Vacinas indianas expõem Bolsonaro a suspeitas de corrupção

O Presidente brasileiro foi alertado para irregularidades na compra da Covaxin, mas aparentemente nada fez. Senadores que investigam Governo dizem que a denúncia é grave.

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Bolsonaro foi alertado em Março para eventuais irregularidades no processo de compra da Covaxin Joédson Alves / EPA

O caso que envolveu a compra de doses da vacina Covaxin, desenvolvida na Índia, pelo Governo federal brasileiro abriu um novo capítulo nas investigações à gestão da crise sanitária pelo executivo de Jair Bolsonaro e que expõe directamente o Presidente.

A revelação de que o Governo fechou um acordo para a compra de 20 milhões de vacinas da Covaxin por um valor cerca de dez vezes superior ao que inicialmente fora acordado veio acrescentar uma nova camada ao rol de recriminações contra Bolsonaro. Desta vez, sobre o Presidente que foi eleito com a promessa de limpar a política nacional de “negociatas” duvidosas paira o fantasma de um caso de corrupção.

O Ministério Público Federal (MPF) abriu esta semana uma investigação ao negócio de aquisição de doses da vacina desenvolvida pelo laboratório indiano Bharat Biotech. Os procuradores querem saber por que razão o acordo inicial para a compra de 20 milhões de vacinas estimava o preço por dose em 1,34 dólares, mas o contrato final foi fixado em 15 dólares, de acordo com documentos revelados pelo jornal Estado de S.Paulo.

O caso tornou-se politicamente ainda mais sensível depois de o deputado Luís Miranda, apoiante do Governo, ter revelado que ele e o irmão, um funcionário do Ministério da Saúde, comunicaram directamente a Bolsonaro a suspeita de irregularidades no contrato que estava a ser negociado para a compra da Covaxin, num encontro em Brasília em Março. O Presidente tomou nota do alerta e disse que ia fazer chegar as suspeitas à Polícia Federal, disse Miranda.

A reacção do Palácio do Planalto foi dura. O ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Onyx Lorenzoni, acusou o deputado de estar a fazer uma calúnia contra Bolsonaro, pediu a abertura de uma investigação aos dois irmãos e deixou avisos em tom de ameaça: “Deputado Luís Miranda, Deus está vendo. Mas o senhor não vai só se entender com Deus, mas com a gente também”, afirmou o aliado de Bolsonaro.

A par da investigação do MPF, e com efeitos políticos e mediáticos mais directos, o caso também se tornou central na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado que investiga a conduta do Governo na pandemia. O presidente da comissão, Omar Aziz, disse esta semana que esta “talvez tenha sido a denúncia mais grave que a CPI recebeu”. Esta sexta-feira, Luís Miranda e o irmão vão ser ouvidos pelos senadores e prometeram revelar documentos que provam a existência de corrupção no negócio de aquisição das vacinas.

Os pormenores sobre o contrato de compra da Covaxin que vão sendo revelados pela imprensa brasileira mostram várias pontas soltas que prometem agitar ainda mais as águas em Brasília. As dúvidas concentram-se no papel da Precisa Medicamentos, a empresa brasileira que intermediou o negócio. Desde logo porque nenhuma das outras vacinas adquiridas pelas autoridades brasileiras tiveram como recurso empresas que intermediassem a compra, mas também pelo preço negociado, muito acima dos restantes imunizantes.

O irmão de Miranda já tinha dito, num depoimento à Polícia Federal, ter sofrido uma pressão atípica no Ministério da Saúde para que o contrato com a Precisa avançasse. E, de facto, o processo de compra da Covaxin destaca-se por ter sido concluído num tempo recorde – três meses – quando comparado com a lentidão na negociação com outros fabricantes.

Um dos depoimentos mais aguardados será o de Emerson Maximiano, um dos sócios da Precisa Medicamentos, que será ouvido pela CPI na próxima semana. O empresário já é alvo de outra investigação por causa de um contrato com o Governo de fornecimento de medicamentos no valor de 20 milhões de reais (3,4 milhões de euros) cuja entrega não foi concretizada, diz o El País Brasil.

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