NATO culpa Governo afegão por “tragédia” na retirada e promete atacar redes terroristas

Secretário-geral revela que nenhum país da aliança atlântica se disponibilizou para assumir o papel de liderança da missão no Afeganistão, depois do recuo dos EUA. Taliban dão a primeira conferência de imprensa esta terça-feira.

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Jens Stoltenberg disse que a NATO "deve aprender com o que aconteceu" EPA/FRANCOIS WALSCHAERTS / POOL

O secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, alinhou com o Presidente dos EUA, Joe Biden, nas críticas ao Governo e às forças armadas do Afeganistão pela sua abrupta rendição perante o avanço dos taliban.

Segundo o responsável, “a liderança política afegã falhou, e essa falha levou à tragédia a que estamos a assistir hoje”.

“Os aliados assumiram o risco da retirada porque sabiam que a alternativa não era a manutenção de uma presença limitada, mas sim o reforço da presença das tropas da NATO e um regresso aos combates”, afirmou o responsável.

“É fácil perceber a nossa frustração quando vemos que tantos anos de esforços de toda a comunidade internacional não deram os melhores resultados no que diz respeito às estruturas do Estado afegão.”

"Aprender com os erros"

Mas o secretário-geral da NATO, que falou após uma reunião sobre as implicações militares da tomada de poder pelos taliban, também disse que a aliança tem de “aprender com o que aconteceu”.

“A rapidez do colapso [do Governo afegão] foi surpreendente. Há lições que têm de ser estudadas”, disse Stoltenberg.

Numa confirmação do que já tinha sido dito pelo Governo britânico há mais de uma semana, Jens Stoltenberg disse que nenhum país da NATO quis assumir o papel de liderança na missão no Afeganistão a partir do momento em que os EUA se afastaram.

Stoltenberg disse também que a missão da NATO era ajudar a construir um Estado viável, e não manter uma presença permanente no Afeganistão.

Descrevendo o colapso do Governo afegão como “uma tragédia”, o responsável disse que a aliança irá “responsabilizar” os taliban por quaisquer violações dos direitos humanos, “incluindo os direitos das mulheres”.

Na mesma conferência de imprensa, esta terça-feira, o secretário-geral da NATO disse que a aliança vai manter-se “atenta” ao eventual aparecimento de redes terroristas no Afeganistão, admitindo lançar ataques a partir do exterior.

Tensão em Cabul

Esta terça-feira deverá ser o dia da primeira conferência de imprensa dos taliban depois de terem tomado o poder em Cabul, no domingo. O porta-voz dos fundamentalistas islâmicos, Zabihullah Mujahid, disse no Twitter que irá comparecer perante os jornalistas, esta terça-feira, numa sala de imprensa que era usada pelo Governo afegão. Horas antes, um outro porta-voz dos taliban foi entrevistado no canal Tolo por uma mulher jornalista.

Os habitantes de Cabul começaram a regressar às ruas da capital afegã, esta terça-feira, sem saberem ainda o que esperar do futuro Governo, e ainda receosos de novos confrontos.

“Eu tenho medo, mas tive de abrir a minha loja para alimentar a minha família”, disse à Reuters, por telefone, um comerciante de 48 anos identificado como Mohammadullah.

Segundo os habitantes ouvidos pela agência de notícias, a maioria das lojas e dos supermercados de Cabul estão encerrados, mas há algumas pequenas mercearias e talhos abertos ao público. Os poucos veículos que se vêem nas ruas são, na sua maioria, carrinhas com a bandeira branca dos taliban.

Um dos comandantes dos fundamentalistas islâmicos, Mawlavi Haq Dost, repetiu as promessas dos taliban de que as minorias “não vão ser importunadas”, e afirmou que “o sistema islâmico foi estabelecido no Afeganistão com o apoio da nação”.

Asadullah Wardak, um ginecologista que trabalha em Cabul há 12 anos, disse que decidiu regressar ao trabalho depois de dois dias fechado em casa. Os seus filhos, que vivem no Canadá, pediram-lhe que fugisse do Afeganistão, mas Wardak optou por ficar.

No caminho para o Hospital Sana, dois taliban pediram-lhe a identificação e revistaram-lhe o carro. Segundo Wardak, os homens disseram-lhe que podia seguir e deram-lhe um cartão com números de telefone, para onde deveria ligar se faltasse alguma coisa no hospital.

E disseram-lhe também para garantir que as mulheres — pacientes e médicas — sejam separadas dos homens no hospital, e que os médicos só possam receber pacientes do sexo feminino na presença de uma médica.

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