Israel dá vacinas à República Checa, que vai abrir representação diplomática em Jerusalém
O Estado hebraico vai dar também 5000 doses da vacina à Guatemala, que já abriu a sua embaixada em Jerusalém, e às Honduras, que planeiam fazê-lo.
Israel está a protagonizar um episódio da chamada “diplomacia das vacinas”, que se esperava que acontecesse com países que chegassem primeiro a uma vacina eficaz e segura, com grande capacidade de produção ou um grande stock.
No caso do Estado hebraico, trata-se de uma posição vantajosa por ter levado a cabo um programa de vacinação apostando na rapidez (já receberam a primeira dose mais de metade dos 9 milhões de israelitas) e tornando-se num laboratório em tempo real, conseguindo assim, em troca de informação, ter rapidamente mais doses de vacinas da BioNTech/Pfizer, e obtendo mais doses do que as que precisa já entregues ou contratadas com outros fabricantes, como a Moderna ou a AstraZeneca.
As vacinas em causa são da Moderna, compradas antes do acordo com a Pfizer, e vão ser dadas a vários países. Sabe-se, para já, que os beneficiários incluem a República Checa, que prometeu abrir uma representação diplomática em Jerusalém, a Guatemala, que foi o primeiro país a seguir os EUA e a mudar a sua embaixada de Telavive, onde estão todas as outras, para Jerusalém, e as Honduras, que planeiam mudar também a embaixada. Nestes casos, tratar-se-á de 5000 doses para cada país.
Algumas vacinas irão também ser dadas à Autoridade Palestiniana – Israel tem estado sob fogo por não dar vacinas aos palestinianos já que, argumentam organizações de defesa de direitos humanos, deveria fazê-lo enquanto potência ocupante. O Estado hebraico, pelo seu lado, recusa que tenha esta obrigação, e alega que o governo limitado dos palestinianos é que tem a seu cargo a gestão da saúde.
Segundo a televisão israelita Kan, há ainda mais três países europeus entre os beneficiários: Hungria, Chipre e São Marino. A Hungria tem sido uma excepção na União Europeia, e foi o primeiro país a vacinar os seus cidadãos com a vacina russa Sputnik V e agora também com a chinesa Sinopharm.
A televisão diz que se levantam dúvidas quanto à legalidade da acção de Israel porque o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, tomou a decisão sozinho. A correspondente em Jerusalém Noga Tarnopolsky (que escreve para o site Daily Beast e para o jornal Los Angeles Times) comentava que “Netanyahu parece pensar que as vacinas de Israel lhe pertencem pessoalmente”.
O jornalista do Haaretz Anshel Pfeffer criticava ainda no Twitter a caracterização do envio de tão poucas doses de vacinas como ajuda humanitária, já que pela quantidade, estas serão sobretudo prendas para as elites que controlam os países, defendeu.
A República Checa confirmou que já recebeu vacinas de Israel. O ministro dos Negócios Estrangeiros, Tomás Petricek, argumentou, citado pelo site Euractiv, que não se trata de uma mudança de embaixada, que se manterá em Telavive, mas sim de juntar “representação diplomática” ao seu gabinete em Jerusalém, o que é visto como um passo antes da abertura de uma embaixada.
O país está novamente com a curva de infecções a subir, assim como as mortes (na terça-feira foram registadas 207), e o primeiro-ministro, Andrej Babis, está a ser criticado pela gestão inconsistente da pandemia, depois de Praga ter sido apontada como um dos bons exemplos de luta contra a pandemia, mas ter sido um dos primeiros países europeus a decretar um segundo confinamento, que prometera que não ia acontecer. Babis enfrenta eleições legislativas em Outubro.
Ganho político antes das eleições
O Governo de Israel dissera antes, numa declaração escrita: “À luz da campanha de vacinação bem-sucedida em Israel, o país que lidera o mundo na inoculação da população, recebeu muitos pedidos de países do mundo para ajudar na entrega de vacinas”. Assim, “foi decidido dar assistência às equipas médicas da Autoridade Palestiniana, e a vários outros países que contactaram Israel, com uma quantidade simbólica de vacinas”, continuava a declaração, sem nomear os países.
Segundo a televisão Kan e o Jerusalem Post, as doses enviadas (entre 1000 e 5000), foram ainda para a Mauritânia (que teve relações diplomáticas com Israel a partir de 1992, até as suspender na sequência da operação militar israelita em Gaza de 2008-2009; o reatar foi recentemente discutido, mas não chegou a acontecer), Chade, Uganda e Guiné Equatorial.
A televisão Kan menciona ainda as Maldivas; o Jerusalem Post refere o Quénia e a Etiópia.
A presença de embaixadas em Jerusalém é um ganho político para o Governo e para o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, quando se aproximam as eleições a 23 de Março.
Israel alega que a cidade, “una e indivisível”, é a sua capital, pretensão não reconhecida até o Presidente norte-americano, Donald Trump, decidir fazê-lo, mudando a embaixada dos EUA de Telavive para Jerusalém (em Telavive continua a existir uma embaixada; a mudança era demasiado grande e complexa para ser terminada). Os palestinianos querem que Jerusalém Oriental seja a capital do seu futuro Estado.
A notícia segue-se a outro caso envolvendo vacinas e Israel: soube-se, no final da semana passada, de um acordo mediado pela Rússia para a libertação de uma israelita detida na Síria. O acordo incluía a habitual troca de presos (a libertação de dois pastores e uma comutação de pena de uma druza) e ainda uma cláusula que deveria ser secreta: o Estado hebraico comprometeu-se a comprar milhares de doses da vacina russa Sputnik V para o regime de Bashar al-Assad.
O ministro da Defesa, Benny Gantz, criticou as entregas e compras de vacinas a outros países, dizendo que Netanyahu decidiu sozinho sem apoio do resto do Executivo, e que isto era “comércio de vacinas pagas pelos contribuintes israelitas”, cita o Financial Times.