Está a nascer uma minicidade feita de torres dentro de Leça da Palmeira
Na viragem do século, após contestação política, as duas torres Entre-Quintas (21 pisos) foram construídas nos terrenos da Facar. Vinte anos depois serão construídas pelo menos mais quatro torres com mais de 20 andares. Há duas décadas cumpriu-se o alvará de 1992. A autarquia diz que hoje o alvará continua a ter efeito. Única forma de o reverter seria adquirindo os terrenos.
Pelo menos mais quatro torres com mais de vinte andares vão ser construídas em Leça da Palmeira, no quarteirão que se estende entre as Ruas de Entrequintas, Vila Franca, Camposinhos e Óscar da Silva. Já lá existem duas, as Entre-Quintas, com 21 andares cada uma, que no início de 2000 foram alvo de contestação política por parte da autarquia socialista - na viragem do século, a câmara insurgiu-se contra o volume da construção, mas foi obrigada a cumprir o alvará de loteamento emitido em 1992. A próxima a furar os céus, assente em terrenos da antiga empresa metalúrgica Facar, é a Flower Tower, que começará a ser construída em Março. Vinte anos depois, a autarquia volta a dizer que o alvará é para cumprir. A única forma de reverter o alvará seria através da aquisição dos terrenos.
Ao todo, nos próximos anos serão pelo menos seis as torres construídas naqueles terrenos. Esta próxima empreitada será realizada pela Nexity, que já tem outro pedido na câmara em vias de ser licenciado para o lote 1 para construção de outra torre com 21 pisos. A promotora proprietária de oito lotes tem programada a construção de mais um edifício com a mesma cércea para o lote 15, cujo pedido de licenciamento ainda não foi emitido. Para o lote 6, também ainda por licenciar, prevê-se a construção de um prédio de 10 andares. Os restantes lotes ainda não têm projecto definido, afirma ao PÚBLICO Fernando Vasco Costa, director-geral da Nexity Portugal, que adianta saber da construção de pelo menos mais uma torre acima dos vinte andares nos mesmos terrenos por parte de outra promotora.
Vinte anos depois, continua o plano de construção de uma minicidade feita em altura dentro de Leça da Palmeira, como já tinha sido anunciado no início de 2000, quando teve início a empreitada das torres Entre-Quintas, numa freguesia de Matosinhos sem tradição de edifícios com cércea semelhante.
À data, era Manuel Seabra (1962-2014) presidente da câmara, após ter substituído Narciso Miranda que seguiu para Lisboa para ser secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária do Governo liderado por António Guterres. Nessa altura, o ex-autarca socialista demonstrou ao PÚBLICO o seu descontentamento relativamente ao volume da construção e explicava que, tendo sido o alvará número 533/92 emitido antes de estar concluído e publicado o Plano Director Municipal (PDM) de Matosinhos, a antiga unidade metalúrgica Facar ficou autorizada para todo o sempre a construir 225 mil metros quadrados acima do solo.
Ao fim de duas décadas, com PDM revisto em 2019, a autarquia agora liderada por Luísa Salgueiro, afirma ao PÚBLICO ter de continuar a cumprir o alvará de loteamento. Porém, diz a alínea g) do artigo 77 Nº1 do decreto de lei Decreto-Lei n.º 555/99, relativamente à caducidade dos alvarás, o seguinte: “Prazo máximo para a conclusão das operações de edificação previstas na operação de loteamento, o qual deve observar o prazo previsto no instrumento de programação da execução do plano territorial de âmbito municipal ou intermunicipal aplicável e não pode ser superior a 10 anos”. Questionada se esta alínea pode ser aplicada neste caso, a autarquia afirma não ser aplicável.
“A área urbana em apreço foi objecto de uma operação de loteamento com alvará emitido em 1992, tendo sido concretizadas e integradas no domínio público municipal as obras de urbanização, e constituídos os respectivos lotes para edificação. O loteamento em causa está válido”, adianta a câmara, acrescentando que a alínea invocada foi introduzida pelo DL 136/2014, de 9 de Setembro, o que significa “que os alvarás anteriores a este diploma legal não continham, nas suas especificações, esta causa de caducidade”. Por isso, adianta, “a tais alvarás de loteamento não se aplica esta particular causa de caducidade. É o caso do alvará em apreço, que é de 1992”.
De acordo com a autarquia o registo dos lotes na Conservatória do Registo Predial com as prescrições do alvará, “tornam perene o direito de edificabilidade de cada lote”. Porém, existe uma forma de reverter a situação, mas não sem custos para o município. Para impedir a edificabilidade prevista seria necessária a “aquisição dos terrenos pelo valor correspondente a esse direito adquirido de construção”.
Em Maio de 2000 calculava-se que as edificações nos lotes da antiga Facar iam chamar para aquela zona mais cerca de 7 mil novos habitantes. Actualmente, de acordo com a autarquia, está prevista a construção de mais quatro edifícios. Dois, com “22 pisos acima do solo”, já estão aprovados, e outros dois, de “21 e 22 pisos”, estão por aprovar. Ao todo, em conjunto com os dois edifícios Entre-Quintas (21 pisos cada), existirão nos próximos tempos nos mesmos terrenos pelo menos seis torres acima dos vinte andares, mais outros prédios de cércea menor.