Director da OMS apoia suspensão das patentes de vacinas: “O mundo precisa de estar em pé de guerra”
Tedros Adhanom Ghebreyesus, director-geral da OMS, escreveu um artigo de opinião onde defende a isenção de patente nas vacinas, para permitir a sua reprodução em países pobres. A questão é de grande polémica entre os governos-membros: países de baixo e médio rendimento apoiam e países ricos opõem-se.
Num artigo de opinião que escreveu para o jornal britânico The Guardian, Tedros Adhanom Ghebreyesus, director-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), diz que o mundo precisa de estar “em pé de guerra”. Antecedendo a reunião da Organização Mundial do Comércio (OMC) na próxima semana, na data em que se assinala um ano da declaração da pandemia, o responsável apoia uma renúncia de patente que permitiria aos países fazer e vender cópias baratas de vacinas que foram inventadas noutros lugares, para garantir que toda gente é imunizada contra o coronavírus.
“Estamos a viver um momento excepcional na História e devemos estar à altura do desafio”, diz. “Existem flexibilidades nas regulamentações comerciais para emergências, e certamente uma pandemia global que forçou muitas sociedades a fecharem e causou tantos danos aos negócios - grandes e pequenos. Precisamos de estar em pé de guerra e é importante deixar claro o que é necessário.”
A reunião da OMC discutirá uma proposta de renúncia de direitos de propriedade intelectual - no caso, patentes de vacinas - apresentada pela África do Sul e pela Índia, e agora apoiada por 100 países. Os governos-membros estão divididos sobre a questão: países de baixo e médio rendimento apoiam, países ricos opõem-se.
No artigo, o responsável argumenta que os fabricantes ainda receberão algum reembolso: “A renúncia de patentes temporariamente não significa que os inovadores ficam de fora. Como durante a crise do VIH ou numa guerra, as empresas receberão direitos pelos produtos que fabricam”.
As empresas farmacêuticas e os governos dos Estados Unidos da América, Reino Unido e Europa opõem-se veementemente à isenção, com ou sem compensação, servindo-se do argumento da Federação Internacional de Fabricantes e Associações Farmacêuticas, com sede na Suíça, de que cortar os retornos das empresas é um desincentivo à inovação.
Tedros Adhanom Ghebreyesus diz que uma série de medidas deve ser recomendada. “Quer se trate de partilha de doses, transferência de tecnologia ou licenciamento voluntário, como incentiva a própria iniciativa Covid-19 Technology Access Pool [C-TAP] da OMS, ou renunciando aos direitos de propriedade intelectual, precisamos de tirar todos os obstáculos.”
No entanto, os investidores negam que alguma dessas medidas esteja em curso. No C-TAP, que deve encorajar as empresas a compartilharem a tecnologia com países de baixo e médio rendimento, “só a sociedade civil está a gritar sobre isso. Nenhuma empresa se comprometeu”, disse Mohga Kamal-Yanni, uma consultora da People’s Vaccine Alliance.
Das 225 milhões de doses de vacinas administradas até agora, diz o director-geral da OMS, “a grande maioria foi de uns quantos países ricos e produtores de vacinas, enquanto os países de baixo e médio rendimento observam e esperam. Uma abordagem me-first [eu primeiro, em português] pode servir a interesses políticos de curto prazo, mas é autodestrutiva e levará a uma recuperação prolongada, com o comércio e as viagens a continuarem a sofrer. Qualquer oportunidade de derrotar este vírus deve ser agarrada com as duas mãos.”
Tedros elogiou a farmacêutica AstraZeneca por partilhar licenças para que a vacina possa ser fabricada em todo o mundo. No entanto, os activistas contrapõem que até mesmo a conduta da AstraZeneca é defeituosa. Sob pressão para fornecer mais doses para a Europa, a empresa está a enviar 10 milhões de doses para o Reino Unido através do Serum Institute of India - que deve ser o principal fornecedor para países de baixos rendimentos através da COVAX.