Novo Banco – Somos todos lesados do Governo
Já foram usados 85% dos 3,89 mil milhões de euros. E a probabilidade de serem usados muitos mais milhões até ao final é idêntica à de ser em dezembro o próximo Natal.
As comissões parlamentares de inquérito (CPI) têm vindo a merecer o reconhecimento dos portugueses, por, entre outros motivos, apurarem a verdade dos factos e as responsabilidades políticas. Terminou esta semana a mais longa das CPI – a comissão de inquérito às perdas do Novo Banco (CPI-NB).
Quando os vários partidos começaram a falar de uma CPI-NB, rapidamente o PS se chegou à frente. Não para se evitar mais danos aos lesados da venda do NB (já lá vamos), mas apenas para puxar a fita atrás e desviar o centro das atenções. Foi o PS o único partido a querer recuar até antes da resolução do BES, período já escrutinado na anterior CPI-BES, no qual, descaradamente, quis colocar o foco das atenções. Isso foi por demais evidente nas dezenas de inquirições e na versão preliminar do relatório final.
Mas, com esta peneira, não conseguiu o PS tapar o sol.
As responsabilidades do Governo de António Costa e Mário Centeno apuradas ao longo dos trabalhos desta CPI tornaram a peneira, que nos têm colocado à frente dos olhos, cada vez menos opaca.
Comecemos pelo dia 31 de março de 2017. Foram António Costa e Mário Centeno quem deu uma conferência de imprensa, anunciando o sucesso da venda do Novo Banco. Não foi o Banco de Portugal. Não foi o Governo com o Banco de Portugal. Foi apenas e só o Governo.
Quis o PS concluir nesta CPI que o Governo pouco ou nada teve a ver com a forma como foi vendido o NB. Como podia um Governo dar a cara por algo que não era seu? Quis o Governo assumir a paternidade de um lindo recém-nascido, de olhos verdes, com um futuro promissor, mas que, à medida que o tempo passava, se transformava num monstro do qual não queria cuidar e era preciso deixar à porta de um convento de Portugal?
E o que nos foi dito nesse dia? “A venda do NB não terá impacto direto ou indireto nas contas públicas.” Mentira. Já o sabíamos. Os trabalhos da CPI-NB permitiram comprová-lo. A auditoria do Tribunal de Contas também. A mesma auditoria que aponta falhas ao controlo das perdas do NB que são imputadas ao Fundo de Resolução (ou seja, indiretamente, imputadas a todos os portugueses).
Isto porque, entre março e outubro de 2017, nas negociações com o comprador, foi criado um mecanismo para capitalizar o NB (CCA) até ao limite de 3,89 mil milhões de euros (3.890.000.000,00), que nos fizeram crer que dificilmente viria a ser utilizado.
O que é certo é que dos 3,89mM € já foram usados 3,30mM € (85%). E a probabilidade de serem usados muitos mais milhões até ao final é idêntica à de ser em dezembro o próximo Natal.
O que esta CPI apurou, pelo seu vasto acervo documental e pelos diversos depoimentos, é que toda a gente sabia. Toda a gente sabia que o valor ia ser utilizado, se não pela totalidade, por um valor muito próximo disso. Governo, Banco de Portugal, Fundo de Resolução, Novo Banco e Comissão Europeia sabiam em 2017 que em poucos anos os 10 milhões de portugueses se tornariam os lesados da venda do NB.
Aquilo que nos foi vendido como um negócio cor-de-rosa, foi na verdade uma comunicação cor-de-rosa de uma venda ruinosa, que não acautelou devidamente o interesse dos portugueses e da qual todos somos lesados.
Apesar da opacidade da peneira que inicialmente nos colocaram, os trabalhos da CPI-NB permitiram ver lucidamente que somos todos lesados do Governo de António Costa.