Fecho de fronteiras avança debaixo do protesto dos autarcas

Das cinco pontes que ligam o Alto Minho à Galiza, apenas uma estará aberta diariamente até ao final do novo estado de emergência. Autarcas de vários concelhos locais estão contra o encerramento, que dizem ser “ineficaz”, e contestarão a decisão do Governo por “formas legais”.

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Hoje só se circulou na Ponte Internacional que liga Tui a Valença, e em situações excepcionais Nelson Garrido
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Três das cinco pontes que ligam o Alto Minho a Espanha estarão fechadas por 15 dias Nelson Garrido
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As fronteiras foram vigiadas pelo SEF, GNR e, do lado espanhol, pela Polícia Nacional Nelson Garrido
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Em circunstâncias normais, Alberto Pereira regressaria a Portugal através da Ponte Internacional da Amizade, que se lança sobre o rio Minho para ligar Tomiño a Vila Nova de Cerveira. Com esse percurso interdito, o motorista viu-se obrigado neste domingo a percorrer mais 30 quilómetros: atravessou o mesmo rio que banha os dois países, mas pela Ponte Internacional, entrando em Tui e saindo em Valença, já na A3. Ali, encontrou uma operação de controlo na fronteira portuguesa, mas não fez caso: “É normal. Ando por todo o lado e controlos há por todo o continente europeu.” Tranquilo, mostrou a documentação necessária aos agentes do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) e seguiu as instruções dos militares da Guarda Nacional Republicana (GNR) destacados para o trabalho.

Elementos das autoridades portuguesas estarão naquele local “24 horas por dia, todos os dias” até às 23h59 de 14 de Fevereiro, data para o término do novo estado de emergência, que entrou em vigor à meia-noite deste domingo e que determinou a reposição do controlo nas fronteiras. Do lado da fronteira espanhola, o controlo é feito pela Policía Nacional. É um dos oito pontos fronteiriços abertos em permanência em Portugal; na região, é o único.

Se Alberto Pereira não pôde seguir para casa pela Ponte Internacional da Amizade, outros não o puderam (nem poderão) fazer através da que liga Melgaço a Arbo e da Ponte Eiffel, também em Valença: estes três pontos de acesso estão, por enquanto, encerrados. Por outro lado, a ligação entre Monção e Salvaterra do Miño apenas estará aberta entre as 7h e as 9h e as 18h e as 20h aos dias úteis.

Este domingo, tanto do lado espanhol como do português, não houve filas a encher os quilómetros da Ponte Internacional. Mas o cenário não será o mesmo de segunda a sexta-feira: “Neste momento estamos seis militares, mas esse número vai ser ajustado à fluidez do trânsito. Pode haver dias em que sejamos mais, como na madrugada desta segunda-feira. As pessoas voltam a trabalhar, por isso estamos à espera que o trânsito aumente”, explicou o Capitão Ivo Morais, do posto territorial da GNR de Valença. Do lado do SEF, o número de elementos previsto “rondará os quatro”, disse um dos agentes.

Fronteira de Valença Nelson Garrido
Vila Nova de Cerveira Nelson Garrido
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Fronteira de Valença Nelson Garrido

Um “desconhecimento da realidade local”

O aumento do trânsito no único ponto de acesso permanente à Galiza no Alto Minho ao longo dos próximos dias não é apenas uma perspectiva das autoridades portuguesas. Para o Agrupamento Europeu de Cooperação Territorial (AECT) do Rio Minho, presidido por Fernando Nogueira, o encerramento de três pontes sobre o rio Minho contribuirá para o afunilamento do tráfego naquele local e concentrará “mais centenas ou milhares de pessoas em filas intermináveis de trânsito”. O também presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Cerveira refere que a decisão do Governo demonstra “um desconhecimento da realidade” local. “Se existem estas pontes, é porque são necessárias. Há um fluxo de 6000 trabalhadores diários. Trazê-los para um único ponto de passagem será pior e vai potenciar ainda mais os contactos e contágios”, diz o autarca ao PÚBLICO.

Para além disso, Fernando Nogueira nota que, no caso dos trabalhadores transfronteiriços, pesa ainda a questão da diferença horária: “Às 7h são 8h em Espanha. Há alguns portugueses que às 8h já têm de estar a trabalhar lá.” Essa limitação notar-se-á também na ligação de Monção a Salvaterra do Miño, com horários limitados. “O horário não serve ninguém. Servirá muito pouca gente. Há uma falta de bom senso”, opina António Barbosa, presidente daquele município. Em igual medida, Manuel Lopes, presidente da Câmara Municipal de Valença, acredita que estas restrições “não adiantarão mais do que estava implementado”. “[O Governo] não tem noção do que é o território”, aponta.  

As preocupações estendem-se aos autarcas de vários concelhos do Alto Minho — especialmente aos que governam os territórios com ligação directa a Espanha. Os trabalhadores transfronteiriços de Melgaço que utilizavam a ponte que alcança o município espanhol de Arbo terão de, agora, somar 40 quilómetros ao percurso para se deslocarem a Valença (e outros tantos na volta). Para Manoel Batista, presidente da Câmara Municipal de Melgaço, “o encerramento das pontes é ineficaz” e “o problema pandémico não se põe”, já que a mobilidade é restrita, tanto do lado português como do galego. O autarca assumiu “uma posição mais dura do que o habitual” para protestar contra a decisão da administração central: o município “não vai fornecer nenhum apoio logístico” para encerrar a ponte. 

“Ou seja, vai ter de haver disponibilidade de homens da GNR que poderiam estar lá diariamente”, comenta o presidente da Câmara Municipal de Caminha, Miguel Alves. Apesar de naquele município não existir uma ponte, a conexão ao território espanhol — mais precisamente a A Guarda — fazia-se através do ferryboat; contudo, também essas viagens estão suspensas. E os trabalhadores transfronteiriços do município (bem como os que chegam de Espanha) terão de se deslocar a Valença e não a Cerveira, cujo acesso é mais próximo. “No primeiro confinamento, as medidas afectaram a economia. Mas a economia local, agora, está a zeros. Por isso, os prejudicados são os trabalhadores portugueses e espanhóis”, acrescenta.

Apesar de tudo, os autarcas compreendem que, num momento de agravamento da situação pandémica, as medidas tenham de ser “dramáticas”. Ainda assim, José Maria Costa, presidente do município de Viana do Castelo, espera ver esta situação “rectificada”. É que durante o primeiro confinamento geral, em Março de 2020, a situação era idêntica; contudo, após “protestos conjuntos das autarquias de ambos os lados da margem do rio Minho”, quase todas as pontes, à excepção da Eiffel, reabriram.

Em comunicado enviado à agência Lusa, a AECT refere que as autarquias da região “estão disponíveis para colaborar com a administração central e com as autoridades policiais para encontrar uma alternativa”. No mesmo documento, lê-se que “as autarquias afectadas vão contestar estes encerramentos pelas formas legais ao seu alcance, em interesse superior dos trabalhadores transfronteiriços”.

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