Explosão em Beirute: Interpol emite mandado de captura contra português. Empresa diz que “não está fugido”

Comerciante visitou armazém do Porto de Beirute, onde estava armazenado o nitrato de amónio que provocou destruição. “O senhor Moreira está a trabalhar tranquilamente, não está fugido”, garante fonte oficial da empresa onde trabalha o visado neste mandado.

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Explosão em Beirute matou 200 pessoas e feriu mais de 6000 Reuters/MOHAMED AZAKIR

A Interpol emitiu três mandados de captura a pedido do procurador que investiga a explosão do Porto de Beirute que matou 200 pessoas, em Agosto do ano passado. Um dos visados é o português, Jorge Moreira, que é comerciante de nitrato. Para além do português, foram alvo desta medida dois russos, o proprietário e o capitão do navio que carregava as 2750 toneladas de nitrato de amónio responsáveis pela explosão.

Um responsável da Fábrica de Explosivos de Moçambique (FEM), empresa onde trabalha Jorge Moreira, garante ao PÚBLICO que este não foi contactado pelas autoridades libanesas, mostrando-se, contudo, totalmente disponível para prestar os esclarecimentos necessários. “O senhor Moreira está a trabalhar tranquilamente, não está fugido. Não foi contactado nenhuma vez pelas autoridades libanesas, mas está completamente disponível [para prestar esclarecimentos]”, explica esta fonte.

O nitrato de amónio destinava-se à FEM, que é propriedade da empresa portuguesa Moura & Silva, da Póvoa de Lanhoso, e que o comprou à fábrica Rustavi Azot, sediada na Geórgia. O negócio, porém, nunca chegou a ser concretizado, uma vez que a carga só seria propriedade da empresa quando chegasse ao seu destino, a cidade moçambicana da Beira, o que nunca aconteceu.

Em 2014, Jorge Moreira visitou o armazém do Porto de Beirute onde o material explosivo foi armazenado. Fonte da FEM confirma a visita do funcionário à capital libanesa, não conseguindo precisar o mês em que essa aconteceu: “Foi por essa altura, fim de 2013, início de 2014. É só [as autoridades libanesas] verem no papel.”

Posteriormente, a empresa enviou um comunicado oficial ao PÚBLICO onde garantiu que esta viagem mencionada pelas autoridades “é usual em termos de acompanhamento de cargas encomendadas e, obrigatória nas regras de boa gestão quando o fornecedor está em incumprimento”. A FEM adiantou ainda que o colaborador "foi fazer o que lhe competia”.

Os documentos emitidos pela Interpol e distribuídos pelas autoridades mundiais, que pedem que os visados sejam localizados e detidos, foram pedidos pelo procurador libanês Ghassan Khoury. Os russos procurados são o empresário que em 2012 comprou o navio de carga MV Rhosus, que no ano seguinte levaria o nitrato de amónio até Beirute, Igor Grechushkin, e Boris Prokoshev, que era na altura capitão do navio.

Segundo explicou em Agosto ao PÚBLICO um porta-voz da empresa, a carga ainda não era sua, já que só seria paga quando chegasse ao seu destino, a Beira, no Centro de Moçambique. “O nitrato não era da empresa FEM. Era do vendedor. Seria vendido à FEM quando chegasse a Moçambique”, afirmou. “Esta foi uma encomenda normal, de uma matéria que a empresa utiliza na sua actividade comercial, cumprindo sempre de forma escrupulosa todos os requisitos legais e melhores práticas internacionais”, explicou ainda.

As más condições do Rhosus ajudam a explicar porque é que a carga nunca chegou ao destino e acabou por provocar a tragédia em Beirute.

Em Julho de 2013, um ano depois de o navio ser comprado por Grechushkin, uma inspecção no Porto de Sevilha detectou-lhe 14 deficiências, desde convés enferrujado até reduzida segurança anti-incêndio. Mesmo assim, partiu no que seria a sua última viagem, saindo do Porto de Batumi, na Geórgia, a caminho da Beira. Quando o empresário russo deixou de pagar à tripulação, esta abandonou o navio, na Turquia, onde entrou um capitão novo.

Entretanto, o Rhosus aceitou nova carga (alegadamente para pagar a passagem no canal do Suez), umas máquinas que se soltavam devido ao estado do navio. Assim chegou a Beirute, de onde já não saíu, com as autoridades a apreenderem a embarcação por causa de dívidas no valor de cem mil dólares. O capitão e os responsáveis pelas máquinas, ucranianos, foram obrigados a permanecer no interior até 2014.

Do incidente resultaram mais de 6000 feridos e a destruição de uma parte significativa da cidade. O nitrato de amónio, substância altamente explosiva, estaria armazenada no porto há mais de seis anos “sem medidas cautelares”, afirmou o primeiro-ministro libanês, Hassan Diab, após o desastre. 

Desde a explosão foram detidas 30 pessoas. A violência foi tal que o porto ficou com uma cratera com 43 metros de profundidade.

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