Arqueólogos pedem ao MP recurso da sentença de vandalismo no Parque do Côa

Tribunal de Foz Côa absolveu os dois homens acusados de vandalizar uma gravura com o chamado “Homem de Piscos”, classificado como monumento nacional e como património mundial pela UNESCO.

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A rocha com o chamado "Homem de Piscos" foi vandalizada no dia 25 de Abril de 2017 DR

A Associação de Arqueólogos Portugueses (AAP) pediu esta segunda-feira ao Ministério Público (MP) para recorrer da sentença que absolveu dois homens por alegados actos de vandalismo numa gravura do Parque Arqueológico do Côa.

“Após a avaliação dos dados recolhidos, entre os quais a leitura da própria sentença judicial, e sem prejuízo de análise mais aprofundada, a direcção do AAP considera existir matéria de recurso, instando o MP a que a requeira”, indicou a associação, em comunicado.

A direcção da AAP disse que já manifestou “formalmente o interesse em se constituir assistente no processo”, acompanhando “a Fundação Côa Parque, constituída assistente em primeira instância”. Para a Associação de Arqueólogos Portugueses, está em causa “uma rocha de especial valor, por conter a representação de uma das raras figurações humanas, não somente deste complexo rupestre como da arte paleolítica em geral – o chamado ‘Homem de Piscos'”, situada naquele parque do distrito da Guarda.

Em sentença proferida em 21 de Janeiro, o Tribunal de Foz Côa absolveu os dois homens acusados de vandalizar uma gravura no Parque Arqueológico do Vale do Côa, nomeadamente do pagamento de uma indemnização de cerca de 125 mil euros.

Na primeira audiência de julgamento, em Setembro de 2020, os arguidos, de 37 anos, afirmaram que não tiveram “a percepção de que, na rocha onde fizeram o desenho e inscrição “BIK”, houvesse alguma gravura rupestre. Na leitura da sentença, a juíza referiu que, após ouvir peritos e testemunhas envolvidas, classificava os factos como uma “atitude lamentável” por se tratar de património classificado, contudo, determinou a absolvição dos dois arguidos.

No início do julgamento, em 20 Setembro de 2020, os dois homens confessaram a prática do crime em tribunal. Para os dois arguidos, “tudo não passou de um impulso irreflectido”, e nunca tinham ouvido falar na existência da gravura em causa (“Homem de Piscos”).

Os factos remontam ao dia 25 de Abril de 2017 e foram denunciados no dia 28 pela Fundação Côa Parque, que gere o PAVC e o Museu do Côa, e o Ministério Público (MP) imputou aos dois arguidos o crime de “prática de dano qualificado, punível com pena de prisão de dois a oito anos”. O MP deduziu ainda um “pedido de indemnização cível, em representação do Estado, reclamando o pagamento de valores de reparação das rochas e perda de receitas que ascendem a 125 mil euros”, indicava, em 10 de Dezembro de 2019, a página oficial da Procuradoria-Geral Distrital de Coimbra.

Na ocasião, a Polícia Judiciária (PJ) anunciava ter identificado dois homens suspeitos do vandalismo de que foi alvo uma gravura do PAVC, sítio arqueológico da ribeira de Piscos. De acordo com aquela polícia, os suspeitos foram considerados “responsáveis pela produção de dois desenhos e uma inscrição sobre o Painel Central de Arte Rupestre da Ribeira de Piscos, vulgarmente conhecido pela representação do “Homem de Piscos”, classificado como monumento nacional e como património mundial pela UNESCO”.

Os arqueólogos do PAVC garantiram que se trata de um conjunto de gravuras que sobreviveram intactas durante mais de 10 mil anos e que foram “miseravelmente mutiladas pela ignorância de alguém”.