Procuradora-geral da República manda averiguar actuação do Ministério Público no caso dos jornalistas vigiados
Lucília Gago quer saber se o Ministério Público exorbitou as suas competências.
A procuradora-geral da República, Lucília Gago, anunciou há minutos a instauração de processo de averiguação destinado a apurar se o Ministério Público exorbitou as suas competências no caso em que mandou a PSP espiar dois jornalistas para descobrir as suas fontes de informação no processo e-Toupeira.
Segundo uma nota informativa, a averiguação foi aberta por Lucília Gago na qualidade de presidente do Conselho Superior do Ministério Público (CSMP), o órgão responsável pela disciplina dos procuradores. O processo destina-se “a aferir da relevância disciplinar da actuação do Ministério Público”, refere a mesma nota.
A decisão de Lucília Gago surge depois de a ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, ter remetido para o CSMP a avaliação das acções da procuradora de Lisboa que mandou vigiar jornalistas, num inquérito sobre violação do segredo de justiça.
Foi numa resposta enviada à agência Lusa que Francisca Van Dunem manifestou a sua posição e referiu que as competências para a avaliação do trabalho dos procuradores do MP cabem ao Conselho Superior do Ministério Público, órgão constitucional “dotado de independência e de autonomia”.
Porém, ao que o PÚBLICO apurou junto de várias fontes do Conselho Superior do Ministério Público, para a questão ser avaliada, apenas podia ser suscitada por um dos membros do conselho ou a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR).
A PGR até esta quinta-feira não se tinha manifestado sobre um eventual inquérito e apenas tinha sido emitida uma nota do Ministério Público (MP) em que foi dito que a vigilância aos jornalistas foi feita de forma legal e que não necessitava da autorização de um juiz.
Também até esta quinta-feira, não havia intenção por parte dos próprios membros do CSMP de avaliar a questão. Houve reunião na última quarta-feira e ninguém abordou o assunto. A próxima está marcada para Fevereiro.
Entretanto, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda também anunciou que requereu à 1º Comissão Parlamentar, a audição urgente da Procuradora Geral da República, dos membros do Conselho Superior do Ministério Público designados pela Assembleia da República, da Entidade Reguladora da Comunicação Social e do Sindicato dos Jornalistas.
O partido diz que o facto de, entre Abril e Junho de 2018, dois jornalistas terem sido seguidos e fotografados na via pública por elementos do Núcleo Operacional da Polícia de Segurança Pública cumprindo uma ordem nesse sentido, exarada por uma Procuradora da República em serviço no Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa, sem a respectiva ratificação por um juiz, a ser verdade, é de “uma extrema gravidade e carece de cabal esclarecimento”.
“Com efeito, a protecção do sigilo das fontes jornalísticas é uma garantia essencial da liberdade de expressão e da liberdade de informação, elementos absolutamente fundamentais de um Estado de Direito Democrático”, justifica o Bloco de Esquerda, acrescentando que, “não pode o parlamento interferir em processos judiciais, mas não pode demitir-se de defender o Estado de Direito, procurando obter todos os esclarecimentos que são devidos não sobre qualquer processo em concreto, mas sim sobre procedimentos de actuação que constrangem liberdades fundamentais”.
Esta polémica está relacionada com o facto de o Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Lisboa ter instaurado, em 2018, um inquérito para apurar fugas de informação no processo e-Toupeira, tendo constituído arguidos o coordenador superior da Polícia Judiciária Pedro Fonseca e os jornalistas Carlos Rodrigues Lima, da revista Sábado, e Henrique Machado, ex-correio da Manhã e actualmente na TVI.
No inquérito, em Abril de 2018, a procuradora Andrea Marques pediu vigilância policial para os dois jornalistas, decisão contestada pelos profissionais que consideram o procedimento ilegal.