Funcionário exonerado por Medina diz que desconhecia envio de dados às embaixadas e justifica destituição com actual contexto pré-eleitoral
Responsável destituído rejeita responsabilidades e diz que nunca foi informado do envio de emails do Gabinete de Apoio à Presidência às embaixadas. “[É] minha convicção que, tanto as averiguações em curso pela CNPD como a auditoria externa anunciada pela CML, revelarão a adequação dos meus procedimentos e o cumprimento rigoroso das minhas funções.”
O antigo encarregado de protecção de dados da Câmara de Lisboa, Luís Feliciano, que foi exonerado do cargo depois da polémica em torno do envio de dados pessoais de manifestantes a embaixadas estrangeiras, diz que a sua destituição só se compreende “em face do actual contexto político e pré-eleitoral”, deixando assim uma contundente crítica a Fernando Medina, recandidato à presidência da autarquia. Até porque, assegura, nunca soube do envio de informação sobre os manifestantes às embaixadas até lhe ter chegado uma queixa sobre o assunto, a que deu razão e conhecimento disso ao gabinete do presidente, pedindo para mudar procedimentos.
Até agora, Luís Feliciano ainda não tinha falado sobre o assunto. Fá-lo agora num comunicado em que procura defender o seu “bom nome e reputação”. Para o antigo funcionário, há 30 anos na autarquia, é sua “convicção que, tanto as averiguações em curso pela Comissão Nacional de Protecção de Dados como a auditoria externa anunciada pela CML, revelarão a adequação dos [seus] procedimentos e o cumprimento rigoroso das [suas] funções”.
Luís Feliciano foi formalmente exonerado do cargo que ocupava desde Maio 2018 no passado dia 2 de Julho, depois de a sua destituição ter sido aprovada por maioria em reunião do executivo.
Por ter sido designado Encarregado de Protecção de Dados (EPD) do Município de Lisboa, assumiu também a função de coordenador da equipa de projecto para a implementação do Regulamento Geral sobre a Protecção de Dados (RGPD). Um “desafio” que, diz, assumiu “com espírito de missão, ciente da realidade muito diversificada e complexa da CML”.
Segundo nota Luís Feliciano, desde a primeira hora, sinalizou “aos decisores que o modelo encontrado [o] colocava numa situação incómoda pois enquanto EPD não poderia tomar decisões quanto aos tratamentos de dados, mas tão só aconselhar, sensibilizar, cooperar e ser o ponto de contacto com a Comissão Nacional de Protecção de Dados, interagir com os titulares dos dados e assegurar a realização de auditorias, o que não significa realizá-las”.
O antigo responsável revela ainda que, nem ele, nem a sua reduzida equipa, soube como eram tratados os dados sobre as comunicações de realização de manifestações na cidade, uma vez que tal nunca foi sinalizado pelo serviço competente, o Gabinete de Apoio ao Presidente da Câmara de Lisboa. “Esta falha no levantamento e ausência de registo não poderia ser por mim controlada precisamente por a desconhecer”, nota.
Luís Feliciano diz ainda que a informação de que dados pessoas estavam a ser partilhados com embaixadas estrangeiras lhe chegou a 22 de Março de 2021, “na sequência de reclamação feita em 18 de Março pelos titulares dos dados”. “Neste contexto, enquanto EPD procedi às devidas averiguações e, em 18 de Abril, remeti como me competia ao Gabinete de Apoio ao Presidente da CML o parecer que, além de dar razão aos titulares dos dados, aconselha a alteração de procedimentos para que sejam adequados às regras do RGPD”, explica.
Luís Feliciano lembra que essa actuação foi até “objecto de agradecimento público por parte do Senhor Presidente da CML, na primeira intervenção pública que fez sobre este assunto no dia 10 de Junho”, sublinhando ser para si evidente que esta actuação “não justifica a destituição do EPD” e que, por isso, não aceitou ser ele próprio a pedir a sua destituição.
Esta segunda-feira, soube-se também que o Ministério Público instaurou um inquérito para investigar a divulgação pela Câmara de Lisboa de dados pessoais de activistas russos à embaixada do país em Portugal, anunciou a Procuradoria-Geral da República (PGR) à Lusa.
A PGR indica que o processo se encontra em investigação no Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Lisboa e que a auditoria interna realizada pelo município "foi junta ao mesmo”. Esta auditoria concluiu que, das 58 manifestações realizadas junto a embaixadas nos últimos três anos em Lisboa, em 52 a câmara enviou dados pessoais de manifestantes para as embaixadas visadas.
Este caso, tornado público a 9 de Junho, que gerou um turbilhão na política nacional. O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, considerou-o “efectivamente lamentável” e o candidato à câmara pela coligação encabeçada pelo PSD, Carlos Moedas, pediu mesmo a demissão de Medina.
Notícia actualizada às 18h03: acrescenta informação sobre a abertura de um inquérito por parte do Ministério Público