Linha do Algarve tem sistema de telecomunicações que custou 1,4 milhões de euros mas não é utilizado

Foram montadas 16 antenas para comunicações seguras em meio ferroviário, mas revisores e maquinistas usam telemóveis da rede pública.

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A Linha do Algarve está dotada com sistemas de telecomunicações ferroviárias GSM-R, com padrões ao nível dos melhores da Europa, e que passaram pela instalação de 16 antenas, bem visíveis junto às estações e apeadeiros dos troços entre Lagos e Tunes e entre Faro e Vila Real de Sto. António.

Segundo fonte oficial da IP, “o custo de investimento deste sistema e a sua entrada em serviço foi de 1,4 milhões de euros, que inclui a construção de infra-estrutura e a aquisição e instalação de equipamentos activos”. Por outro lado, os custos anuais de manutenção deste sistema são de 20 mil euros.

No entanto, não está a funcionar. Nos comboios do Algarve, as tripulações da CP (maquinistas e revisores) contactam entre si e com o centro de comando operacional da Infra-estruturas de Portugal (em Faro e em Lisboa) através de simples telemóveis que utilizam a rede pública.

O sistema é relativamente fiável, até porque no litoral algarvio há boa cobertura de rede. Mas os próprios ferroviários acham anacrónico que tenham de utilizar telemóveis (fornecidos pela empresa) para comunicar em meio ferroviário quando existem infra-estruturas de telecomunicações próprias, preparadas para o fazerem dentro de regras de segurança mais apertadas para este tipo de comunicações operacionais.

A própria IP reconhece que “actualmente as comunicações estão ainda suportadas em operador público de telecomunicações (GSM), tendo a empresa desenvolvido um novo sistema dedicado de comunicações de segurança entre o comboio e o CCO [centro de comando operacional], o qual é utilizado noutros locais da rede ferroviária nacional e que assegura todos os requisitos de segurança”.

Mas questionada sobre o motivo pelo qual não está a funcionar, a IP não esclareceu. Limitou-se a dizer que “durante todo o processo de desenvolvimento e instalação do GSM-R houve sempre uma coordenação estreita entre a IP e a CP no sentido de o sistema cumprir com as directivas de interoperabilidade em novas linhas modernizadas”.

Por sua vez, a CP também nada disse sobre o motivo pelo qual o sistema não está em funcionamento. Fonte oficial da empresa disse que está em curso um processo de migração do actual sistema para o GSM-R, existindo já uma automotora que incorporará a bordo o equipamento necessário para comunicar com as antenas instaladas ao longo da Linha do Algarve.

A ausência deste sistema faz com que, entre Lagos e Tunes, formalmente, o maquinista não receba comunicações directas do CCO a alertar, por exemplo, para afrouxamentos ou situações de perigo na via, sendo estas recebidas pelo revisor, que se deverá dirigir à cabina de condução para as transmitir.

O Algarve não é caso único. O moderno sistema de radiocomunicações GSM-R está também instalado na Linha de Cascais, que, neste aspecto já está preparada para o século XXI. Mas não é utilizado, mantendo-se em vigor o analógico Rádio Solo Comboio.

Devagar e devagarinho

Além de sistemas de telecomunicações desajustados, uma parte da Linha do Algarve tem também um sistema de sinalização desconforme, fruto de uma opção minimalista e mais barata para gerir o tráfego ferroviário. Apesar de ter sido instalada há poucos anos e de ser tecnologia moderna, o troço entre Lagos e Tunes é o único do país onde o software não permite que sinais avançados comuniquem com os sinais à entrada das estações.

Quer isto dizer que a sinalização é demasiado restritiva e obriga os comboios a perder tempo inutilmente na aproximação às estações, mesmo quando não há cruzamentos nem qualquer motivo para circular a velocidades tão baixas. Há estações onde, a 500 metros do ponto de paragem, o comboio tem de circular a 24 km/hora e outras onde, quando este parte, tem de manter uma velocidade de 14 km/hora, durante centenas de metros, até atingir o sinal de saída e poder ir mais depressa.

O PÚBLICO perguntou à IP se considera que o actual sistema da sinalização na Linha do Algarve dá ao operador as prestações mais adequadas e se prevê alterar esse sistema aquando da electrificação daquela linha. A empresa não respondeu.

A resolução destas restrições não é muito cara, bastando “mexer” no software de sinalização e instalar alguns cabos na via-férrea. Poderia poupar alguns minutos nas viagens de comboio algarvias, as quais, já de si, são lentas por outros motivos. As automotoras são velhas e estão limitadas a 120 km/hora, mas as velocidades permitidas pela infra-estrutura raramente passam dos 90 km/hora. De resto, no “ponta a ponta”, entre Vila Real de Sto. António e Lagos, só circulam comboios regionais com paragens em todas as estações e apeadeiros (Alfas e Intercidades só utilizam a parte central da Linha do Algarve entre Tunes e Faro).

A CP já fez saber que, após a electrificação da totalidade da linha, pretende criar comboios de marcha rápida, inter-regionais ou intercidades, entre o Sotavento e o Barlavento, bem como prolongar o Alfa Pendular de Faro até Vila Real de Sto. António. Mas tais serviços ficarão prejudicados se se mantiver o sistema de sinalização actual.

Segundo o Ferrovia 2020, a electrificação da Linha do Algarve, estimada em 31,6 milhões de euros, deveria ter arrancado em Junho de 2019 para ficar concluída em Março de 2021. Mas só agora foram lançados os primeiros concursos públicos. A nova calendarização aponta para 2023.

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