“Há crianças que não comem quando a escola está fechada”
O secretário de Estado adjunto e da Educação, em conversa com a candidata presidencial Ana Gomes, diz que é preciso ver a escola “não apenas como espaço de aprendizagem, mas como espaço de protecção social”.
O secretário de Estado adjunto e da Educação justificou esta terça-feira a opção do Governo em manter as escolas abertas. Usou a palavra “cautela”, alegando que quando a escola fecha “há crianças que não comem” e enfrentam vários outros riscos ou perigos que ficam pode detectar.
João Costa era o convidado da conversa online que a candidata presidencial Ana Gomes promove diariamente nas suas redes sociais. E disse que, apesar de os números relativos à pandemia de covid-19 serem alarmantes, é preciso “algum sangue frio, nervos de aço” na forma como se analisam os dados.
Após declarar publicamente o seu apoio à candidata apoiada pelo PAN e o Livre, porque “nestas eleições está em debate (…) a salvaguarda maior da (...) democracia”, o secretário de Estado começou a falar sobre o impacto que a pandemia teve até hoje nos sistemas educativos, que segundo “algumas análises” foi “ainda maior do que a 2.ª Guerra Mundial”. E defendeu que, por isso, é preciso olhar para o eventual encerramento das escolas com cautela. “Sobretudo não olhar para o que é uma escola fechada a partir de um lugar privilegiado”, disse.
Alguns alunos não têm as condições para estudar em casa: “Não é só não terem computador, ou Internet, é não terem um espaço sozinhos em casa, terem um contexto barulhento, violento por vezes, não terem quem os acompanhe, quem os tire da cama para ligarem o computador, não terem a quem recorrer para pôr dúvidas”. Para João Costa, é preciso ver a escola “não apenas como espaço de aprendizagem, mas como espaço de protecção social”, onde “situações de abuso são muitas vezes identificadas pela atitude do aluno, um olhar triste”. “À distância, por ‘Zooms’ e ‘Teams’ isto não se vê, não se detecta”, alertou.
O secretário de Estado disse ainda que, segundo a avaliação do próprio Ministério da Educação, “há um grande desaparecimento de alunos das comunidades ciganas após o confinamento”. “E como são populações nómadas é muito difícil encontrá-los”, disse, lembrando ainda que há um trabalho de prevenção do casamento precoce junto destas comunidades.
Citando a Sociedade Portuguesa de Pediatria, lembrou que algumas crianças tiveram “profundas regressões em termos de desenvolvimento” no confinamento da Primavera. Reiterando intervenção anterior no debate da deputada na Assembleia Legislativa da Madeira e mandatária da candidatura de Ana Gomes naquela região autónoma, Elisa Seixas, disse que “há crianças que não comem quando a escola está fechada”.
Citando mais uma vez Elisa Seixas, defendeu que a escola é um espaço onde até é mais fácil a prevenção da contaminação com covid-19, sobretudo para os alunos mais velhos. “São espaços muito mais controlados do que andarem pela cidade sem qualquer contenção”, disse. “Há aqui muitas dimensões do que é uma escola plena, que ensina, mas também desenvolve competências sociais, protecção social”, considerou, reiterando: “Não podemos ser precipitados”.
Recorde-se que o primeiro-ministro, António Costa, disse esta terça-feira na Assembleia da República que não hesitará em fechar estabelecimentos de ensino se verificar que a variante inglesa do novo coronavírus, mais contagiosa, se tornou dominante. A declaração surgiu menos de 24 horas depois de ter anunciado novas medidas de contenção da pandemia, sem no entanto alterar a decisão de manter as escolas abertas e com ensino presencial.
Sem se referir em concreto à questão do encerramento das escolas, Ana Gomes sublinhou no debate desta terça-feira o “extraordinário papel da escola pública em fazer essa transformação” da sociedade e em dar “ferramentas que são mais do que o conhecimento livresco. É o conhecimento da vida”. “A educação para a cidadania é o que se faz em todos os azimutes na escola (…) e sem cidadãos informados, conscientes não há democracia que funcione”, sublinhou a candidata.
Já numa acção de campanha em Almada, Ana Gomes afirmou que poderá ser indispensável encerrar as escolas por os hospitais estarem “no limite”. “Já tivemos informação esta manhã de dirigentes de escolas que não são nada alarmistas que, neste momento, acham que vai ser indispensável fechar as escolas, mas é uma decisão que cabe ao Governo”, disse.