Villa romana de S. Cucufate proposta a monumento nacional

A emergência da nova agricultura alertou a Direcção Regional de Cultura do Alentejo para a necessidade de criar uma Zona Especial de Protecção em redor do monumento.

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CL CARLOS LOPES - PòBLICO

A Direcção Regional de Cultura do Alentejo (DRCAlentejo) propôs a classificação das ruínas de São Cucufate, que é Imóvel de Interesse Público desde 1947, a monumento nacional, or considerar que a villa romana, localizada em Vila de Frades, Vidigueira, tem um “carácter único e excepcional a nível nacional e não só.” 

A Direcção-Geral do Património Cultural já publicou o anúncio n.º 281/2020 para a “abertura do procedimento de ampliação da classificação das ruínas do antigo Convento de São Cucufate”. A directora da DRCAlentejo, Ana Paula Amendoeira, explicou ao PÚBLICO que este procedimento responde à “necessidade” de adequar o instrumento de protecção legal à realidade monumental das ruínas conservadas, realçando a “sua excepcionalidade e o seu valor patrimonial, histórico e cultural intrínseco”. Este conjunto de factores de natureza patrimonial exige uma redefinição da área do sítio a classificar com a “mais alta categoria de classificação nacional” e que passa a integrar todos os vestígios de construções existentes e conhecidos numa Zona Especial de Protecção. Um acrescido esforço de protecção face à realidade do mundo rural nos dias de hoje. 

Com efeito, está em debate a elaboração de um instrumento legislativo que salvaguarde o património histórico alentejano com destaque para as centenas de testemunhos megalíticos que ponteiam sobretudo o Alentejo central.

Os exemplos já conhecidos de destruição de vestígios arqueológicos, sacrificados ao novo modelo cultural que, desde 2010, tem alterado a fisionomia e a paisagem alentejanas, avisou a DRCAlentejo para a necessidade de estender a aplicação de medidas de protecção à villa romana de S. Cucufate. O sítio arqueológico que é interpretado como um “testemunho da organização social e económica romana”, e que alguns investigadores consideram como sendo um antepassado dos típicos montes alentejanos, vai ter uma zona especial de protecção em redor das ruínas. A área a ampliar e os imóveis localizados na zona geral de protecção contemplam uma extensão de 50 metros contados a partir dos seus limites externos.  

A estruturação do território hoje Alentejo está de certo modo expressa em S. Cucufate. Paula Amendoeira destaca “os modelos de exploração dos seus recursos, do seu povoamento e organização administrativa, do surgimento, consolidação e afirmação do Cristianismo como religião predominante na nossa História e no nosso território, etc…”

As suas origens estão associadas à época romana, altura em que foi instalada uma villa no centro de uma exploração agrícola. No entanto, acredita-se que a sua ocupação inicial remonte à Idade de Ferro. Por volta de finais do IV milénio, no neolítico final, o local teria sido temporariamente habitado, embora não fosse encontrada qualquer estrutura associada aos materiais arqueológicos dessa época.

O sítio arqueológico de São Cucufate teve, ao longo dos quase dois milénios de ocupação e uso, várias designações e funções. “Foi villa romana, foi mosteiro” no período cristão, observa a directora regional, salientando o desconhecimento que ainda subsiste da sua designação durante o período romano. Da sua reutilização como conjunto religioso cristão “conhecemos duas designações diferentes - S. Cucufate e S. Tiago. Optamos por S. Cucufate por esta ser a designação mais antiga conhecida”, frisa Paula Amendoeira. No período muçulmano (séc. X ou XI) estabeleceu-se no edifício uma comunidade de frades que ali viveu possivelmente até à segunda metade do sec. XII, tendo S. Cucufate por seu padroeiro.

O edifício foi abandonado, no século XVII, talvez por ameaçar cair em ruína. No decorrer das escavações arqueológicas entre 1979 e 1986 descobriu-se nas traseiras da villa o cemitério medieval dos frades.  

Em 1970, as ruínas de S. Cucufate foram identificadas e escavadas por D. Fernando de Almeida, que foi director do Museu Nacional de Arqueologia e Etnografia entre 1967 e 1973, e autor da primeira planta geral da villa. Entre 1979 e 1984, uma equipa de investigadores dirigida pelo arqueólogo Jorge Alarcão, do Instituto de Arqueologia da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, e por Robert Étienne, do Centro Pierre Paris da Universidade de Bordéus, iniciou escavações nas ruínas quase desconhecidas da villa de S. Cucufate.  

“Foi a primeira operação de arqueologia de campo efectuada em Portugal”, refere o arqueólogo Vasco Gil Mantas, no trabalho que publicou sobre a Implantação rural romana em torno da Villa de S. Cucufate.

A área então abrangida pela prospecção sistemática realizada entre 1979 e 1984 ultrapassou os 2000 hectares e teve como resultado a identificação de “60 sítios com vestígios romanos, 11 casais rústicos, 42 sítios secundários e duas pedreiras de granito.” 

A cultura da vinha, da oliveira e dos cereais, sem esquecer a pecuária, terão sido as principais actividades, assim como o fabrico de cerâmica, fundição de ferro e exploração das pedreiras. Estas definem a importância deste testemunho da implantação rural romana na região hoje Alentejo.

A qualidade dos materiais recuperados nas sondagens em alguns dos locais abrangidos pela prospecção reflectem a existência de um “razoável nível de vida”, refere Gil Mantas, admitindo que nos dois primeiros séculos do Império Romano no território chamado hoje alentejano “não existia ainda o verdadeiro latifúndio”, um modelo de propriedade que se terá “desenvolvido gradualmente em especial a partir do século III” e que se mantém nos dias de hoje.

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