IHRU desocupa casas habitadas por duas famílias, em Gaia
Casas vazias tinham sido ocupadas há vários anos, por famílias em dificuldade. Associação Habitação Hoje! lamenta falta de resposta para as pessoas afectadas.
Aos olhos da lei é uma desocupação, para quem fica sem habitação e sem alternativa, é um despejo. Duas famílias estão a ser retiradas das casas onde viviam há vários anos, no bairro de Cabo-Mor, em Vila Nova de Gaia, numa intervenção ordenada pelo tribunal, a pedido do proprietário, o Instituto da Habitação e da reabilitação Urbana. Organismo do Estado que, para a associação Habitação Hoje!, que tem acompanhado este caso, não está a cumprir a lei.
Ocupar uma casa é um acto ilegal. Mas a própria legislação do arrendamento apoiado indica, no artigo 28.º, que “os agregados alvos de despejo com efectiva carência habitacional são previamente encaminhados para soluções legais de acesso à habitação ou para prestação de apoios habitacionais”. E não é isso que está a acontecer, garante ao PÚBLICO Beatriz Ferreira, daquele movimento.
No entanto, ao final da tarde, o IHRU, garantiu que esse aspecto não foi descurado. “Sendo um processo cuja sentença foi determinada pelo tribunal, cabe a esta entidade promover a articulação com a Segurança Social para que se encontre alternativa e seja prestada ajuda, situação que foi aqui acautelada. Ainda assim, a presença da Segurança Social, para assegurar o acompanhamento das famílias, é requerida pelo próprio IHRU no momento em que intenta o processo em tribunal, tendo em conta a importância de acompanhar estes agregados”, explicou, por e-mail, aquele instituto público.
Uma das famílias que ficou sem casa tem três filhos, o mais novo com três meses de idade. No terreno, de manhã, estava um representante do tribunal e elementos da PSP e da polícia municipal para proceder à vedação das casas e garantir um perímetro de segurança. Em resposta às questões suscitadas pelo PÚBLICO, o IHRU adianta que, no caso em concreto, a informação de que dispõe, “por parte do tribunal e em função do acompanhamento in loco da desocupação, é a de que a Segurança Social está já a prestar apoio a estas famílias”. Acrescenta ainda “que estas famílias continuam a ter todo o direito a aceder, nos termos legais, a uma resposta de habitação pública”.
Desocupações retomadas este ano
O caso tem anos e o conflito entre o IHRU e 11 famílias que esmoreceu durante a pandemia, mas desde que a situação começou a regressar a uma certa normalidade, o instituto retomou os esforços para reaver as casas. “Disseram a uma das famílias para ir ao tribunal. Eles estão nesta casa há sete anos, querem pagar renda, mas isso nunca foi aceite. Eles não conseguem suportar uma renda de mercado”, assinala Beatriz Ferreira, que lamenta que não haja quem apoie juridicamente estas pessoas.
Tal como acontecera em Junho passado, o IHRU insiste que “as situações aqui identificadas não correspondem efectivamente a qualquer processo de despejo, mas antes a processos de desocupação, por motivo de ocupações ilegais promovidas em habitações do IHRU”. Aquela entidade acrescenta que “estas ocupações, ilegais, não só impedem a concretização das operações de conservação dos imóveis em causa como prejudicam, de forma inaceitável, o realojamento das famílias que aguardam, em listas de espera ordenadas, a atribuição de uma habitação pública”.
Município apoia IHRU e Tribunal
Em resposta a um pedido de esclarecimento do PÚBLICO, a Câmara de Gaia garante que "não foi informada" desta acção de desocupação, mas sublinha “que as regras são para cumprir, não sendo toleráveis ocupações de casas já destinadas a famílias carenciadas”. Apesar desta urbanização social ser da responsabilidade do IHRU, o município de Gaia explica que “acompanha as realidades sociais do concelho”, além daquilo que são as suas competências próprias em matéria de habitação.
“A questão do bairro de Cabo-Mor decorre de uma ocupação ilegal por parte de famílias. Não se questiona se as famílias precisam ou não; o problema é outro: ao promoverem uma ocupação ilegal e clandestina, estão a retirar o lugar a outras famílias que cumprem a legalidade com condições sociais para beneficiarem de habitação social. Dessa forma, o Município entende que deve ser reposta a legalidade. Não se pode aceitar a ilegalidade e a violação das normas, prejudicando famílias devidamente inscritas e a quem foi atribuída habitação que nunca ocuparam, por efeito das ilegalidades ocorridas”, insiste o município.
Consequente com esta visão dos acontecimentos, a autarquia solidariza-se “com o IHRU e com o tribunal, apelando às famílias da ocupação clandestina que se inscrevam legalmente e actuem dentro do quadro legal, para terem os apoios que possam justificar”, refere o gabinete de comunicação, em resposta ao PÚBLICO.
Noticia actualizada às 19h45 com as explicações do IHRU sobre este caso