Abraçar vacas tornou-se uma solução para os corações solitários da pandemia
Nos Estados Unidos, há santuários de animais que disponibilizam abraços de vacas para quem sente falta de afecto. Sessões custam 75 dólares (cerca de 63 euros) — e até já convenceram alguns a deixar de comer carne.
Renee Behinfar vive sozinha em Scottsdale, Arizona. A pandemia foi dolorosamente isoladora para ela e deixou-a com saudades de carinho e toque. Numa tarde recente, foi finalmente sufocada num longo e tão esperado abraço — dado por uma vaca de 900 quilos. “Foi o meu primeiro abraço real do ano”, disse Behinfar, 43 anos, psicóloga, que procurou conforto bovino com um amigo.
As pessoas estão a inscrever-se para abraçar vacas em santuários por todo o país, muitas desesperadas por afecto, numa altura em que a nação se aproxima de um ano de distanciamento social durante a pandemia.
Quando a vaca Sammy, que foi resgatada de uma quinta de exploração de lacticínios, deitou a sua cabeça no colo de Behinfar e adormeceu, Behinfar começou a chorar. A pandemia, disse, tem sido uma época de solidão sem precedentes. “No final, não queria que ela saísse.”
Behinfar trouxe um amigo à Aimee’s Farm Animal Sanctuary, em Queen Creek, Arizona, perto de Phoenix, para abraçar vacas como um presente de aniversário.
A quinta tem cerca de cem animais resgatados de quintas, muitos com deficiências. As sessões de abraços a vacas, que custam 75 dólares (cerca de 63 euros) por hora, estão agendadas até Julho. A dona, Aimee Takaha, diz que recebe cerca de 20 chamadas por dia para o serviço que começou há cinco anos. O negócio cresceu dramaticamente no último ano.“Elas são almofadas felizes, só para estarem por ali”, disse, sobre as vacas.
Os nove bovinos da sua quinta incluem Adorabull, um Angus (um macho castrado) resgatado de uma vala; Moonicorn, que tem um olho e um corno; e uma vaca de pequeno porte chamada Moochacha.
Os bovinos aproximam-se lentamente dos convidados para abraços e carinhos, disse. Também rebolam para o seu lado e descansam as cabeças no colo das pessoas. De vez em quando, um peru chamado Azalea ou uma galinha aparecem e juntam-se. Os participantes normalmente ficam emotivos, referiu, e alguns até se tornam vegetarianos depois de olharem nos grandes olhos castanhos das criaturas.
Os bovinos ajudaram Jeannie Whalen a lidar com o luto depois de perder o seu marido, Walter, em Maio. Ela agradece a Moothias e outros animais da quinta pelo conforto. “Traz-me um sorriso e um maravilhoso sentimento de admiração”, disse Whalen, 76 anos.
Abraçar vacas também é popular nos Países Baixos, onde se chama “koe knuffelen”.
Suzanne Vuller, que é natural dos Países Baixos, oferece sessões de abraços a vacas na sua quinta de 13 hectares, a Mountain House Farme, em Naples, Nova Iorque, a convidados do seu bed & breakfast há três anos. Ela e o seu marido, Rudi, disponibilizam sessões de uma hora em vários dias da semana, desde Maio a Outubro, por 75 dólares. E enchem a agenda rapidamente; alguns fins-de-semana de Maio já estão completamente cheios.
Vullers disse que é particularmente atractivo para habitantes em cidades que estiveram enjaulados e estão à procura de imergir na natureza para descomprimir. “Passar tempo com animais grandes como as vacas é uma das formas de o fazer”, referiu.
E acrescentou que as vacas também gostam dos abraços. “Não podes abraçar os teus amigos, não podes abraçar os teus netos. Nesta altura, temos de continuar a ter cuidado”, disse. “Mas, como pessoas, temos essa necessidade de estar perto dos outros. As vacas são seguras... e também gostam da interacção.”
Os visitantes abraçam as duas vacas da quinta, Bella e Bonnie, que são meio-Scottish Highland e meio-Angus. Também podem passar tempo com os seis cavalos da quinta.
No Havai, James Higgins dirige o Krishna Cow Sanctuary, com mais de 16 hectares e 67 bovinos, incluindo vacas, bezerros, touros e bois. James começou a disponibilizar sessões de abraços por 75 dólares há três anos, e os interessados até podem reservar pelo Airbnb.
No santuário, três vacas — Uma, Tulsi e Devi — trotam ansiosamente depois da chamada de Higgins, conta.
Quando Higgins se deita, normalmente as vacas fazem o mesmo, acrescenta. Depois, os visitantes deitam-se com as vacas e aconchegam-se nelas, coçando o interior das suas felpudas orelhas e debaixo dos seus pescoços. “As pessoas parecem adorar, e as vacas parecem adorar”, referiu Higgins, 30.
Abraçar estas gigantes gentis — as vacas pesam, normalmente, entre 680 e 900 quilos — tem um “efeito extremamente calmante”, disse.
Na Índia e dentro do hinduísmo, as vacas têm sido veneradas ao longo de centenas de anos, lembrou. Ele disse que a sua fé em Hare Krishna, um ramo do hinduísmo, o motiva a cuidar e proteger vacas. E que normalmente cria laços com os seus convidados, que também ficam deslumbrados com as vacas. “É sempre uma experiência maravilhosa”, disse. “Sinto que sou o melhor amigo destas pessoas, depois.”
Deirdre Roney, um advogado que vive na zona de Los Angeles e tem uma segunda casa no Havai, foi a uma sessão de abraços no santuário Krishna com a sua filha, Camille Cadarette, 26 anos, que adora animais. Cadarette estava encantada, disse, e Roney aprendeu muito sobre vacas.
“Elas são muito grandes”, disse Roney, 58 anos. “Há um factor intimidante aqui, mas ao mesmo tempo... foi uma experiência libertadora.”
Cadarette disse que quaisquer medos que pudesse ter se evaporaram assim que se aproximou e acarinhou uma vaca, e depois a abraçou. “É muito querida e pacífica”, disse.
Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post