O dicionário que quis ser império e falhou
Porquê a insistência na “incapacidade” de “estreitar a aproximação ortográfica da língua”, quando a história demonstra existir um progressivo e natural afastamento?
Pelos vistos, até acabar o ano continuamos em maré de celebrações com números redondos. Desta vez não é um disco, mas um dicionário. Aliás, dois, publicados curiosamente quase em simultâneo, no mesmo ano de 2001: o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea editado em Portugal pela Academia das Ciências de Lisboa (ACL) e o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, este editado no Brasil. Mas enquanto o primeiro, a crer na nota publicada na página da ACL, prepara uma nova edição para colocar em linha, o segundo voltou a ser falado entre nós por via de uma entrevista que Mauro Villar, sobrinho de Antônio Houaiss (1915-1999) e director do instituto com o nome do tio, deu há dias ao Expresso. Sem surpresa, um dos temas abordados foi o do malfadado Acordo Ortográfico (AO90). Disse Mauro Villar, a dado passo, em resposta à jornalista Christiana Martins: “Se tantos e tão diversos povos, com óbices linguísticos tão maiores do que os nossos, conseguiram unificar o modo de grafar as suas línguas e dialetos [sic], por que não Brasil e Portugal, com usos tão semelhantes? Seremos incapazes de nos entender para estreitar a aproximação ortográfica da língua?” Mas noutra passagem disse algo bem diferente: “Atente-se, porém, para que óbices com formas variantes e padrões ortográficos diversos obviamente não existem só no português.” Sim, nós sabemos. Mas porquê esta insistência na “incapacidade” de “estreitar a aproximação ortográfica da língua”, quando a história demonstra existir um progressivo e natural afastamento?
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