Educação para a infelicidade

O cão continuaria preso à corda e ela àqueles pais, que não escolhera, nos quais não confiava por não sentir cuidado nem afecto. Sentia muito desamor, sentia-se miserável, infeliz.

Foto
Anastasiia Dudka/Unsplash

Quando se cresce movido a estalos e a gritos, por mais que se queira, dificilmente se conseguirá manter vocação para a felicidade, uma vez que se recebe uma educação no sentido contrário. Tinha talvez uns dez anos quando adoptaram o Tobias, um rafeiro baixinho, de pêlo de arame, muito meigo. O Tobias foi a sua primeira, e talvez única, referência de afecto incondicional. Apesar de preso por uma corda ao muro do quintal, raramente latia, e ficava felicíssimo sempre que ela aparecia para limpar à mangueirada o chão de cimento, coberto de urina e dejectos, e para lhe levar umas quantas bolachas Maria, que ele devorava em segundos. Nunca a culpava pela corda nem pela sua ausência. Sempre se opôs à ideia da corda, mas os pais diziam-lhe que tinha de ser, porque o quintal não tinha portão, e o Tobias, se não estivesse preso, fugiria. Nunca se convenceu disso e, apesar de obedecer àquilo que os pais lhe diziam, queria muito provar-lhes o contrário.

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