Glicose pode beneficiar tratamento do cancro com células imunitárias

A imunoterapia celular caracteriza-se pela transferência para o organismo de células imunitárias, no caso linfócitos T gama-delta, um subtipo de linfócitos T, para tratar o cancro.

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Célula cancerosa da mama Dr

O tratamento do cancro com certas células do sistema imunitário pode ser beneficiado pela glicose (açúcar simples) e prejudicado pelo colesterol (tipo de gordura), conclui um estudo divulgado esta segunda-feira feito em Portugal com ratinhos.

Desenvolvido pelo Instituto de Medicina Molecular (IMM) João Lobo Antunes, em Lisboa, o estudo publicado esta segunda-feira na revista científica Nature Immunology revela que a glicose adicionada a linfócitos T gama-delta (células imunitárias), que são preparados em laboratório para serem usados como terapia celular para o cancro, faz com que tenham “uma capacidade antitumoral bastante aumentada, inibindo o crescimento tumoral”.

A explicação foi dada à agência Lusa pelo líder da equipa do IMM, o imunologista e vice-director do instituto, Bruno Silva-Santos, que clarificou que se trata da glicose fornecida às células manipuladas em laboratório para combater o cancro. “Não se trata de uma dieta​ rica em açúcar! Esse tipo de alimentação ajudaria também o tumor a crescer, pelo que não é recomendável”, frisou.

O estudo concluiu, por outro lado, que “altas concentrações de colesterol favorecem funções imunitárias pró-tumorais, a produção de moléculas que ajudam o tumor a crescer”. “No caso do colesterol, o estudo mostra que ele é prejudicial tanto no cultivo dos linfócitos T gama-delta como após injecção no organismo”, assinalou Bruno Silva-Santos.

A imunoterapia celular caracteriza-se pela transferência para o organismo de células imunitárias, no caso linfócitos T gama-delta, um subtipo de linfócitos T, para tratar o cancro, o que “requer a sua activação e expansão durante o cultivo em laboratório”.

Para o trabalho agora publicado foram cultivados em laboratório, a partir de ratinhos, linfócitos T gama-delta, considerados promissores no tratamento do cancro, com várias “receitas mais ou menos ricas em glicose ou colesterol”.

A equipa científica estudou o metabolismo destes linfócitos e o “seu impacto na multiplicação e produção de moléculas essenciais para a resposta a tumores”, tendo depois injectado as células em ratinhos com cancro da mama e cancro colorrectal e seguido “o impacto sobre o crescimento do tumor”.

Para o imunologista Bruno Silva-Santos, que tem estudado o papel destas células na imunoterapia do cancro, as conclusões revelam-se importantes, na medida que indiciam como será possível optimizar as funções antitumorais dos linfócitos T gama-delta para que, uma vez injectados no organismo, “consigam fazer o seu trabalho”, isto é, “persistir no corpo, reagir contra o tumor e matar as células malignas poupando as células saudáveis”.

O estudo concluiu, ainda, que é no timo, órgão por cima do coração onde são gerados os linfócitos T, incluindo os gama-delta, que estes últimos são como que “instruídos” com “a correspondência entre glicose e funções antitumorais e entre colesterol e funções pró-tumorais”.

O próximo passo da investigação vai ser “como tirar partido deste conhecimento em seres humanos”, disse Bruno Silva-Santos, acrescentando que a equipa irá “analisar o impacto da regulação metabólica” na produção de linfócitos T gama-delta humanos para fins terapêuticos.

Ensaios clínicos com estas células, para uso como tratamento para o cancro, deverão iniciar-se ainda este ano, adiantou, sublinhando que “será importante seguir os níveis do “mau colesterol” nos doentes tratados para inferir o possível impacto que altos níveis de colesterol possam ter na eficácia do tratamento”.

O estudo agora publicado teve a colaboração de investigadores da Faculdade de Medicina de Harvard, nos Estados Unidos, e da Universidade Queen Mary de Londres, no Reino Unido.