As próximas vacinas para a covid-19: a da Janssen dá bons resultados com uma dose

Empresa espera poder começar a comercializar a vacina em Março. Espera-se que tenha uma eficácia em torno dos 80%, mas tem a vantagem de poder ser administrada de uma vez só.

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A protecção parece ser maior com duas doses da vacina da Janssen, mas com uma só dose, a produção de anticorpos continuava passados 71 dias LUSA/SEDAT SUNA

A vacina contra a covid-19 que está a ser desenvolvida pela Janssen, e que deve ser avaliada pela Agência Europeia do Medicamento (EMA) em Fevereiro, consegue provocar uma boa resposta imunitária com uma única dose: 90% de 805 voluntários com idades entre os 18 e os 55 anos que foram vacinados tinham anticorpos 29 dias depois, que os protegiam da infecção pelo novo coronavírus, e 57 dias depois todos os voluntários tinham essa protecção.

Mas na verdade, a quantidade de anticorpos e a protecção antiviral aumenta se forem dadas duas doses da vacina – tal como acontece com as vacinas da Pfizer-BioNtech, Moderna e a da AstraZeneca-Universidade de Oxford, esta última em apreciação pela EMA –, concluiu o estudo publicado quarta-feira na revista New England Journal of Medicine, que faz a análise intermédia dos ensaios clínicos que ainda estão a decorrer, na Bélgica e nos Estados Unidos. Com 56 dias de intervalo entre as duas doses, a pessoa vacinada tem mais do dobro de anticorpos neutralizantes do vírus.

Ainda assim, com uma única dose, passados 71 dias, a quantidade de anticorpos era ainda elevada – em alguns casos, continuava a aumentar, relatam os cientistas.

Até ao fim de Janeiro devem ser publicados resultados da vacina em voluntários com mais de 65 anos, diz a agência Reuters. Fadiga, dor de cabeça, dores musculares e no local da infecção e febre são os sintomas adversos mais frequentes.

Os ensaios ainda estão a decorrer. Só devem terminar na última semana de Janeiro, ou primeira de Fevereiro, disse Paul Stoffels, director científico da Johnson & Johnson, proprietária da Janssen. É nessa altura que a empresa pensa formalizar a autorização para uso de emergência na Europa e nos EUA.

“Uma vacina que tenha apenas uma dose terá um impacto tremendo em termos de saúde pública, em países de baixos rendimentos, claro, mas também nos países ricos”, comentou com o jornal New York Times Ruth Faden, professora de bioética na medicina na Universidade de Johns Hopkins (EUA). Se mais pessoas tiverem imunidade contra o novo coronavírus, este mais dificilmente continuará a circular na população.

Moncef Slaoui, o cientista que dirige a operação para o desenvolvimento de vacinas contra a covid-19 da operação Warp Speed, nos Estados Unidos, disse esperar que a eficácia da vacina da Janssen – que é propriedade da norte-americana Johnson & Johnson – possa ter uma eficácia em torno dos 80%. Isto seria menos que os 95% das vacinas da Pfizer-BioNtech e da Moderna, mas ainda assim bastante acima do mínimo exigido pelas agências reguladoras dos medicamentos, que é de 50%.

Problemas de produção

Paul Stoffels disse à Reuters que o grupo trabalhou com o objectivo de conseguir uma vacina que tivesse uma eficácia mínima de 60%, mas ambicionando 70% ou 80%. Esta vacina usa uma tecnologia diferente da do ARN-mensageiro (ARNm) utilizado pela Moderna e pela Pfizer-BioNtech, e tem a vantagem de não ser tão exigente em termos de refrigeração.

Serve-se de um vírus modificado, no caso um adenovírus do tipo 26 (Ad26) que leva para as células humanas um fragmento do material genético com que o coronavírus comanda a produção de uma das suas proteínas. É também uma tecnologia nova, mas não é inédita no uso de vacinas, como a do ARNm; já serviu para desenvolver várias vacinas contra o ébola, por exemplo.

A vacina já começou a ser produzida antecipadamente em vários pontos do planeta – Estados Unidos, Europa, África do Sul e Índia –, antecipando a sua autorização para uso humano, mas Stoffels não quis avançar quantas doses poderiam estar disponíveis em Março, a altura em que espera que tanto nos EUA como na Europa possa ser autorizada. “Vamos aumentar a produção ao longo do ano. O objectivo é produzir mil milhões de doses em 2021. Se for usada como dose única, chega para mil milhões de pessoas”, sublinhou.

Mas o New York Times noticiou que, apesar de todos estes preparativos antecipados, a Johnson & Johnson e a Janssen estão a ter atrasos na produção das vacinas – como as restantes farmacêuticas, aliás. O contrato assinado com o Governo norte-americano previa que tivesse 12 milhões de doses prontas no fim de Fevereiro, e 100 milhões no fim de Junho. Mas, segundo o jornal, a empresa está pelo menos dois meses atrasada e não conseguirá recuperar pelo menos até Abril.

No lote da União Africana

Ainda assim, a Janssen, tal como a Pfizer e a AstraZeneca assinaram esta semana contratos para fornecer à União Africana (UA) 270 milhões de doses de vacinas contra a covid-19, anunciou o presidente da UA, Cyril Ramaphosa. Pelo menos 50 milhões de doses devem ser fornecidas “durante o período crucial de Abril a Junho”, adiantou o chefe de Estado da África do Sul.

Mas espera-se que todas estas doses cheguem ao continente ainda este ano – num momento em que se acumulam dúvidas sobre como conseguirão os países africanos vacinar as suas populações, dado que as nações mais ricas têm adquirido quantidades exorbitantes de vacinas, que ultrapassam já o número de habitantes do planeta.

A iniciativa COVAX, montada pela Organização Mundial da Saúde, a aliança GAVI e outras organizações que promovem o acesso às vacinas, com o objectivo de garantir que 2000 milhões de doses de vacinas até ao fim de 2021 a países mais pobres, enfrentam de falta de financiamento. As primeiras vacinas que serão distribuídas ao abrigo da COVAX, entre Fevereiro e Junho, só devem alcançar os trabalhadores de saúde que estão na linha da frente, frisou Ramaphosa, citado pela Reuters.

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