Proposta do PSD sobre extensão das moratórias foi aprovada, mas não deverá ter efeitos práticos
Projecto de lei do PCP, mais abrangente, foi chumbado. Versão do PSD e do PS só se aplicará com autorização da Autoridade Bancária Europeia, que pode não acontecer.
O projecto de lei do PCP que pretendia uma extensão das moratórias de crédito para particulares (habitação) e pequenas empresas até ao final de 2021 foi chumbado esta quarta-feira, na votação na especialidade, na Comissão de Orçamento e Finanças. Foi aprovada uma nova versão, apresentada pelo PSD e pelo PS, mas que abrange apenas a componente de reembolso de capital, e que fica condicionada a uma autorização da Autoridade Bancária Europeia (EBA, na sigla em inglês), que até agora não deu qualquer sinal nesse sentido.
O grosso das moratórias públicas de crédito à habitação e às empresas, criadas no ano passado para minorar o impacto da crise económica criada pela pandemia de covid-19, terminam a 30 de Setembro e abrangeram capital e juros. No caso das empresas que não se enquadram nos sectores mais afectados, a moratória de capital terminou em Abril, mantendo-se apenas a suspensão de pagamento dos juros.
A proposta do PSD é bem mais “fechada” que a do PCP (que tinha descido à discussão na especialidade sem votos contra) ao estabelecer que a prorrogação só se aplica aos “particulares e empresas que desenvolvem a sua actividade em sectores especialmente afectados pela pandemia de covid-19, previstos no anexo ao decreto-lei n.º 10-J/2020, de 26 de Março, na sua redacção actual, como é o caso dos sectores do alojamento, da restauração, da cultura e dos transportes, entre outros”. E ainda porque abrange apenas a suspensão da amortização de capital, ou seja, obrigando ao pagamento de juros.
Mas o aditamento que o PS fez ao projecto de lei n.º 717/XIV/2.ª, que ainda será votado em plenario, embora sem perspectiva de alteração do sentido de voto, torna a exequibilidade do diploma mais difícil, uma vez que as medidas ali previstas ficam sujeitas “à reactivação do enquadramento regulatório e de supervisão estabelecido pelas orientações da Autoridade Bancária Europeia (EBA), relativas a moratórias legislativas e não‑legislativas sobre pagamentos de empréstimos aplicadas à luz da crise da covid-19”.
Acontece que, a última autorização da EBA foi dada em Dezembro de 2020, e desde então não foi dada qualquer indicação para a sua renovação. A situação torna-se mais complicada pelo facto das moratórias já terem terminado na maioria dos países europeus.
Portugal é um dos países onde o peso desse mecanismo é mais elevado.
Aliás, o grupo parlamentar do PS pediu um esclarecimento à EBA sobre esta matéria, no prazo de 30 dias, mas a entidade não respondeu, nem pediu alargamento do prazo para o fazer, disse ao PÚBLICO Duarte Alves, deputado do PCP.
A proposta de alterações do PSD e do PS foram aprovadas com os votos favoráveis do CDS, Iniciativa Liberal, Bloco de Esquerda, PAN e PCP e a abstenção do PS. Duarte Alves justificou o voto a favor do PCP por considerar que a aprovação do diploma “responsabiliza mais o Governo e o Banco de Portugal a obter uma autorização junto da EBA”.
Recorde-se que com o enquadramento da EBA, as suspensões de pagamentos regulares em créditos abrangidos pelas moratórias não são classificados como incumprimentos. Sem esse enquadramento, essa classificação de crédito em atraso ou em incumprimento é muito prejudicial para os clientes e para os bancos.
No final de Março, o governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, admitiu que estava em contactos com EBA, reconhecendo que a probabilidade de prorrogação das moratórias era “muito, muito baixa”.
E mais recentemente, o Ministro das Finanças, João Leão, disse que um prolongamento total ou parcial das moratórias de créditos, contrariando o que são actualmente as directrizes do regulador bancário europeu, é um cenário recusado pelo Governo, que considera que uma opção deste tipo seria “perigosa” para o país e para os próprios devedores.
O montante global de empréstimos abrangidos por moratórias era de 39,3 mil milhões de euros em Abril, menos 3,6 mil milhões do que no final de Março, segundo dados divulgados esta segunda-feira pelo Banco de Portugal (BdP).