“Um dia de festa!”: nasceu o Observatório SKA

É uma megainstituição científica internacional que deu o pontapé de saída oficial, com a primeira reunião do seu órgão de decisão máxima. Portugal está a bordo e investirá 29 milhões de euros durante esta década.

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Ilustração artística das antenas parabólicas do radiotelescópio SKA DR

Pela primeira vez, Portugal é membro fundador de uma organização científica internacional. O Observatório SKA, a organização intergovernamental que vai gerir o radiotelescópio SKA, tornou-se uma realidade a partir desta quinta-feira. Além de Portugal, que investirá no projecto 29 milhões de euros em dez anos, entre os seis fundadores estão a Austrália, Itália, Países Baixos, África do Sul e Reino Unido.

O Observatório SKA (SKAO, na sigla em inglês), que tem a sede no Reino Unido, vai ser um radiotelescópio de cariz intercontinental: as suas antenas estarão espalhadas pela Austrália e África do Sul, podendo expandir-se mais tarde para outros países nesses dois continentes.

Na primeira fase da construção do radiotelescópio, até 2026, serão instaladas 197 antenas parabólicas na África do Sul e 131 mil antenas do tipo dipolo (parecidas com as antenas de televisão) na Austrália. Na segunda, e última, até 2033, fase haverá um total de mais de 2500 antenas parabólicas em África, prevendo-se a expansão para outros países (Moçambique, Namíbia, Botswana, Gana, Quénia, Madagáscar, ilhas Maurícias e Zâmbia), e cerca de meio milhão de antenas do tipo dipolo na Austrália e Nova Zelândia. Nesta fase será ainda instalado em África um terceiro tipo de antenas, que está em testes no Alentejo, em Moura e Beja. Tudo estará ligado por fibra óptica. No total, o SKA custará 1680 milhões de euros.

O SKAO é agora a segunda maior organização intergovernamental de astronomia a nível mundial, a seguir ao Observatório Europeu do Sul (ESO), criado em 1962 (tem hoje vários telescópios no Chile) e ao qual Portugal aderiu como membro de pleno direito no ano 2000.

O SKAO tornou-se realidade a partir desta quinta-feira com a primeira reunião do Conselho do SKAO, o seu órgão governativo e de decisão máxima, que é composto por representantes dos seis Estados-membros, bem como de países com o estatuto de observadores que aspiram juntar-se à organização nos próximos tempos (como Canadá, China, França, Alemanha, Índia, Espanha, Suécia e Suíça.

Esta reunião do Conselho do SKAO, que decorreu a 3 e 4 de Fevereiro (quarta e quinta-feira), foi a primeira depois da assinatura do tratado internacional que criou o Observatório SKA, a 12 de Março de 2019 em Roma, e a subsequente ratificação pelos seis Estados-membros fundadores. O tratado entrou em vigor a 15 de Janeiro deste ano, a data oficial do nascimento do Observatório SKA, explica-se num comunicado de imprensa. No Conselho do SKAO, os países fundadores tomaram agora decisões relativas às áreas prioritárias, à organização interna e aos recursos necessários para iniciar a construção, prevista para o Verão de 2021, com a atribuição dos primeiros contratos.

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Ilustração artística das antenas do radiotelescópio SKA DR

O investigador Domingos Barbosa, que há anos batalha pela adesão de Portugal ao projecto desde a sua raiz, não podia estar mais contente. “Um dia de festa!”, diz o coordenador do Engage SKA, um consórcio de instituições académicas e empresas portuguesas envolvidas no SKA. “É o culminar de dez anos de esforço de colegas que acreditaram num projecto diferente: construindo presença e liderança portuguesa. O SKA contém código genético made in Portugal! Ciência, tecnologia, indústria e uma visão para o desenvolvimento social, juntando esforços de quatro continentes (Europa, Ásia, África, Oceânia e América)”, sublinha Domingos Barbosa, investigador do Instituto de Telecomunicações em Aveiro. Em 2024 ainda não teremos as antenas todas, mas será possível fazer já a primeira ciência.

Portugal vai investir 29 milhões de euros no SKA ao longo de dez anos, principalmente na construção do radiotelescópio, especifica ao PÚBLICO Domingos Barbosa, dizendo que a quota anual que o país tem de pagar à organização está ainda em discussão.

O início da construção do radiotelescópio estava previsto para 2020. “Não arrancou devido à covid e às negociações complexas entre países, entre outras coisas”, informou Domingos Barbosa. “Nos próximos meses vamos estar muito ocupados, na esperança de que novos países formalizem a adesão ao SKAO e com a esperada importante decisão do Conselho do SKAO de dar luz verde ao início da construção dos telescópios”, referiu, por sua vez, Philip Diamond, que é o primeiro director-geral do SKAO.

“Não é um observatório qualquer”

Para o ministro da Ciência, Manuel Heitor, citado no comunicado do SKAO, o facto de Portugal ser membro fundador permitirá que astrónomos e outros investigadores portugueses participem “numa das iniciativas de cooperação científica mais revolucionárias a nível global”. No mesmo sentido seguem as declarações de Ricardo Conde, o representante português no Conselho do SKAO e presidente da Agência Espacial Portuguesa: “Isto é especialmente relevante um país pequeno como Portugal, que tem a oportunidade de fazer parte de algo disruptivo como membro fundador. A comunidade científica e industrial portuguesa está entusiasmada com a perspectiva de avançar para a implementação e execução deste grande desafio.”

Já a primeira presidente do Conselho do SKAO, Catherine Cesarsky, considerou este dia como um “momento histórico para a radioastronomia”. “Por detrás do marco de hoje, há países que tiveram a visão de se envolver profundamente porque viram que benefícios a sua participação no SKA podia trazer para criar um ecossistema de ciência e tecnologia que envolvesse investigação fundamental, computação, engenharia e competências para a próxima geração, que são essenciais numa economia digital do século XXI”, disse a astrónoma, que foi a directora-geral do ESO de 1999 a 2007.

“O dia de hoje marca o nascimento de um novo observatório [de astronomia]”, quis também destacar Philip Diamond, no comunicado. “Não é um observatório qualquer – é uma das megainstituições de ciência do século XXI. É o culminar de muitos anos de trabalho e quero felicitar toda a gente da comunidade SKA e os nossos parceiros governamentais e instituições que tanto trabalharam para que isto fosse possível”, afirmou ainda. “Para a nossa comunidade, trata-se de participar numa das grandes aventuras científicas das próximas décadas. Trata-se de competências, tecnologia, inovação, retorno industrial e spin offs, mas é principalmente numa viagem científica que estamos a embarcar agora.”

O longo caminho de que todos falam começou com a criação em 2011 da estrutura antecessora do SKAO, a Organização SKA, que trabalhou na concepção de todo o projecto, desde a parte da engenharia até às suas prioridades científicas, apoiada por mais de 500 engenheiros e mil cientistas de mais de 20 países.

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