Vai uma sandes de fiambre de corvina?

O fiambre de porco foi, durante muitos anos, o elemento de referência na charcutaria. Mais tarde surgem as aves na sua composição, e agora seguem-se variedades de peixe de aquacultura.

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Foram feitas experiências com robalos e corvinas VR Virgilio Rodrigues

A crescente apetência por hábitos alimentares mais saudáveis incentivou Ana Teresa Ribeiro, estudante de doutoramento da Universidade de Évora (UÉ), a perseguir um objectivo que, ao que tudo indica, foi alcançado: colocar no mercado um produto saudável e pronto a consumir, com características semelhantes às de um fiambre de porco e com mais-valias do ponto de vista nutricional. Após cinco anos de múltiplas experiências sob a orientação de Miguel Elias, professor do Departamento de Fitotecnia da UÉ, e de Rogério Mendes, investigador do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), Teresa Ribeiro acrescentou o fiambre de pescado à lista de sucedâneos do fiambre de porco.

Através da utilização de polpas de dourada, de robalo e de corvina de aquacultura, capturados no Verão e no Inverno, da incorporação de diferentes fibras vegetais e duas tecnologias de gelificação, a investigadora procurou obter um produto que fosse “mais saudável e completo”, assim como apelativo, satisfazendo as preferências do consumidor actual. A melhor opção é o produto à base de corvina, especialmente a que é capturada no Inverno.

Miguel Elias explicou ao PÚBLICO que a preocupação para alcançar um produto saudável não evita o recurso ao processamento. O novo fiambre “tem de ter forçosamente aditivos, não pode ser concebido sem eles, mas podem ser reduzidos ao mínimo”, observa o investigador.

Foram adicionadas duas fibras vegetais, a transglutaminase microbiana (MTGase) e a glucomanano de konjac (KGM), e recorreu-se ao processo de pasteurização e processamento por altas pressões para “conceber e optimizar as propriedades físicas e funcionais do produto”. Esta última tecnologia, “relativamente nova para a indústria alimentar”, tem sido cada vez mais considerada como uma “alternativa” aos métodos mais tradicionais de conservação, como o processamento pelo calor, por permitir “alcançar uma cor e sum abor mais naturais, bem como uma textura mais lisa, brilhante e macia”, descreve, em comunicado, a UÉ.

Miguel Elias refere ainda um pormenor adicional: Como as fibras de peixe “são menos resistentes do que a carne de porco à mastigação”, tornou-se necessário introduzir fibras naturais “para obter um produto adequado ao mercado. E, sobretudo, conseguir, por outra forma, que as pessoas que normalmente têm relutância em incluir o peixe nos seus hábitos alimentares o possam fazer através do novo fiambre.

As conclusões acerca do produto foram conseguidas com recurso a análises químicas, físicas e sensoriais, assim como com um inquérito online. A avaliação sensorial foi realizada, inicialmente, por oito provadores treinados do IPMA, e aplicada, posteriormente, a um grupo de crianças entre os seis e os oito anos, “por ser um público-alvo do produto devido ao elevado valor nutricional que este possui”, explica o orientador do estudo.

Os resultados das análises efectuadas permitiram concluir que a melhor fórmula conseguida é a do fiambre de corvina capturada no Inverno e produzido com 0,5% de transglutaminase microbiana. Em termos texturais, a fórmula que mais se assemelha ao pretendido é o fiambre submetido ao processamento por alta pressão com a combinação de 350 megapascais durante 10 ou 20 minutos a uma temperatura de 30ºC.

Em relação à coloração do fiambre de peixe, a avaliação do público, feita através de um inquérito online, demonstrou que as preferências recaem sobre o produto preparado com uma pequena parte de cochonilha, um corante natural. Conseguiu-se, assim,  replicar não só a textura mas também a coloração do fiambre

Esta combinação “foi a versão final” do produto que melhor correspondeu às propriedades texturais e à coloração idêntica à do fiambre de porco, “sem comprometer, porém, as propriedades sensoriais e nutricionais do produto na sua versão de pescado”, sublinha o comunicado da UÉ.

O estudo procurou “alertar para a importância e grande potencialidade das principais espécies nacionais de produção aquícola”, salienta Miguel Elias, que espera que “o mercado aceite o novo produto”, cuja comercialização virá valorizar estes peixes criados em Portugal. A investigação sobre a aplicação da polpa de peixe em produtos alimentares prossegue, quer associada a estágios curriculares quer associada à indústria alimentar.

Os trabalhos de investigação sobre o fiambre à base de peixe decorreram no IPMA. Ana Teresa Ribeiro dedica-se à investigação e ao conhecimento científico e tecnológico nas áreas da sustentabilidade dos agro-ecossistemas, ambiente e territórios e da segurança alimentar no Instituto Mediterrâneo para Agricultura, Ambiente e Desenvolvimento da UÉ.

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