Ministro dos Negócios Estrangeiros de Israel em visita histórica aos Emirados Árabes Unidos

Visita mostra a prioridade que o novo Governo israelita dá aos parceiros do Golfo e consolida normalização de relações que já permitiu assinar importantes acordos de cooperação – e que nem a ofensiva em Gaza beliscou.

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Yair Lapid com o ministro de Estado dos Emirados, Ahmed al-Sayegh, durante o seu encontro na capital, Abu Dhabi Reuters

O acordo foi assinado por Benjamin Netanyahu, mas é Yair Lapid, um dos líderes da coligação que afastou o antigo primeiro-ministro do poder, o primeiro membro do Governo da história de Israel a visitar oficialmente os Emirados Árabes Unidos. O novo ministro dos Negócios Estrangeiros israelita aterrou esta terça-feira na federação do Golfo Pérsico para inaugurar a embaixada do seu país em Abu Dhabi e um consulado no Dubai.

Dez meses depois do primeiro voo comercial de sempre a unir Telavive e Abu Dhabi e nove meses depois de Netanyahu e do ministro dos Negócios Estrangeiros dos Emirados, Abdullah bin Zayed, se terem sentado na Casa Branca de Donald Trump para assinar o acordo de normalização de relações entre os dois países, com uma ofensiva de Israel em Gaza pelo meio, chega por fim a visita que sela essa aproximação. Netanyahu bem quis ser ele o protagonista, mas viu-se obrigado a adiar por quatro vezes a viagem que planeou como parte da campanha para as eleições de 23 de Março

“A fazer história: tenho orgulho em representar o Estado de Israel na primeira visita oficial aos Emirados Árabes Unidos, obrigado pela calorosa recepção”, escreveu Lapid em árabe na sua página de Twitter, depois de ser recebido pelo ministro de Estado dos Emirados, Ahmed al-Sayegh, na capital, Abu Dhabi.

Desde a assinatura dos chamados Acordos de Abraão, promovidos por Washington, os dois países assinaram acordos alargados de comércio e cooperação, com trocas comerciais que terão já ultrapassado os 354 milhões de dólares (perto de 300 milhões de euros). Mais de 200 mil turistas israelitas viajaram nestes nove meses para os Emirados, diz o Ministério dos Negócios Estrangeiros israelita.

A federação de sete emirados foi a escolha óbvia da Casa Branca de Trump para primeiro país árabe a normalizar relações com Israel – entretanto, fizeram-no Bahrein, Sudão e Marrocos. “Houve anos de relações discretas entre Israel e os Emirados Árabes Unidos, e agora estamos a aproveitar os frutos dessa infra-estrutura de paz que construímos nas últimas décadas”, admitiu aos jornalistas o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros israelita, Lior Haiat, depois da partida de Lapid. Agora, sublinha, o ritmo da cooperação bilateral “não tem precedentes”.

E nem a ofensiva de Maio na Faixa de Gaza que fez 256 mortos entre os palestinianos, deixando mais de 1900 feridos (em Israel, morreram 13 pessoas), chegou para fazer abrandar o ritmo desta cooperação – adiando, naturalmente, alguns encontros ou projectos mais públicos.

"Apenas um atraso"

“As bombas israelitas arrefeceram um pouco o ardor do Outono, marcados pelos primeiros voos israelitas”, disse ao jornal francês Le Figaro um diplomata nos Emirados. “Mas não interromperam o processo de normalização nem desencadearam uma dinâmica inversa”, sublinha. “Houve apenas um atraso.” Porque teria sido malvisto “acelerar a reaproximação no meio de uma guerra com os palestinianos, não necessariamente entre a opinião pública dos Emirados mas talvez entre os árabes do Médio Oriente”.

As imagens dos onze dias de bombardeamentos na Faixa de Gaza tornaram impossível insistir que os acordos trouxeram benefícios palestinianos, como os líderes dos países árabes que os assinaram afirmaram inicialmente. Mas esse nunca foi o objectivo destas normalizações, que trazem a cada um destes países contrapartidas irrecusáveis (cooperação tecnológica e militar, por exemplo, no caso dos Emirados) – se dúvidas houvesse, o estrondoso silêncio inicial destes dirigentes face à ofensiva de Israel chegaria para as dissipar.

Do ponto de vista de Israel, a guerra prova a resistência destes acordos: aliás, poucos dias depois do anúncio do cessar-fogo, os dois países assinaram um tratado fiscal para facilitar investimentos e eliminar a dupla tributação, “um dos mais importantes acordos” alcançados até agora, diz à televisão pan-árabe Al-Jazeera Hay Eytan Cohen Yanarocak, investigador do Instituto de Estratégia e Segurança de Jerusalém.

A visita de Lapid demonstra agora a prioridade que o novo Governo dá aos seus parceiros do Golfo, afirma o analista. O que podia ser visto como “uma política partidária”, do Likud, de Netanyahu, que apresentou estes acordos como um sucesso pessoa, prova de que só ele poderia assegurar a paz com os árabes, passa a ser “uma política institucional do Estado israelita”.

Lapid chega aos Emirados quando os esforços dos Estados Unidos e do Irão para relançar o acordo internacional sobre o programa nuclear iraniano se aproximam da hora do tudo ou nada – um bom momento para mostrar uma frente unida face ao que os dois países vêem como ameaça regional.

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