Governo do Haiti denuncia tentativa de golpe de Estado

Oposição, apoiada pelo Supremo Tribunal, defende que o mandato do Presidente já acabou, mas o líder haitiano afirma que só termina daqui a um ano.

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Domingo, horas antes das detenções, manifestantes e polícia envolveram-se em confrontos na capital JEAN MARC HERVE ABELARD/EPA

As autoridades do Haiti detiveram 23 pessoas, incluindo um juiz do Supremo Tribunal, pelo seu papel numa alegada conspiração para derrubar o Presidente, Jovenel Moïse. Numa conferência de imprensa na sua residência privada, o primeiro-ministro, Joseph Jouthe, afirmou que entre os detidos também se encontra um alto responsável da polícia – segundo os jornais haitianos trata-se da inspectora-geral Marle-Louise Gauthler, que terá sido encontrada com dinheiro, armas e munições.

O objectivo dos conspiradores “era atentar contra a minha vida”, disse o Presidente Moïse, que falou esta segunda-feira no aeroporto de Port-au-Prince. “Agradeço ao meu chefe de segurança. O plano foi abortado.”

“Estas pessoas tinham contactado responsáveis dos segurança do palácio nacional, altos oficiais do palácio cuja missão era prender o Presidente… e também facilitar a instalação de um novo Presidente”, detalhou o primeiro-ministro, que falou ao lado do ministro da Justiça, Rockfeller Vincent, e do chefe da polícia.

O presidente da Associação Nacional de Magistrados Haitianos, Wilner Morin, diz que a detenção do juiz do Supremo Ivickel Dabrésil é “ilegal” e comparável a um “sequestro”, já que o juiz “beneficia de imunidade e só poder ser detido em flagrante delito”, afirmou ao site de notícias local Ayibopost. Segundo a Al-Jazeera, já “há apelos para novos protestos e a oposição garante que vai manter a pressão sobre o Governo”.

Antes das detenções, no domingo, manifestantes antigovernamentais envolveram-se em confrontos com a polícia na capital e houve protestos contra Moïse noutras cidades. Isto dias depois de os líderes da oposição anunciarem um projecto para substituir o chefe de Estado – para a oposição, apoiada pelo Supremo Tribunal, domingo era o último dia do mandato constitucional do Presidente.

Moïse, que governa por decreto desde meio de Janeiro de 2020, diz que cederá o poder ao vencedor das próximas eleições, previstas para Setembro, mas garante que não se demitirá antes do fim do seu mandato, a 7 de Fevereiro de 2022. Só que para grande parte dos opositores, o mandato deveria ter chegado ao fim um ano antes: a questão é que Moïse foi eleito numa votação anulada por fraude e reeleito um ano mais tarde.

Acusando Moïse de autoritarismo, a oposição planeava apelar a membros da sociedade civil e a vários opositores para escolherem um substituto entre os juízes do Supremo, em vez de esperar pelas eleições. Na base desta decisão estará o anúncio do actual chefe de Estado de que quer referendar emendas à Constituição em Abril, o que levantou receios de que as próximas eleições não sejam livres.

“Os próximos 12 meses serão focados na reforma do sector energético, na realização do referendo e na organização de eleições”, escreveu o Presidente no Twitter, domingo.

No fim de 2019, por entre frequentes apagões, os protestos contra Moïse, acusado de corrupção e má gestão, paralisaram o país de 11 milhões de pessoas, o mais pobre da América e um dos mais pobres do mundo. As manifestações começaram depois da divulgação de um relatório de um inquérito judicial que concluía que o Presidente e antigos ministros e funcionários tinham desviado dinheiro dos cofres do Estado.

Entretanto, as eleições legislativas de Outubro de 2019 não aconteceram, com a maioria dos congressistas a ver o seu mandato chegar ao fim há um ano. “Moïse responsabilizou o Parlamento pelo adiamento, por não ter aprovado uma lei eleitoral, enquanto os seus opositores o acuram de ter manobrado para sequestrar o processo”, resumiu a organização Human Rights Watch.

Ao longo de 2020, a crise só piorou, com um pico de raptos e de criminalidade em geral, ao mesmo tempo que a pandemia de covid-19 abalava ainda mais a economia.

Na sexta-feira, na sequência do plano da oposição para substituir Moïse, a Casa Branca apelou a negociações urgentes para resolver a crise, mas defendeu que “um novo Presidente eleito deve suceder a Moïse no fim do seu mandato, a 2 de Fevereiro de 2022”.

Já o líder da comissão de Negócios Estrangeiros da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, Gregory Meeks, e a congressista Yvette Clarke, apelaram ao secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, para rejeitar a tentativa de Moïse de se manter no poder: numa carta enviada no domingo, sublinham que “membros da oposição enviaram ao Presidente uma mensagem inequívoca de que o seu mandato acaba a 7 de Fevereiro”.

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