Os conservadores já escolheram o seu candidato no Irão
Poderoso Conselho dos Guardiões deverá desqualificar a maioria dos candidatos reformistas às eleições de 18 de Junho. Ebrahim Raisi deve apostar no combate à corrupção.
A lista final só será conhecida a 27 de Maio e aí se saberá que nomes passaram no crivo dos 12 académicos e peritos legais escolhidos directa ou indirectamente pelo Guia Supremo, o ayatollah Ali Khamenei, que formam o Conselho dos Guardiões. Mas entre os candidatos às eleições presidenciais no Irão que se registaram no último dia possível está o popular Ebrahim Raisi, que chefia actualmente o aparelho judiciário, e era já considerado um dos nomes mais fortes na corrida à sucessão do Presidente, Hassan Rohani.
Raisi, de 60 anos, é ex-procurador-geral e guardião da Sagrada Propriedade (Astan Quds Razavi) do Imã Reza, em Mashdad, a organização que administra o mausoléu deste imã e centenas de empresas – considerada uma das mais ricas instituições da República Islâmica e alvo de sanções por violações de direitos humanos impostas pelos Estados Unidos em 2019.
Gozando do apoio de muitos dirigentes conservadores e da chamada linha dura, Raisi, próximo dos Guardas da Revolução, é mesmo visto por muitos como potencial sucessor de Khamenei.
Dois potenciais candidatos anunciaram ter desistido de se apresentar às eleições marcadas para 18 de Junho em apoio a Raisi: o actual presidente do Parlamento, Mohammad Bagher Ghalibaf; e o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros Saeed Jalili. Tanto Raisi como Ghalibaf apresentaram-se sem sucesso às presidenciais de 2017, quando os iranianos reelegeram Rohani, mas foi Raisi a surgir como verdadeiro rival do Presidente em exercício, reunindo quase 16 milhões de votos (38%).
Num comunicado emitido antes da ida ao Ministério do Interior para registar a sua candidatura, Raisi disse querer formar um “governo do povo para um Irão forte”, apontando como prioridades o combate à corrupção e a melhoria da situação económica, quando o país vive numa crise terrível, exacerbada nos últimos anos com as sanções aprovadas pela Administração de Donald Trump e a pandemia de covid-19.
Um pouco à imagem do ex-Presidente Mahmoud Ahmadinejad (2005-2013), Raisi deverá apresentar-se como um justiceiro contra a corrupção que fala aos iranianos comuns.
Sábado também foi o dia escolhido para o ex-presidente do Parlamento e ex-conselheiro de Khamenei, Ali Larijani, apresentar a sua candidatura. Apesar de ser um conservador, Larijani tornou-se mais centrista com os anos e hoje é considerado um pragmático. Destacou-se pela oposição que fez à presidência de Ahmadinejad, depois de se ter apresentado às presidenciais de 2005, e pelo papel de principal negociador do dossier nuclear, entre 2005 e 2008, quando defendeu um diálogo construtivo sobre o programa nuclear iraniano com a União Europeia e chegou a tentar, sem sucesso, iniciar contactos com a Casa Branca, onde estava então o republicano George W. Bush.
Mais tarde, já como presidente do Parlamento, ajudou a defender o acordo internacional assinado em 2015 face à dura oposição interna.
Há vários candidatos considerados reformistas, e alguns também só se apresentaram no último dia de registo. É o caso de Mohsen Hashemi, presidente do conselho municipal de Teerão e filho de Akbar Hashemi Rafsanjani, o antigo Presidente que morreu em 2017 depois de ter passado de representante do poder a figura da oposição reformista, mantendo-se sempre influente.
Outro reformista a apresentar a sua candidatura foi Mostafa Tajzadeh, que passou sete anos na prisão depois das eleições de 2009, vencidas por Ahmadinejad mas denunciadas como fraudulentas pela oposição, e que desencadearam os protestos que ficaram conhecidos como “Movimento Verde”, com milhões nas ruas. Tajzadeh quebrou tabus políticos e sociais ao defender o fim do uso obrigatório do hijab (véu islâmico) para as iranianas e ao desafiar a autoridade absoluta do Guia Supremo, recorda o Financial Times.
Tendo em conta as novas condições apresentadas na terça-feira pelo Conselho dos Guardiões, Tajzadeh não poderá candidatar-se: para além do limite de idades entre 40 e 75 anos, e de terem de provar que têm pelo menos quatro anos de “experiência executiva de liderança”, os potenciais candidatos não podem ter sido condenados por nenhum crime, incluindo os ligados à dissidência política.
Um dos principais candidatos reformistas seria o actual vice-presidente, Eshaq Jahangiri, próximo de Rohani. Mas entre os iranianos que deram o seu voto ao actual Presidente, muitos estão desiludidos com a quase ausência de reformas e muitos mais estão zangados com a situação económica, vista como consequência da opção de negociar com os EUA – com Trump, Washington abandonou o acordo nuclear negociado pela Administração de Barack Obama, substituindo-o por duras sanções.
O próprio Ahmadinejad também se registou, entre dezenas de políticos e militares. Poucos chegarão a ver o seu nome no boletim de voto. Daqui a duas semanas, o Conselho dos Guardiões anunciará a lista final de candidatos e espera-se que a maioria dos reformistas não chegue a poder apresentar-se.