Um sushiman com pensamento próprio não fica agarrado aos atuns de elite ou ao salmão. Paulo Morais é, desde sempre, um chef à procura de espécies que não estejam em sobrepesca. Uma delas é o sarrajão.
Paulo Morais é, provavelmente, o decano dos sushimen portugueses. Aos 50 anos, leva 32 a enrolar peixe cru e arroz. Em rigor, é mais correcto referi-lo como um chef de cozinha asiática, dado o seu fascínio pelas criações sul-coreanas ou tailandesas. Já geriu espaços grandes e espaços minimalistas. E perdeu conta aos sushimen que foram seus discípulos em restaurantes ou escolas.
Não foi pioneiro na cozinha asiática em Portugal, mas, pela sua dedicação à causa, terá direito a um capítulo extenso numa qualquer tese sobre a matéria. E não pela longevidade profissional, antes por causa de um pensamento próprio e da sua maneira mais livre e alegre de abordar uma gastronomia que tem um carácter grave e sério.
Em 2017 tocou-lhe a responsabilidade de continuar o trabalho de Tomoaki Kanazawa no restaurante Kanazawa, em Algés. Tomoaki foi um dos gurus da cozinha nipónica em Portugal, quer no universo do sushi, quer na criação dos menus kaiseki, e quando convidou Paulo Morais para dar continuidade ao Kanazawa houve quem temesse o pior. Afinal, dizia-se, só um japonês conseguiria trabalhar menus kaiseki. A verdade é que Paulo não levou muito tempo a receber palmas.
Há, todavia, diferenças entre os dois chefs. A primeira é que Paulo tem a capacidade de trabalhar e, em simultâneo, conversar com os clientes que tem à frente (para Tomoaki isso era impensável) e, segundo, o chef português sempre teve a preocupação de introduzir espécies piscícolas que estivessem em melhor estado de conservação.
É aqui que entra o sarrajão, que começou a usar “há cerca de 15 anos”. “Não apenas porque achei que devia dar o exemplo em matéria de protecção dos recursos, mas porque, genuinamente, apreciava e aprecio o sabor delicado e a textura do músculo.” A opção por espécies menos habituais nem sempre foi bem recebida pelos clientes mais tradicionalistas. Mas Paulo Morais faz questão de persistir em abrir o espírito dos clientes. E isso merece aplausos.