Mito da fraude nas eleições dos EUA começou no Texas em 2018, diz Washington Post

Segundo uma investigação do jornal norte-americano, as queixas de Donald Trump basearam-se em relatórios de uma pequena empresa do Texas que foram desvalorizados por candidatos republicanos entre 2018 e 2020.

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Donald Trump no comício de 6 de Janeiro em Washington Reuters/JIM BOURG

As queixas infundadas de fraude generalizada nas eleições de Novembro de 2020 nos EUA, propagadas pelo ex-Presidente Donald Trump mas nunca provadas nos tribunais, começaram a ser preparadas em 2018 por um empresário do Texas que tinha sido derrotado nas primárias do Partido Republicano desse ano, noticiou o jornal Washington Post.

Numa investigação publicada esta segunda-feira, o Post destaca como protagonistas da história o empresário Russell J. Ramsland Jr., de 68 anos, e a sua antiga sócia Laura Pressley, de 58 anos. Tal como Ramsland, Pressley tinha sido derrotada numa eleição no Texas, em 2014 – e estava convencida de que o seu fracasso resultara de manipulação das máquinas de voto.

Na sequência da derrota, em 2014, Pressley preparou um dossier com supostos indícios de fraude, que acabou por levar aos tribunais, no Texas, sem sucesso. Em Janeiro de 2019, o Supremo do estado norte-americano viria a manter o essencial da decisão dos tribunais inferiores, dizendo que Pressley “não demonstrou que o resultado da eleição foi incorrecto ou impossível de determinar”, embora tenha retirado uma multa aplicada por litigância de má-fé.

De acordo com o Post, a partir de finais de 2018, Pressley e Ramsland tentaram convencer outros candidatos do Partido Republicano de que tinham sido vítimas de fraude. Essas abordagens foram rejeitadas, num primeiro momento, por Don Huffines (derrotado nas eleições para o Senado do Texas em 2018) e Pete Sessions (derrotado nas eleições para a Câmara dos Representantes dos EUA no mesmo ano).

Ao longo de 2019, Ramsland e Pressley foram apresentando as suas supostas provas de manipulação de máquinas de voto a financiadores do Partido Republicano, sem nunca terem conseguido que o assunto se tornasse importante no discurso político. Isso mudou em 2020, quando os relatórios da empresa de Ramsland – a Allied Security Operations Group (ASOG) – começaram a chegar ao círculo mais próximo de Donald Trump.

Esses documentos, e os testemunhos de pessoas ligadas à ASOG que foram apresentadas como peritas em segurança eleitoral e pirataria informática, serviram de base às dezenas de processos com que os advogados e apoiantes de Trump tentaram provar a existência de fraude nas eleições de 2020.

Nenhum dos 42 processos com supostos indícios de fraude foi dado como credível, incluindo pelo Supremo Tribunal dos EUA e por juízes nomeados por Trump. Os resultados eleitorais, com a vitória de Joe Biden, foram confirmados por governadores e secretários de estado republicanos e democratas, e viriam a ser carimbados pelo Colégio Eleitoral e pelo Congresso dos EUA.

Num dos casos aproveitados por Trump para se queixar de fraude, a ASOG sinalizou como suspeita a informação, nas máquinas de voto do condado de Antrim, no Michigan, de que alguns boletins tinham sido “revertidos”. De acordo com os especialistas, essa informação surge nos registos quando um eleitor tenta submeter o voto numa máquina, e a máquina devolve o boletim – um “erro comum e sem nenhum significado”, segundo J. Alex Halderman, professor na Universidade do Michigan.

Semanas depois de a queixa sobre a votação em Antrim ter sido desvalorizada pelos tribunais, Trump surgiu em Washington, no dia 6 de Janeiro, para falar aos apoiantes no dia da confirmação da vitória de Biden pelo Congresso.

“Só num condado do Michigan [Antrim], seis mil votos foram revertidos de Trump para Biden”, disse o então Presidente dos EUA, horas antes da invasão do Capitólio pelos apoiantes que ouviam o seu discurso.

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