Oposição nomeia presidente de transição no Haiti, em desafio a Moïse

Dois jornalistas atingidos a tiro pela polícia. Chefe de Estado considera que o seu mandato só termina daqui a um ano, os opositores e o Supremo Tribunal dizem que acabou no domingo.

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Manifestante dá um pontapé numa lata de gás lacrimogéneo em Champ Mars, no centro de Port-au-Prince JEAN MARC HERVE ABELARD/EPA

Os partidos da oposição no Haiti nomearam um dirigente de transição para ocupar o lugar do actual Presidente, o contestado Jovenel Moïse, que acusam de querer prolongar ilegalmente o seu mandato. A nomeação, na segunda-feira à noite, acontece depois de Moïse ter denunciado uma conspiração para o derrubar e a detenção de 23 pessoas, incluindo um juiz do Supremo Tribunal e uma alta responsável da polícia.

O nomeado pela oposição é precisamente um juiz do Supremo, Joseph Mécène Jean-Louis. Numa mensagem vídeo enviada às agências de notícias internacionais, o juiz de 72 anos afirma “aceitar a escolha da oposição e da sociedade civil para poder servir o país como presidente provisório de transição”.

O desacordo sobre o fim do mandato prende-se com a data em que este começou: para a oposição, aconteceu quando Moïse foi eleito pela primeira vez, em 2016, numas eleições anuladas por fraude; o próprio defende que o seu tempo no cargo só começa quando foi reeleito, um ano depois.

Independentemente desta divergência, o chefe de Estado tem pouca legitimidade, depois da vaga de protestos desencadeados por denúncias de corrupção que marcou os últimos meses de 2019. Moïse governa por decreto desde Janeiro de 2020, altura em que o país ficou sem Parlamento – as eleições legislativas previstas para 2019 nunca chegaram a realizar-se.

Entretanto, o poder executivo, constituído pelo Presidente, pelo seu primeiro-ministro e ministros, publicou um decreto a anunciar que três juízes do Supremo Tribunal que foram abordados pela oposição vão passar à reforma. Tanto os magistrados como as associações de advogados apoiam a posição dos opositores.

Na segunda-feira, o Exército afirmou-se preocupado com a instabilidade política, mas disse que vai defender o Estado de direito e “as autoridades democraticamente eleitas pela população”, num sinal de que está ao lado de Moïse.

Nas ruas, os últimos protestos de alguma dimensão aconteceram no domingo e terminaram com confrontos entre a polícia e os manifestantes. Dois jornalistas que acompanhavam um pequeno protesto na segunda-feira à tarde em Port-au-Prince foram atingidos a tiro pela polícia e um deles está em estado grave, noticia o jornal local Haiti Standard.

O Presidente garante que irá transferir o poder a quem vencer as eleições que deverão acontecer em Setembro, mas só sairá em Fevereiro do próximo ano. A oposição teme que referendo constitucional anunciado para Abril altere as regras das eleições e torne a votação menos justa e livre, receando que o plano do Presidente seja mesmo eternizar-se no poder.

André Michel, opositor ouvido pela Reuters, diz que os protestos contra o Governo vão continuar esta semana. “A mobilização tem de continuar para forçar Jovenel Moïse a deixar o cargo”, afirma. “Esperamos que a comunidade internacional apoie a nossa abordagem”, diz ainda.

Para já não parece ser esse o caso. Os Estados Unidos, que são o maior fornecedor de assistência ao país das Caraíbas, apelaram a negociações para resolver a crise, mas afirmaram que “um novo Presidente eleito deve suceder a Moïse no fim do seu mandato, a 2 de Fevereiro de 2022”.

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