Carta Aberta ao Conselho Geral e ao reitor da Universidade de Lisboa
No processo eleitoral que decorre para o Conselho Geral e para o Senado da Universidade de Lisboa, há centenas de investigadores que não fazem parte dos cadernos eleitorais. Advogamos a participação de todos os agentes académicos nos atos eleitorais relativos aos órgãos das escolas e da universidade.
Exma. Senhora presidente do Conselho Geral da Universidade de Lisboa, Drª Leonor Beleza
Exmo. Senhor reitor da Universidade de Lisboa, professor doutor António Cruz Serra
Exmos. Senhores membros do Conselho Geral da Universidade de Lisboa
Há cerca de quatro meses, foi divulgado na imprensa escrita e, ao que consta, posteriormente abordado em sessão do Conselho Geral da Universidade de Lisboa o processo discriminatório a que foram sujeitos os investigadores do Instituto Superior Técnico (IST) que se encontram ligados ao IST-ID, a associação do instituto que acolhe muitas das suas unidades de investigação. A questão centrava-se no facto de, nas eleições gerais para os órgãos do IST, os investigadores não fazerem fazer parte dos cadernos eleitorais; estavam, assim, excluídos do processo eleitoral, quer enquanto eleitores quer enquanto candidatos aos órgãos pelas listas concorrentes.
O processo não se configuraria como um caso claro de discriminação não fosse o facto de esta exclusão dos cadernos eleitorais ser uma novidade daquele processo eleitoral específico.
Menos de um ano antes, em janeiro de 2020, estes investigadores participaram nas eleições intercalares para o Conselho de Escola do IST, nas quais a sua mobilização garantiu a um investigador sem vínculo permanente a ocupação de um dos dois lugares de conselheiro postos em eleição. Terá sido muito por causa destes resultados que a mesma mobilização dos investigadores, colocada desta vez ao serviço da sua participação em listas de candidatos às eleições para os órgãos do IST, em dezembro de 2020, se viu coartada liminarmente, novidade das novidades, por exclusão destes académicos dos cadernos eleitorais dessas eleições.
Estes investigadores, tal como os académicos vinculados diretamente ao IST, integram as unidades de investigação do IST, próprias e associadas, contribuindo para o reconhecimento científico e académico da Escola e da Universidade. No entanto, para o IST, estes académicos não são trabalhadores, já que não lhes é reconhecido um direito básico, o de voto, e de assim decidirem sobre o futuro da instituição a que indubitavelmente se encontram ligados e em que vivem o seu dia-a-dia profissional.
Mas apesar do desconforto sentido, apesar da discriminação descarada de um grupo particular de académicos, o processo de diferenciação e de exclusão continua, só que desta vez com consequências ainda mais abrangentes, já que foi alargado à totalidade da Universidade de Lisboa. Efetivamente, no processo eleitoral que decorre atualmente para o Conselho Geral e para o Senado da Universidade, há centenas de investigadores do IST que não fazem parte dos cadernos eleitorais, como não fazem parte todos os outros que integram o mesmo universo diferencial nas várias escolas da universidade. Note-se que se trata de investigadores integrados em unidades de investigação reconhecidas como partes integrantes das escolas e da universidade.
Para o IST, e agora para a universidade como um todo, estes académicos ora são seres descartáveis destituídos de dignidade profissional, ora são investigadores de alto rendimento, indispensáveis para os sistemas de avaliação da universidade e de classificação mundial das universidades (os famosos rankings).
Os signatários desta carta aberta, docentes da Universidade de Lisboa, organizados em movimento de reflexão intitulado Movimento U, de que fazem parte alguns dos investigadores excluídos quer do processo eleitoral no Instituto Superior Técnico, quer agora também das várias outras escolas da Universidade de Lisboa, não olham com agrado para o presente panorama de diferenciação e de exclusão vigente na universidade. Defendemos uma universidade plural, una e coesa, advogamos a participação de todos os agentes académicos nos atos eleitorais relativos aos órgãos das escolas e da universidade e consideramos não ser possível continuar com este regime de segregação e de estruturação da universidade em académicos de primeira e em académicos de segunda, em razão dos direitos que lhes são atribuídos ou retirados. Uma universidade que se compraz com os seus resultados nos sistemas de classificação mundial das universidades (os rankings), mas que nega a quem mais diretamente contribui para essa classificação com a sua investigação e as suas publicações os seus direitos de pertença e afiliação, não é uma universidade de respeito.
O sistemático afastamento destes académicos da vida institucional e política das universidades, excluindo-os dos processos eleitorais das instituições onde trabalham, por onde circulam e vivem profissionalmente, é um atentado básico à dignidade destas pessoas e um exercício de poder autoritário, cujo propósito é a manutenção do seu próprio poder.
O medo da perda de poder e a vontade ilegítima de o exercer por segregação dos corpos constituintes da academia tem de ser contrariado. Parte desse exercício de oposição a práticas segregacionistas tem de ser garantido pelo Conselho Geral, a quem compete “Aprovar a regulamentação relativa às eleições do Conselho Geral e do Senado” (alínea d) do parágrafo 1, do Artº 19º dos estatutos da Universidade de Lisboa). Outra parte desse exercício de oposição, compete ao reitor, que superintendendo na gestão académica da universidade, e que, não desempenhando o seu papel em defesa da unidade da universidade, será o órgão responsável pelo atual estado de coisas no que diz respeito a discriminação académica.
Os autores escrevem segundo o novo acordo ortográfico
Signatários
Ana Maria Rodrigues (FL)
Carlos A. M. Gouveia (FL)
Carlos Mota Soares, professor emérito (IST)
Catarina Casanova (ISCSP)
Catarina Gaspar (FL)
Gonçalo Falcão (FA)
Inocência Mata (FL)
João Cruz (FBA)
Jorge Malheiros (IGOT)
Madalena Cunha Matos (FA)
Manuel Almeida Ribeiro (ISCSP)
Mário Vale (IGOT)
Maria Francisca Saraiva (ISCSP)
Mariana Gaio Alves (IE)
Pedro Trindade e Lima (IST)
Rita Raposo (ISEG)
Rui Ferreira (IST)
Sónia Frias (ISCSP)
Vera Moniz-Pereira (FMH)
Vítor Maló Machado (IST)