Questionada sobre se pondera propor alguma alteração legislativa para evitar a repetição de fugas à Justiça, até porque não é a primeira vez que acontece, a ministra considerou “prematuro antecipar alterações legislativas”. “Não podemos mudar a lei a cada caso”, defendeu. Tratando-se de “matérias do foro judicial, as responsabilidades serão apuradas nesse foro” e só depois, “com mais informação sobre os factos e então com mais propriedade” admitiu “ponderar” sobre a necessidade de mudanças na lei.
Confrontada várias vezes com o assunto pelos jornalistas, Van Dunen reconheceu que casos destes “são processos que afectam bastante a sociedade portuguesa”, mas sublinhou que “a regra não é esta, não é um padrão”, nem lhe ocorre “nenhum outro caso [de fuga] em criminalidade económico-financeira”. Lembrou ainda que está em debate no Parlamento a Estratégia Nacional Anticorrupção, no âmbito da qual estão previstos acordos sobre a pena aplicável.
Já sobre as outras duas polémicas que envolveram o Governo esta semana, nem uma palavra. Questionado várias vezes sobre o conflito entre Pedro Nuno Santos e João Leão por causa da CP, o secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros afirmou e repetiu que “o Conselho de Ministro não é o lugar para fazer comentários a declarações de membros do Governo”. Questionado sobre a aprovação de despesa na CP, limitou-se a dizer que não foi tema da reunião, até porque se trata de “competências que estão atribuídas a membros do Governo em concreto”.
Já sobre os “equívocos” em torno da exoneração do CEMA, André Moz Caldas disse que o assunto “não fazia parte da agenda” do Conselho de Ministros e que não foi ali tratado. O PÚBLICO ainda perguntou se o Conselho de Ministros se tinha abstido de fazer debate político, e André Moz Caldas respondeu: “O Conselho de Ministros cumpriu a sua agenda, e, apesar de ter competências de natureza política e administrativa, as matérias em causa não foram colocadas na agenda e não são comunicadas no briefing do Conselho de Ministros.”
Para o Governo, a questão ficou, aliás, encerrada com o comunicado de quarta-feira da Presidência da República. “Quanto à questão do chefe de Estado-Maior da Armada, aquilo que me pergunta não é a respeito de factos, é mais a respeito de uma avaliação sobre os factos e eu repito o que disse há pouco: o senhor Presidente da República produziu um comunicado e, portanto, o assunto está, desse ponto de vista, encerrado”, respondeu o secretário de Estado, citado pela Lusa, perante a insistência da comunicação social.
Presente no briefing estava ainda a secretária de Estado dos Assuntos Europeus, Ana Paula Zacarias, que anunciou ter sido aprovada uma proposta de resolução, a submeter ao Parlamento, que concretiza o acordo sobre mobilidade entre países da CPLP acordado em Luanda, no qual se flexibilizam as estadias de curta duração e os vistos de residência de cidadãos destes países, especialmente para docentes, estudantes, empresários e desportistas. Questionada sobre a sua saída do Governo, já anunciada mas ainda não concretizada, Ana Paula Zacarias confirmou que voltará à carreira diplomática, “quando houver o movimento diplomático”. Esta confirmação deixa uma pista sobre a próxima remodelação do Governo.