EUA e outros 13 países criticam relatório da OMS sobre origem do coronavírus

Apresentação dos resultados da missão científica a Wuhan desencadeou uma intensa acção diplomática, no contexto das disputas entre os Estados Unidos e a China no palco mundial.

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O Instituto de Virologia de Wuhan: os cientistas da missão da OMS acham "pouco provável" que o novo coronavírus tenha vindo dali LUSA/ROMAN PILIPEY

Um grupo de 14 países, que inclui os Estados Unidos, o Reino Unido, a Austrália, o Canadá e Israel, criticou o relatório da missão científica da Organização Mundial de Saúde (OMS) a Wuhan para investigar a origem do novo coronavírus. Criticam limitações impostas pela China no acesso à informação e amostras biológicas originais. Pequim respondeu que essas acusações não fazem sentido.

Seguir o noticiário em torno da divulgação do relatório científico da missão tornou-se complicado. Por um lado, os cientistas da missão da OMS deram uma conferência de imprensa em que louvaram a cooperação com os seus colegas chineses – que fizeram a investigação original que eles analisaram durante os 28 dias da missão em Wuhan, 14 dos quais passados em quarentena.

Peter Daszak, especialista em Ecologia das Doenças e director da organização EcoHealth Alliance, disse mesmo que “parte da equipa, os seus colegas chineses”, não estava ali. “Este relatório mostra como é possível trabalhar mesmo em circunstâncias políticas difíceis”, afirmou na terça-feira. Mas também há quem aponte a Daszak um conflito de interesses, por já ter trabalhado com o Instituto de Virologia de Wuhan, um laboratório especializado em coronavírus, sobre o qual tem havido muitas teorias sobre se poderia ser a origem do SARS-CoV-2 – mais por se localizar perto de Wuhan do que por haver algo de concreto sobre a possibilidade de ter havido uma fuga do laboratório.

Mas enquanto decorria a conferência de imprensa dos cientistas, soube-se que o director-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, tinha dito aos governos dos Estados-membros da OMS, ao entregar-lhes o relatório da missão a Wuhan, que a China não tinha fornecido todos os dados que os cientistas tinham pedido. E pedia mais investigação para “chegar a conclusões mais robustas” – o que é o objectivo mais claro do relatório, que apenas identificou pistas a explorar para tentar descobrir a origem do vírus.

Os cientistas consideraram que a hipótese de que o vírus se tenha escapado do Instituto de Virologia de Wuhan era a menos provável, e disseram que por isso não a investigaram tão a fundo. Mas muitos países – com os Estados Unidos à cabeça – e os media continuam a ter uma preferência por esta hipótese. De tal forma que o jornal (conservador) norte-americano The Wall Street Journal chamou ao relatório um “branqueamento de Wuhan”, acusando a OMS de espalhar propaganda chinesa.

A OMS continua a ser um palco para as disputas geopolíticas entre os Estados Unidos e a China, e na verdade Tedros Ghebreyesus tem de manter o equilíbrio entre as duas potências. Por isso as suas palavras pareceram condenar o trabalho da própria missão da OMS, o que cria confusão: “Embora a equipa tenha concluído que uma fuga do laboratório é a hipótese menos provável, isto merece mais investigação, potencialmente com mais missões que tenham especialistas, que estou pronto a enviar”, disse o director-geral da OMS.

Isto não contradiz os planos da OMS de enviar mais missões para a China para estudar as pistas descobertas sobre a origem do SARS-CoV-2 que apontam para que o vírus tenha origem em morcegos, embora tenha passado por um animal intermédio, onde se adaptou melhor ao homem.

Assistimos, no entanto, a este conjunto de países a criticar o relatório, embora digam “apoiar completamente os esforços da OMS para acabar com a pandemia, incluindo compreender como se iniciou e espalhou”. Mas pensam que este estudo “foi atrasado de forma significativa e não teve acesso a dados e amostras originais e completas”.

Do lado chinês, a ideia é mostrar abertura do país. O cientista Liang Wannian, que foi co-líder da equipa da OMS pela parte chinesa – os críticos consideram um erro que seja uma equipa conjunta, com cientistas chineses – é citado pela Reuters dizendo que estas afirmações de falta de acesso aos dados não são correctas. “Claro que, de acordo com a lei chinesa, alguns dados não podem ser levados ou fotografados, mas, quando os analisámos juntos em Wuhan, todos pudemos ver a base de dados, os materiais – fizemos tudo juntos”, afirmou.

Rejeitou também alegações de que os cientistas internacionais não tivessem tido acesso a conjuntos de dados e amostras completas. Nenhum cientista consegue ter informação perfeita, afirmou.

O facto de a publicação do relatório ter sido sucessivamente adiada foi, para ele, fruto da necessidade de confirmar tudo com rigor. “Cada frase, cada conclusão, cada dado” teve de ser verificado por ambos os lados antes de ser divulgado, disse à Reuters. “O que vigorou foi o princípio da qualidade acima de tudo”, disse Liang, que lidera a comissão de peritos sobre covid-19 criada pela Comissão Nacional de Saúde da China, que tem funções equivalentes ao Ministério da Saúde.

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