Green Deal: o pacto ecológico que exige a mudança para assegurar sustentabilidade da Europa
O European Green Deal é o pacto ecológico que abrange vários sectores e que quer fazer da Europa o primeiro continente a alcançar a neutralidade climática em 2050. É a mudança necessária para salvar o planeta.
A 11 de Dezembro de 2019, a presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, dava o mote: “Hoje começa uma jornada. Este é o momento ‘Homem na lua’ da Europa. O Pacto Ecológico Europeu é muito ambicioso, mas também terá muito cuidado ao avaliar o impacto e cada passo que estamos a dar”.
As declarações marcavam o arranque do Green Deal, o abrangente pacto ecológico europeu que quer assegurar a sustentabilidade do continente e atingir a neutralidade carbónica em 2050. Muita coisa mudou desde aquele anúncio, essencialmente devido à pandemia da covid-19, que ceifou vidas e arrasou economias. Nada que retirasse ambição ao programa, uma vez que a pandemia até poderá ser uma oportunidade para o acordo: o Green Deal será o “nosso motor para a recuperação”, disse, posteriormente, Von der Leyen.
Um motor para a recuperação dos países, uma necessidade urgente para o planeta. Nessa corrida para garantir o futuro, está a Europa a correr ao ritmo necessário? “Julgo que este compromisso assumido pelo pacto ecológico europeu é um compromisso sério e que a UE está empenhada em traduzir isso de uma forma concreta”, responde ao PÚBLICO Isabel Carvalhais, eurodeputada do PS, enaltecendo que, “apesar de todas as críticas que possam ser feitas”, o Green Deal é “o reconhecimento de que as coisas não estão bem”.
Para justificar o “compromisso sério” da UE, a socialista dá o exemplo do novo quadro financeiro plurianual 2021-27, em que “a recuperação da natureza é entendida como um processo central na recuperação económica”, uma vez que “30% dos fundos europeus devem servir para apoiar projectos com ambição climática”. Ou seja: a UE deve crescer, mas de forma sustentável. “O nosso objectivo é conseguir estimular o crescimento económico de forma sustentável, criando empregos, mas proporcionando benefícios ambientais e de saúde e contribuindo para a competitividade global da UE”.
Já a deputada ao Parlamento Europeu Lídia Pereira, do PSD, faz questão de enaltecer a abrangência do acordo: “O Green Deal não é apenas a redução de emissões para nos tornarmos o primeiro continente no mundo neutro em carbono. É muito para além disso, são vários planos de acção, várias estratégias para vários sectores”.
São dez os pilares que sustentam o pacto ecológico: ambição climática, energia limpa, economia circular, poluição zero, ecossistemas e biodiversidade, agricultura verde, mobilidade, o mecanismo de transição justa (para apoiar os que sofrerão com a transição) e a UE na vanguarda mundial (relacionado com a diplomacia para a sustentabilidade). Para todos esses pilares, existem planos de acção, calendarizados com metas concretas.
Em 2021, por exemplo, está agendada uma revisão da directiva da tributação da energia, a criação de uma nova estratégia europeia de adaptação às alterações climáticas e a revisão das estratégias nacionais para o clima. Nessa última revisão, o objectivo passa por incluir o plano “do prado para o prato”, a estratégia europeia para tornar o sistema alimentar e a agriculta mais sustentáveis.
Nos próximos meses, sob a presidência portuguesa da UE, espera-se, também, a aprovação da Lei Europeia do Clima, que consagra a neutralidade carbónica até 2050 e define metas intermédias como a redução das emissões entre 45% a 55% em 2030.
“O Green Deal está a correr de forma satisfatória e eventualmente só não estamos mais avançados em termos de metas previstas por força da pandemia que teve um efeito de disrupção nesse caminho que está a ser trilhado”, defende Lídia Pereira, ressalvando que existem “correcções a serem feitas”, mas que são questões “perfeitamente passíveis de serem resolvidas”.
Entre essas “correcções”, a social-democrata defende a criação de um fundo para os países afectados pelas alterações climáticas, à semelhança do fundo para a transição justa, que suporta a mudança para as energias limpas nos países mais dependentes de combustíveis fosseis. “Temos vários países na UE que estão a sofrer com as alterações climáticas que já são irreversíveis e também fazia sentido existir um fundo para os apoiar”, assinala.
Opinião diferente tem o eurodeputado Francisco Guerreiro. Para o independente, a sustentabilidade do planeta só se consegue com uma mudança estrutural – o que está “longe” de acontecer. “Não vai haver uma transição estrutural no modo como nos deslocamos, no modo como produzimos comida, portanto, com a reabertura das economias europeias haverá a tendência de voltar a fazer tudo como sempre foi feito”, diz ao PÚBLICO.
Mais. Para Francisco Guerreiro, o Pacto Ecológico Europeu tem um “prisma ambicioso”, mas devia ir ainda mais além para estar de acordo com as metas científicas: “Devíamos reduzir os gases de estufa até 65% em 2030 enquanto a meta anunciada é de 55% no máximo”. O deputado, eleito em 2019 nas listas do PAN – mas que, entretanto, saiu do partido –, critica, também, a política da UE, defendendo que as preocupações ambientais não estão a ser transversais aos vários programas europeus.
Dá o exemplo dos fundos europeus para a agricultura (FEADER) e para as pescas (FEAMPA) que não foram desenhados para “diminuir substancialmente as emissões” nem para reduzirem a “exploração da natureza”. “Todos esses programas sectoriais demonstram-nos que as metas são bonitas, são importantes, mas depois não se concretizam na realidade”.
Um “novo modelo de sociedade”
A corrida para garantir a sustentabilidade da Europa corre em várias pistas. No clima, por exemplo, a produção energética representa 75% das emissões com efeito de estufa na UE, que tem uma indústria que ainda só produz 12% de materiais reciclados. Em 2020, a UE produziu cerca de 4000 milhões de toneladas de gases com efeito de estufa, pelo que a neutralidade carbónica em 2050 é ainda um objectivo distante.
Por sector, a agricultura é o mais poluente (emitindo, sobretudo, amoníaco, dióxido de enxofre e óxido de azoto), superando ligeiramente a produção e a distribuição de energia. “O mais difícil para os próximos anos acaba por ser o sector agrícola, tem um lobby muito conservador e existe muita resistência no modo como se produz alimentos”, afirma Francisco Guerreiro, considerando ser “impossível não perceber que a pecuária está a roubar terreno à floresta”.
Mas, além das questões sectoriais, Francisco Guerreiro defende que, para “resolver os problemas climáticos”, é preciso é uma “mudança efectiva”, que seja “transversal” a toda a sociedade: “Nós temos é de mudar de chip e repensar o nosso modo de produzir, consumir e distribuir uma série de produtos e serviços”.
Isabel Carvalhais é mais cautelosa. Não descarta a importância de promover uma produção agrícola sustentável – “a agricultura ocupa mais ou menos metade do território da UE” –, mas “há toda uma biodiversidade associada à agricultura não intensiva”.
Para a socialista, “toda a abordagem tem de ser intersectorial e integrada”, porque a mudança não se fará “só com lei do clima”, nem “só com recursos financeiros” e os planos de recuperação nacionais: “É pela integração de todos esses elementos. Todas as actividades que têm existência na nossa economia têm de encontrar alternativa para se acomodarem num novo modelo de sociedade porque é isso, no fundo, que estamos a falar”.
Uma mudança que deve ser feita na Europa, mas que não pode ficar fechada no “velho continente”. Lídia Pereira aponta ao papel “fundamental” da UE no multilateralismo, porque para assegurar a sustentabilidade do planeta é preciso que todos façam a sua parte. Há uma nova “janela de oportunidade” com os Estados Unidos, defende, com a Administração de Joe Biden.
Lídia Pereira acrescenta ainda a necessidade de dialogar com a Índia e a China, porque, no fundo, a sustentabilidade futura diz respeito a todos – é preciso é torná-la uma prioridade comum. “O tempo passa muito rápido e em causa está a saúde das pessoas, as novas gerações e o equilíbrio do planeta, portanto a UE tem mesmo de estimular uma plataforma de entendimento alargado para conseguirmos cumprir os objectivos e isso passa pela estratégia a cooperação com as várias geografias do mundo”.
Este projecto foi co-financiado pela União Europeia no âmbito do programa de subvenções do Parlamento Europeu (PE) no domínio da comunicação. O PE não foi associado à sua preparação e não é responsável pelos dados, informações ou pontos de vista expressos no contexto do projecto, nem está por eles vinculado, cabendo a responsabilidade pelos mesmos, nos termos do direito aplicável, unicamente aos autores, entrevistados, editores ou difusores. O PE não pode ser considerado responsável pelos prejuízos, directos ou indirectos, que a realização do projecto possa causar.