João Lourenço avança com proposta de revisão constitucional em Angola

Presidente angolano fez um discurso longo antes do Conselho de Ministros: justificou as mortes de Cafunfo por causa da “rebelião”, negou a existência de campanha racista e xenófoba contra o líder da oposição e anunciou uma reforma pontual da carta magna do país.

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Presidente angolano nega a existência de qualquer campanha racista e xenófoba contra o líder da oposição Reuters/POOL

O Presidente angolano quer rever pontualmente a Constituição cedendo a uma das críticas que a oposição mais tem insistido, o facto de a Assembleia Nacional não permitir o controlo das actividades do Governo a não ser com autorização do chefe de Estado que é também o chefe do executivo.

Como disse no seu discurso desta terça-feira no Conselho de Ministros, João Lourenço quer a “clarificação do modelo de relacionamento institucional entre o Presidente da República, enquanto titular do poder executivo, e a Assembleia Nacional, no que respeita à fiscalização política”.

Essa é uma das propostas para a revisão pontual da Constituição de 2010 que o Presidente pretende ver o Parlamento aprovar. As outras são acabar com o princípio do gradualismo na criação das autarquias, outra exigência da oposição, permitir o direito de voto para os angolanos residentes no exterior (exigência de há muito da diáspora), tornar o banco central angolano independente do poder político e, finalmente, estabelecer uma data fixa para as eleições gerais.

Não é habitual que o Presidente angolano discurse publicamente antes das reuniões do Conselho de Ministros. O próprio João Lourenço referiu esta terça-feira o extraordinário da sua alocução destinada à nação e não somente ao seu Governo (“embora não seja hábito, decidi abrir esta sessão do Conselho de Ministros com uma intervenção pública”), mas os assuntos, as críticas e a tensão foram-se acumulando ao longo de um mês em que o chefe de Estado se manteve em silêncio.

E João Lourenço quebrou esse mesmo silêncio com o anúncio de mudanças no final de um discurso em que começou por comentar os assuntos que têm merecido mais críticas ao executivo nas últimas semanas, nomeadamente o das mortes do Cafunfo, na Lunda Norte.

Alinhando pela tese oficial da “rebelião armada” com intervenção de estrangeiros, para justificar a reacção da polícia, que terá morto pelo menos uma dezena de pessoas (seis na versão das autoridades, que João Lourenço repetiu), o Presidente não deixou de condenar “veementemente” os agentes “que terão praticado actos considerados desumanos, desonrando a farda que envergam”. E disse estar à espera das “conclusões do inquérito em curso e a responsabilização criminal dos agentes da Polícia Nacional”.

O chefe de Estado criticou ainda aqueles que falam na existência de uma campanha racista e xenófoba em curso contra Adalberto Costa Júnior, líder da UNITA, principal partido da oposição, e que ainda no domingo o director da Rádio Essencial, Emídio Fernando, denunciava nas páginas do PÚBLICO como tendo “o dedo, ou a mão completa” do Gabinete de Acção Psicológica e Informação da Casa de Segurança, órgão sob a dependência directa de João Lourenço”.

Julgando “infundados e irrealistas os receios de alguns analistas da política nacional, que apontam para o surgimento de uma campanha de incitação ao racismo e à xenofobia”, o Presidente angolano garantiu que a luta pela independência em Angola foi sempre “contra a segregação racial” e que “tolerar o racismo e a xenofobia seria negar” a própria história do país.

Tratando a questão como um “falso problema”, destinado a “fomentar a divisão entre os angolanos”, João Lourenço garantiu que “o Estado está atento, não vê sinais preocupantes, mas se eventualmente surgirem, com certeza que serão combatidos e sanados imediatamente”.

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