Açores querem “tratamento diferenciado” na vacinação e admitem ir buscar vacinas a países de fora da Europa

Ao PÚBLICO, o secretário da Saúde critica a forma como as vacinas têm chegado à região e admite recorrer ao auxílio de países externos. Na sexta-feira, presidente e vice-presidente do Governo admitiram o mesmo.

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Ilha Terceira, Açores Paulo Pimenta

O Governo dos Açores está descontente com número de vacinas que têm chegado à região e reclama por uma discriminação positiva das regiões autónomas no processo nacional de vacinação contra a covid-19. E, caso isso não aconteça, admitem pedir vacinas a outros países de fora da Europa – com os Estados Unidos à cabeça.

O secretário regional da Saúde, Clélio Meneses, admite ao PÚBLICO não ter “qualquer dúvida” sobre a necessidade de um “tratamento diferenciado” para os arquipélagos no fornecimento das vacinas. “No caso concreto da região autónoma dos Açores somos nove ilhas, marcadas pelo isolamento e pela distância e também pela exiguidade de recursos médicos”, começa por dizer o governante, acrescentado que seis das nove ilhas não têm hospital.

Devido à insularidade, às condições climatéricas e aos parcos recursos de saúde, o responsável político pela Saúde na região exige uma discriminação positiva para as regiões autónomas e critica a falta de sensibilidade do governo nacional. “Essas contingências climatéricas, geográficas, e até ao nível do isolamento dos recursos médicos, exigem um tratamento diferenciado. É isso que esperamos: que o governo da república seja sensível e passe a ser mais sensível do que tem sido até agora”.

Clélio Meneses critica também a forma como as vacinas têm chegado à região, em “quantidade incerta”, sempre com “incerteza e variação de datas”, questões que comprometem o plano regional de vacinação. A região tem cerca de 18,600 pessoas com a primeira inoculação (cerca de 7,6% do total da população) e 10,800 com a segunda.

O secretário da Saúde reconhece que o executivo nacional também se “queixa da falta de vacinas”, mas, mais do que reclamar, é preciso “agir”, defende. “Não me parece que possa ser um processo marcado pelas queixas, tem de ser um processo marcado pelas soluções”, atira.

Soluções que podem passar por um pedido de apoio aos Estados Unidos ou à Rússia, caso a Europa não consiga dar resposta. As declarações de Clélio Meneses surgem no dia seguinte ao apelo do presidente do Governo dos Açores, José Manuel Bolieiro, que numa carta enviada à Comissária da Saúde e Segurança dos Alimentos, Stella Kyriakides, pediu a “intervenção directa” da Comissão Europeia para que as regiões ultraperiféricas sejam beneficiadas no processo de vacinação.

Horas depois, o vice-presidente do governo regional, Artur Lima, admitiu pedir vacinas à Rússia, à China ou aos Estados Unidos – isso caso a União Europeia não aceda ao pedido regional. “Iremos fazer o contacto com os Negócios Estrangeiros para, ao abrigo do acordo de Cooperação e Defesa, pedirmos aos Estados Unidos vacinas para todos os açorianos. E faremos os acordos que forem possíveis com quem quer que seja”, afirmou o também líder do CDS-Açores, em entrevista à TVI, após ter sido questionado da possibilidade de ir buscar vacinas à Rússia ou à China.

Interrogando se não lhe choca romper o acordo europeu para trazer vacinas para os Açores, o secretário regional da Saúde é claro: “o que me choca é que os açorianos não sejam vacinados conforme necessitam”. Clélio Meneses considera ainda ser “uma grande noticia para os açorianos” se chegarem vacinas à região através dos Estados Unidos.

Já sobre um eventual pedido de vacinas à Rússia ou à China, Clélio Meneses é mais cauteloso, mas deixa tudo em aberto. “Não foram feitas essas referências especificas por parte de nenhum membro do Governo”, começa por dizer, mas, fazendo questão de referir em seguida o exemplo da Itália, que vai começar a produzir a Sputnik, a vacina russa. “O caminho parece ser o da abertura do mundo às várias soluções desse nível”, conclui o governante com a pasta da saúde no governo açoriano de coligação PSD/CDS/PPM.

Também na sexta-feira, o presidente do governo regional deu uma entrevista à RTP2, já depois das declarações do vice-presidente. Bolieiro foi mais cauteloso, mas não descartou qualquer hipótese: “Estamos a aguardar e a ver a normalidade do fornecimento. Se houver alguma dificuldade que nos coloque numa situação de difícil gestão, então é que admitiremos outras possibilidades”.

No acordo de cooperação e defesa entre Portugal e os Estados Unidos, que regula a base das Lajes na ilha Terceira, está previsto o apoio na área Saúde. Lê-se, por exemplo, no artigo III do acordo: “os serviços de saúde das forças dos Estados Unidos cooperarão, quando solicitados, com os serviços de saúde portugueses na manutenção da saúde pública”.

As reacções recentes dos membros do executivo surgem na semana em que a variante inglesa provocou um aumento do número de casos diários no arquipélago. Foi assim invertida a tendência de diminuição do número de casos activos do último mês, embora a região esteja ainda muito longe dos dias críticos de Janeiro quando registou um máximo de 916 casos activos. Actualmente, os Açores têm 85 casos positivos activos: 74 em São Miguel, nove no Pico e dois na Terceira.

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