“O Governo não está de pé atrás com o Bloco”, diz Duarte Cordeiro
No mês do arranque das negociações do OE2022, o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares explica qual o calendário que o Governo tem na mesa e diz que estão reunidas as condições para avançar para as conversas com os partidos, incluindo com o BE. Duarte Cordeiro lamenta que no ano passado o Bloco não tenha estado com o Governo a criar soluções para a crise diferentes das da direita.
Duarte Cordeiro reconhece que as autárquicas vão interferir no calendário de negociações do Orçamento do Estado para 2022 e adianta que, no final de Agosto ou início de Setembro, o Governo já quer ter uma “primeira versão” para mostrar aos partidos. O secretário de Estado, que é o pivot das negociações, lamenta que o BE tenha votado contra o OE deste ano já que o executivo tinha capacidade de alterar as respostas.
O Governo pede aos partidos apoio para o OE 2022 garantindo que até ao fim de 2021 as medidas deste OE são executadas. Isto não é pedir um cheque em branco?
Não. Pelo contrário. Estivemos um dia inteiro [terça-feira] reunidos a dar prestação de contas. Hoje podemos dizer: mais de metade do Orçamento está executada. Num Orçamento de grandes prioridades políticas, olhamos para os dados executados à data e vemos mais de 2500 profissionais contratados para o SNS, quando o objectivo anual fixado no OE é de 4200 profissionais. É mais de metade. Sentimos que estamos em condições de cumprir o objectivo anual. Isto não é um cheque em branco. Agora não se pode pedir para em Junho ter um Orçamento que vai até Dezembro totalmente executado. Há medidas que são executadas ao longo do ano, que têm prazos específicos para serem executadas.
O que se exigia a meio do ano era, da nossa parte, a capacidade de demonstrar, naquilo que eram a prioridades políticas do Orçamento, naquilo que eram as medidas negociadas com os partidos, que elas estavam com um andamento adequado, proporcional às necessidades - porque há matérias que não podemos estar a executar em Dezembro quando elas são necessárias em Janeiro - e, simultaneamente, que temos a capacidade de projectar que vamos executá-las. Estamos a falar de mais de 190 medidas negociadas com os partidos. É um número muitíssimo significativo. Nem todas estão com o mesmo nível de maturidade, mas nem todas têm o mesmo grau de importância ou necessidade.
Qual o calendário de negociações do OE 2022 com que o Governo está a trabalhar?
Primeiro tivemos estas reuniões de balanço com os partidos que viabilizaram o OE 2021. Depois do final desta sessão legislativa, do debate do estado da Nação, vamo-nos reunir. Convidámos os partidos que viabilizaram o OE 2021 e o BE para nos reunirmos relativamente à possível negociação do OE para 2022. Vamos ter de trabalhar com maior afinco ainda antes do processo das eleições autárquicas e depois com muita intensidade entre as eleições autárquicas e a entrega do OE que é a 11 de Outubro.
Vai haver aqui vários momentos de negociação. Ainda tem de haver uma primeira conversa de perspectivas, daquilo que é a nossa análise do que vai ser o OE 2022, ouvir aquilo que vão ser as prioridades dos partidos, quais são as linhas vermelhas para os partidos políticos no OE 2022. Depois trabalhar sobre uma proposta. Se calhar ter ainda uma conversa no final de Agosto, início de Setembro já apresentando uma primeira versão e depois reunirmo-nos com maior intensidade entre as eleições autárquicas e a entrega do Orçamento do Estado.
As negociações do OE 2021 com o BE foram muito duras e acabaram com o voto contra do BE. Que lições o Governo retirou e que pretende corrigir este ano nas negociações?
Tivemos uma atitude muito frontal e transparente no processo negocial do OE, inclusivamente com o BE. Muitas vezes confunde-se o processo de negociação do OE com dimensões mais de natureza pessoal sobre a avaliação ou não da confiança que existe sobre quem, num determinado momento, está à frente de um Governo ou de um partido. Isso tem de ser afastado. Vamos procurar negociar o OE com os partidos que viabilizaram este OE e com o BE na perspectiva do que são as necessidades do país e daquilo que é possível construir como resposta.
Olhamos um pouco mais para trás: nós comparamos a resposta de um Governo de esquerda tem dado à crise com a resposta que um governo de direita deu. O Governo de direita teve uma taxa de desemprego de 17%. Nós estamos com uma de 7%. Porque tivemos medidas específicas para apoiar a manutenção do emprego. Se temos de aprender alguma coisa do passado é o que é a resposta de um Governo de direita à crise e a resposta de um Governo de esquerda. Isso deve caracterizar quem apoiou e viabilizou.
Esse argumento não convenceu o BE no ano passado. O que correu mal?
Fizemos um esforço genuíno para procurar uma resposta diferente à crise por parte de um governo de esquerda. Lamentamos que o Bloco de Esquerda não tenha estado connosco a aprovar o OE e que não tenha estado connosco a criar soluções para responder de forma diferente à crise. Algumas das matérias em que hoje o BE vem dizer que tinha razão nós também demonstrámos ao longo da crise que tínhamos a capacidade, quando foi necessário, de modificar as respostas. Isso não dá simplesmente razão. Demonstra que nós temos a capacidade de o fazer. Não havia necessidade de votar contra o OE, porque nós temos a capacidade de, ao longo do ano, ir alterando as nossas respostas.
O Bloco tem de mudar então, é isso?
Não digo que o Bloco tem de mudar. Eu acho que o Governo não tem essa arrogância na análise que faz. O BE fez a sua análise política que é legítima. O Governo fez a sua análise política. Não posso é dizer que o Governo não está confortável com o tipo de resposta que deu à crise comparando-a com a que foi a resposta que existiu no passado. O que vamos procurar fazer genuinamente é procurar ter o máximo de apoio possível para continuar a ter uma resposta diferente. Entendemos que a crise ainda não passou e que a recuperação do país é algo que demora um período de tempo alargado. Vai necessariamente implicar o próximo ano e o ano seguinte. Para nós é muito importante o envolvimento do BE neste processo.
Mas à luz do que foram as negociações com o BE é possível ao Governo ir para novas negociações sem o Governo estar de pé atrás?
O Governo não está de pé atrás e está disponível para um entendimento com o BE, se o Bloco também o desejar.
Faz sentido remodelar agora ou depois das autárquicas? Como é que está a moral no Governo?
O Governo está totalmente empenhado no combate à pandemia e na recuperação económica. Estamos a viver um período exigente do ponto de vista da governação, o que se traduz naturalmente num desgaste na governação. Muitas vezes isso é visto do exterior com a necessidade de haver uma consequência. Do lado do Governo não. Porque estamos empenhados em resolver os problemas. Cabe ao primeiro-ministro fazer a sua avaliação sobre o Governo e o primeiro-ministro já a fez.