Filipe Morato Gomes, 20 anos de Alma de Viajante: “Não troco a casa da ti’ Maria pelo Sheraton”

Começou a viajar tarde, diz, mas encontrou a sua paixão. Há 20 anos que parte à descoberta do mundo e o partilha tudo no seu pioneiro blogue e site Alma de Viajante. Agora, que se sente como “um pássaro na gaiola”, leva-nos por duas décadas de viagens.

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Tenerife, Espanha (2019)
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Deserto de Gobi, Mongólia (2004)
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Grande Muralha da China (2004)
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Bagan, BIrnânia - Myanmar (2005)
Alma De Viajante
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Dunas de Ubari, Líbia (2007)
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Aldeia no Botswana (2008)
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Tribo Himba, Namíbia (2008)
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Havana, Cuba (2009)
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Sinai, Egipto (2010)
Grande Mesquita Abbasi
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Isfahan, Irão (2011)
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Glaciar Franz Josef, Nova Zelândia (2012)
Parque Nacional de Zion
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Parque Nacional de Zion, EUA (2012)
Alma De Viajante
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Fez, Marrocos (2015)
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Quioto, Japão (2016)
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Festival de Parintins. Amazónia, Brasil (2017)
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Ghardaia, Argélia (2018)
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Islândia (2018)
Bucovina
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Mosteiros Pintados de Bucovina, Roménia (2018)
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Serengueti, Tanzânia (2019)
Al-Balad
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Jeddah, Arábia Saudita (2020)

Do outro lado da linha, ouvimos: “Dás-me dez minutos para tentar resolver uma coisa na escola online?”. Foram problemas técnicos, conta-nos pouco depois Filipe Morato Gomes, “alma de viajante” em hibernação. “Estou a dar em tolo”, confessa-nos entre risos, “estou há 12 meses aqui”. No início, diz, a vida nem mudou muito, excepto o não poder sair - é que, explica, a sua vida é bipolar: por um lado, em viagem, em descoberta do sítio onde estar; por outro, em casa, a escrever, a editar fotos - e na vida quotidiana, que partilha com a mulher e dois filhos em idade escolar. Porém, diz, “tudo o que é de mais chega”. Nunca imaginou que estaria a celebrar os 20 anos do seu blogue de viagens, Alma de Viajante (o que o torna, provavelmente, o mais antigo em Portugal), como “um pássaro na gaiola”.

Foi no início de 2020 que Filipe fez a última viagem, à Tailândia; foi em Dezembro de 2019 que fez a última viagem “memorável”, à Arábia Saudita. “Uma experiência brutal”, confessa, “porque é um país que não está habituado ao turismo” - há, sim, muitos expatriados e então a pergunta constante, conta Filipe, era onde trabalhavam, ele e o amigo que o acompanhou; e “porque é um país a mudar - “e vemos essas mudanças no dia-a-dia”. Ele que já avistou gorilas de montanha a “meia dúzia de metros”; já nadou com tubarões-baleia e subiu a um vulcão em erupção; já conheceu “pessoas boas” em todo o mundo e ainda não fez a catarse do tsunami de 2004 (“a minha experiência mais marcante em viagem”), não sabe quantas viagens fez ao longo destes 20 anos (o blogue dá-nos uma ideia) - “não colecciono países, nem cidades e tenho uma má memória” -, mas sabe que já não continua a partir da mesma maneira. “Quem me dera…”, suspira Filipe, que se assume como um viajante contador de histórias.

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Filipe Morato Gomes Adriano Miranda

“Antigamente”, explica, “eu partilhar as minhas viagens e escrever não interferia com as viagens, agora sim” - afinal, o blogue é o seu trabalho. Mas não só. “Quando nasceu a minha filha, há 13 anos, comecei a fazer viagens mais curtas”, afirma, “tenho de gerir o tempo com a família”. Uma coisa e outra juntam-se no mesmo: planeamento. “Já parto para o destino com ideias feitas sobre o que quero escrever”, confessa, “e, se vou uma semana, não me posso dar ao luxo de perder uma camioneta”. Para alguém que prefere “viagens com mais tempo”, ao sabor dos imprevistos, foi uma adaptação para continuar a fazer “coisas de que gosta” (entre elas, deixar-se estar numa esplanada ou num parque a ver a vida acontecer e a falar com pessoas) e “coisas que terão procura” (listas e dicas práticas, por exemplo). “Não é mau, mas sinto que perdi a pureza da viagem pela viagem.”

Um pouco da pureza das viagens dos avós, cujos relatos o deixavam curioso em miúdo. Eram funcionários públicos, sublinha, e um ano, por exemplo, passaram três meses na Amazónia, juntando férias de três anos. Ele, na verdade, começou a viajar tarde, avalia, tirando da equação “aquelas viagens de carro pelo Sul de Espanha e França” com os pais. A primeira “viagem fora da caixa” foi a viagem da sua lua-de-mel, às Maurícias - e essa foi logo a sua estreia na escrita: na imprensa e, mais tarde, no seu site. Estamos no “antigamente”, em Janeiro de 2001, quando Filipe decidiu começar um site, para assinalar o seu 30.º aniversário.

“Pairava a vontade de dar uma volta ao mundo, mas nunca tive coragem de dar o passo”, confessa. Foi “empurrado”, que é como quem diz, despedido. Então, ficou um ano a fazer biscates para ganhar dinheiro e planear a aventura que lhe havia de mudar a vida. Parte em 2004 para uma volta ao mundo e apenas um compromisso: uma crónica semanal para a Fugas. “Vivia seis dias, à terça-feira parava, revia o que acontecera, que história queria contar e enviava.” O seu site prosseguia e ia sendo alimentado com essas crónicas, publicadas aí duas ou três semanas depois de terem saído no jornal.

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Birmânia / Myanmar, 2021 Filipe Morato Gomes

A volta ao mundo “mudou tudo”. Regressou e tomou três decisões: ter um filho - “o que pode ser um contra-senso, no momento em que descubro a vontade de ser livre, de viajar, mas estava tão feliz e de bem com a vida…”; mudar-se para mais perto do mar - e fê-lo; e viver profissionalmente das viagens - “enquanto der”. Na altura, assume, não sabia bem como o fazer - a única via era vendendo artigos para revistas e jornais. Sempre acompanhado por uma presença online - “investi a sério no site, não comecei a viajar à louco” - que evoluiu seguindo as tendências de monetização e teve algumas metamorfoses conceptuais: chegou a estar dividida (um site, “num registo de jornalismo de viagens”, e um blogue pessoal, quando Filipe sentiu necessidade de “escrever num registo mais intimista”) até à encarnação actual, uma fusão de ambos.

O Alma de Viajante passou a ser o blogue de viagens pessoal de Filipe Morato Gomes e assim chegou aos 20 anos de vida. Já “não há reportagens longas de revista”, só há textos de Filipe, sejam de “coisas mais práticas” ou as suas crónicas, o género que continua a preferir. “É a minha casa”, resume. E a sua “cena”: para trás ficaram as expedições com a Nomad (Irão) e os workshops de escrita de viagem. “Percebi que não tinha muito tempo para viajar, para mim.” Focou-se só no Alma de Viajante, nas viagens e nos conteúdos, portanto. E tudo começou a funcionar em velocidade de cruzeiro.

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Glaciar Franz Josef, Nova Zelândia, 2012 - na volta ao mundo com a filha Inês, a Pikitim, então com 5 anos Filipe Morato Gomes

Não foi fácil chegar a esta, no equilíbrio entre as viagens enquanto profissão e a vida pessoal. Teve momentos altos - como a segunda volta ao mundo, dessa feita na companhia da mulher e da filha, Inês, registada em O Diário da Pikitim; teve momentos baixos, como o voo para o Irão (ao serviço da Nomad), poucas horas depois do nascimento do filho, Tiago. “Fui a chorar o tempo todo. Mas era a minha profissão.” Por estes dias está em casa: tem apenas uma viagem marcada, no final de Maio, “uma promoção fantástica da TAP para Djerba [Tunísia], 75 euros ida e volta”. “Se for ao ar, o prejuízo não é muito. Mas espero até conseguir fazer algo antes”, diz, “embora tente não pensar em nada específico para não sair frustrado”.

Se pudesse fazer planos, o Paquistão e a Patagónia estariam no topo das suas prioridades. O primeiro pelas pessoas (“eu digo que o Irão tem o povo mais hospitaleiro do mundo e há malta que defende que quem diz isso é porque nunca foi ao Paquistão”), o segundo, pela natureza (“tenho dois locais que me deslumbraram, a ilha Sul da Nova Zelândia e a Islândia, dizem que a Patagónia é tão ou mais brutal”). Por enquanto, viaja pela Internet. Antes, conta, via as promoções e comprava as viagens seis, oito meses antes; agora, continua a ver os preços dos voos mas, brinca, apenas como “terapia”. Até que a gaiola se abra.

Revista Fugas Adriano Miranda
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