Não vou votar. E vocês? Todos sabemos que o voto é a nossa voz para ajudar a mudar ou a manter o estado das coisas. É a ferramenta que nos permite ter legitimidade para opinar sobre esse mesmo estado de coisas e uma das principais armas de uma democracia. E ainda assim eu não vou votar.
E não o vou fazer porque Portugal não mo permite.
Por ser emigrante em Berlim e por me encontrar em Portugal a trabalhar remotamente estou impedido de votar de acordo com a Lei Eleitoral. Isto só por si é irrelevante para as eleições, é um problema meu. O problema é que não é só meu, é de muitos. Ainda para mais num ano como este, onde na sequência do ano anterior muitos de nós passaram a trabalhar a partir de casa e, como tal, muitos optaram por fazê-lo a partir de Portugal, especialmente no pós-Natal. Ora não sendo apenas um problema meu, mas sim de muitos, passamos a ter um grande problema.
Vou explicar de forma sucinta para que entendam a situação, caso não estejam familiarizados com a mesma. Um emigrante português que tenha a sua morada fiscal noutro país tem de votar na embaixada portuguesa desse mesmo país (salvo raras excepções que desconheço), pois a embaixada funciona como território nacional no estrangeiro. Até aqui tudo certo. O problema é que por estarmos recenseados lá, não temos qualquer hipótese de votar caso estejamos cá. E aí já faz menos sentido, especialmente num momento como este, em que vivemos uma pandemia global e onde muitos de nós trabalham remotamente porque a conjuntura geral assim o permite.
Não acredito que ninguém tenha previsto este cenário. E se previram, não acredito que seja assim tão difícil conseguir uma solução. Portanto, tendo isto em conta, a constante contestação e o reportar sucessivo e sistemático dos visados em eleições passadas e combinando isso com as elevadas taxas de abstenção que apresentamos sucessivamente, fica muito difícil não achar esta situação bizarra e amadora.
Somos as gerações mais formadas e informadas de sempre (como todas as últimas gerações são, calma, não acho que sejamos especiais), somos uma emigração que quer ter voz e o que o país faz é tirar-nos essa oportunidade.
É fantástico que se encontrem diversas soluções para que a população consiga votar. É de aplaudir. Mas é ridículo não encontrarem nenhuma solução para os emigrantes. Para nós, que somos portugueses e estamos em Portugal no momento, mas também para os que estão fora e devido a restrições não vão conseguir exercer o seu direito de voto nos respectivos países onde estão recenseados.
Tudo isto era previsível, mas não foi evitado. Poderíamos sugerir uma votação online — onde a Estónia é pioneira — que resolveria grande parte destes problemas. Mas já só se pedia algo mais simples como poder facultar a morada nacional onde estamos confinados em Portugal e votar em concordância geográfica com essa morada, por exemplo. Não resolvia tudo, mas resolvia isto.
Mas, pior ainda, só ver todos aqueles que podem ter voz e optam pelo silêncio e conforto do sofá. E isso não tem justificação, especialmente no momento político que atravessamos. Especialmente pelo que outros lutaram para que hoje tivéssemos este direito e esta liberdade.
Por isso, se ao contrário de nós podes votar, por favor exerce esse direito. Vota. E se vais fazê-lo, fá-lo com bom senso. Pela liberdade, pela democracia e por todos nós.
Podemos estar lá fora, mas não estamos por fora nem queremos ficar de fora.