Lisboa tem dezenas de armadilhas para quem anda de bicicleta

São 30 as vias assinaladas pela MUBi como sendo as mais perigosas para quem se desloca de bicicleta devido ao excesso de tráfego e velocidade. Artur e Ana não as temem, mas reconhecem a insegurança.

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Rui Gaudencio

Artur Lourenço gosta de tudo o que envolve bicicletas desde que se lembra. Não percebe nada da sua mecânica, mas desenrasca-se a mudar os pneus. Há nove anos que acompanha a evolução do ciclismo urbano em Lisboa e, sendo utilizador frequente de bicicleta, mota e carro, consegue ter a perspectiva de cada condutor.

“Falta muita fiscalização, uma fiscalização efectiva da velocidade”, começa por afirmar. Apesar de reconhecer que Lisboa tem feito melhorias em várias zonas, ainda há locais muito perigosos. O ciclista percorre frequentemente toda a capital e afirma com confiança que já se sente “praticamente seguro” em toda a cidade... Menos na zona de Belém.

“Eu moro na zona Ocidental, no bairro de Caselas [freguesia de Belém]. E é atravessado todas as manhãs por pessoas que vão levar crianças ao colégio e querem evitar a Avenida das Descobertas. A zona de Belém está terrível, o trânsito é caótico”, afirma.

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Esta é uma das avenidas que mais insegurança traz ao ciclista, que acrescenta que “não é raro que os carros passem [pelos ciclistas] a altas velocidades”, o que leva a que seja naturalmente criada uma “cultura do medo”. Há pouco tempo, relembra Artur, estava a pedalar com uma amiga que queria começar a andar de bicicleta na cidade. Mas a experiência acabou por não ser a mais agradável e a vontade de optar por este meio de transporte perdeu-se.

Tal como Artur, também Ana Pereira considera a avenida das Descobertas uma das menos seguras. Ana começou a deslocar-se de bicicleta muito antes de chegar a Lisboa. Mas desde que está na capital, há cerca de 11 anos, que é o seu principal meio de transporte. É graças ao facto de contar já com uma elevada experiência que, dentro da insegurança, se sente segura, diz.

Para Ana, que é Bicycle Mayor de Lisboa desde 2019, “o risco rodoviário não é uma questão só de quem usa a bicicleta, mas também de todos os utilizadores de vias públicas. O risco é trazido pelo automóvel; por quem o conduz. E em todos os sítios onde é permitido aos automóveis circularem a velocidades mais elevadas é constituído um risco de atropelamento para os mais vulneráveis”.

Não se deixando deter pela sua vulnerabilidade, Ana reconhece que as avenidas não são fáceis. Circular em qualquer uma, seja ela a da Índia, Gago Coutinho, Estados Unidos da América ou Marechal Gomes da Costa, não é tranquilo, afirma. Isto porque avenidas largas que apresentam grandes rectas com mais que uma via, levam a que seja “facílimo os carros passarem os 50km/h. E circular no meio ou ao lado disto é física e psicologicamente desconfortável”.

A ciclista acrescenta ainda que “o que causa mais medo ou stress a quem anda de bicicleta são as ultrapassagens mal feitas, principalmente em intersecções, um dos sítios onde há mais colisões”. Por esse motivo, as rotas que a activista escolhe – dependendo da sua necessidade – oscilam entre vias com mais ou menos tráfego, mais ou menos íngremes e com maior ou menos exposição solar.

À semelhança da ciclista vitimada dia 26 de Junho, também Ana se deslocou de bicicleta quando estava grávida, algo que contribuiu para que a gravidez corresse de forma mais tranquila.

“A minha bicicleta salvou a minha saúde mental durante e depois da gravidez. Pedalei até ao dia do parto e de bicicleta eu não sentia que estava grávida. Sentia-me eu! Mais barriguda, mas eu”, partilha orgulhosamente.

Apesar de redobrar o cuidado para evitar possíveis quedas, a ciclista defende que “a avaliação de risco [neste tipo de deslocação] é pessoal e depende inteiramente da mulher (além das questões médicas). Eu valorizo a vida do meu filho por nascer, mas antes dele já valorizo a minha própria vida”, afirma, acrescentando que, se tivesse uma alternativa melhor, não iria circular, por exemplo, na avenida Gago Coutinho ou na marginal.

Para Ana, apesar de escolher a sua rota consoante as necessidades, “nunca é responsabilidade da vítima não ser vítima. Nós [ciclistas] queremos conforto; queremos uma viagem fisicamente confortável”.

Quando confrontados com a questão “quais as zonas de risco para quem utiliza bicicleta em Lisboa?” Artur e Ana destacam prontamente seis e sete vias, respectivamente, nas quais se inserem várias avenidas da cidade, locais de elevado tráfego.

No entanto, a MUBi, associação que se debruça sobre as questões que dizem respeito à mobilidade urbana em bicicleta, destaca 30 vias como sendo as mais perigosas a nível de excesso de velocidade e de tráfego. Além destas 30, a associação tem ainda sinalizadas oito intersecções perigosas e catorze zonas onde as infra-estruturas existentes para bicicletas e seus utilizadores são perigosas ou apresentam deficiências.

Texto editado por Ana Fernandes

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