Manuel Sobrinho Simões será director por um dia do PÚBLICO
Numa altura em que o mundo confia na saúde e na ciência para o amparar no confronto com uma pandemia, o PÚBLICO confia a direcção do jornal ao médico e cientista Manuel Sobrinho Simões.
O médico e cientista Manuel Sobrinho Simões diz “não sei” com a maior simplicidade e sinceridade e sem um pingo de vergonha. Na mais recente entrevista que deu ao PÚBLICO, houve mesmo quem tivesse contado as vezes que o “consagrado” patologista respondeu às perguntas com um desarmante “não sei”. Foram 19, escreveu António Guerreiro, na sua crónica no ípsilon. Na verdade, conta quem lá esteve, terão sido até mais do que 19 vezes. Foi nessa entrevista que também disse: “Interessa-me saber coisas para contar aos outros, como vocês, jornalistas.” Estava feito o desafio. Em tempos de tanta incerteza como os que vivemos agora e porque temos em comum o gosto de saber coisas para contar aos outros, o PÚBLICO escolheu o cientista e médico Manuel Sobrinho Simões para ser “director por um dia”, no 31.º aniversário que se celebra no dia 5 de Março.
Manuel Sobrinho Simões é capaz de achar “muita graça” (uma expressão que usa quase tanto como o “não sei”) ao facto de o PÚBLICO e o Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto (Ipatimup), do qual é fundador, completarem os dois 31 anos na mesma altura. O Ipatimup no final de 2020 fez 31 anos de investigação e hoje faz parte de uma família maior do saber chamada I3S (Instituto de Investigação e Inovação em Saúde), onde há cerca de mil pessoas de três institutos que se esforçam todos os dias para inventar um futuro melhor.
Arriscamos dizer que o nosso director por um dia em 2021 é o cientista português mais (re)conhecido em Portugal nos dias de hoje. Os prémios que foi acumulando ao longo dos anos – desde o Prémio Pessoa (em 2002) até à nomeação como “o patologista mais influente do mundo” pela revista britânica The Pathologist em 2015 – são quase tantos como as inúmeras entrevistas que foi dando, partilhando o que sabia e o resto.
Manuel Sobrinho Simões é mais do que um médico que, na verdade, nunca quis exercer medicina (sempre disse que gosta mais de estudar doenças do que ver doentes), é mais do que um patologista que se especializou em cancro da tiróide e que ajudou a fundar o Ipatimup e até mais do que o professor que “vive do sucesso dos tipos que ensinou”. É mais do que o filho, pai e avô, papéis que lhe foram dando a noção cada vez mais nítida da sua mortalidade. É o homem que gosta de conversar, que encontra defeitos em si que praticamente ninguém reconhece, que acha que é chato, que assume que guia mal, que gosta de ler, que não gosta de mudar e que teimosamente se recusa a usar telemóvel. É tudo isso e mais alguma coisa.
Há pouco tempo, o PÚBLICO foi encontrar Manuel Sobrinho Simões no lugar de sempre: na sala do I3S a trabalhar (num gabinete que partilha com Fátima Magalhães, secretária da direcção que o apoia há quase 40 anos). A mesa cheia de papéis, umas lâminas a chegar de França para analisar e procurar sinais de um cancro e alguma inquietação e tristeza a travar-lhe o riso e até o sorriso. Desta vez, Sobrinho Simões assumiu estar angustiado por sentir os anos de vida que a pandemia lhe roubou. A conversa séria tinha pouca graça, mas toda a sabedoria. E, mais uma vez, muitos se terão identificado com o que sente e diz. Neste momento, sobra a certeza de que, na saúde e na doença, a incerteza faz parte de qualquer equação. E também que a ciência nos pode dar algumas respostas em que temos de confiar. E o professor Sobrinho Simões ensina-nos isso.
Com o seu discurso e percurso, mostra-nos como aquilo que não sabemos nos empurra todos os dias para novas hipóteses e mais e melhor conhecimento. É o “não sei” que não hesita em assumir que nos aproxima tanto dele. E é a vontade de saber coisas para contar aos outros que o aproxima tanto do que queremos fazer no PÚBLICO. Conjugar tudo isto agora – em tempo de pandemia – faz todo o sentido.