A despedida da prova mais longa quase deu bronze a João Vieira
Marchador português foi quinto nos 50km marcha, um evento que terá feito a sua última aparição nos Jogos Olímpicos.
Não há prova mais longa e mais dramática no atletismo do que os 50km marcha, em que os atletas lutam contra os adversários, contra as condições meteorológicas e contra si próprios, contra a vontade de desistir e a tentação de acelerar o passo — e o risco de serem penalizados. A brutalidade da prova está bem presente nas imagens de esforço extremo de todos os que nela participam e é bem frequente ver alguns destes marchadores desfalecerem. Os 50km estão a despedir-se dos Jogos Olímpicos e, em Sapporo, a cerca de 800 quilómetros de Tóquio, João Vieira quase chegou ao pódio.
O veterano marchador português, com muitas maratonas de 50km nas pernas, esteve bem perto das medalhas. Andou na perseguição ao primeiro durante toda a prova, só cedeu nos últimos quilómetros e terminou em quinto, o que para ele já é uma vitória – nunca tinha terminado a prova mais longa em Jogos Olímpicos, mas já tinha sido 10.º (Atenas 2004) e 11.º (Londres 2012) na versão mais curta, a dos 20km.
Todas as provas de estrada (marcha e maratona) foram transferidas para Sapporo para minimizar os efeitos das altas temperaturas e humidade elevada, para um circuito urbano com muita sombra. Vieira entrava na despedida olímpica da prova mais longa com o estatuto de vice-campeão mundial na “marcha do inferno” de Doha, em 2019, e como um candidato a “uma cereja”, como o próprio chamou às medalhas olímpicas.
Os primeiros a aventurarem-se na frente foram o francês Yohan Diniz, recordista mundial e campeão mundial em 2017, e o chinês Luo Yadong. Vieira, um mestre na gestão do esforço e do sofrimento, não foi atrás, mantendo o seu ritmo e esperando que esta primeira fuga rebentasse. Diniz cedeu logo depois dos 5km – viria a desistir pouco depois dos 30km, uma despedida inglória para o luso-francês, que nunca conquistou uma medalha olímpica – e Yandong andou sozinho na frente até aos 20km.
Vieira manteve sempre o seu ritmo e foi subindo posições, nunca perdendo muito contacto com os que estavam na frente. Aos 25km já estava em 18.º e, aos 35, já era sexto classificado, integrado num grupo perseguidor ao fugitivo Dawid Tomala. Ninguém iria conseguir apanhar o polaco, que aguentou a sua vantagem para segurar a medalha de ouro, com um tempo final de 3h50m08s.
Nos últimos quilómetros, o grupo perseguidor fragmentou-se e Vieira ficou para trás. O alemão Jonathan Hilbert ficou com a medalha de prata, enquanto o canadiano Evan Dunfee, que tinha sido quarto no Rio 2016, ficou com o bronze, depois de ultrapassar espanhol Marc Tur nos últimos metros. Vieira chegou logo depois, no quinto lugar, 1m20s depois do novo campeão olímpico.
“Fico muito contente com este resultado, um quinto lugar não é qualquer atleta que consegue e eu vim aqui lutar com todas as minhas forças. Consegui um lugar de finalista, o que é muito bom para a minha carreira desportiva, que já vai longa. Podem ser os meus últimos Jogos e, assim, cumpri o meu dever”, afirmou o marchador português de 45 anos à agência Lusa. “Foi bom, arrisquei e saiu o quinto lugar, estou contente. É o topo da carreira. Apesar de não ter sido uma medalha, um quinto lugar é muito bom. Depois da medalha de vice-campeão, só tenho de estar satisfeito”, acrescentou.
A medalha olímpica não entrou no palmarés do veterano atleta do Sporting, mas o quinto lugar nos Jogos Olímpicos é um bom testemunho da longevidade e qualidade de João Vieira, que em Doha, com 43 anos, se tinha tornado no mais velho medalhado de sempre em Mundiais de atletismo. Antes dessa prata, Vieira, que conta com 59 títulos nacionais na especialidade, já tinha no currículo um bronze nos 20km marcha nos Mundiais de 2013.