Um Presidente pode demitir ministros?
A frase
“Um Presidente não pode exonerar ministros sem ser sob proposta do primeiro-ministro”
Marcelo Rebelo de Sousa
O contexto
Marcelo disse no debate com André Ventura que não podia demitir a ministra da Justiça, embora tenha sugerido explicitamente que a ex-ministra da Administração Interna Constança Urbano de Sousa tinha saído do cargo por sua influência. No dia seguinte, António Costa respondeu a Marcelo: “Compete exclusivamente ao primeiro-ministro escolher e indicar os membros do Governo e é perante o primeiro-ministro que cada ministro responde”.
Os factos
Ao “enxotar” Marcelo desse poder, a resposta de Costa está em linha com a Constituição. O Presidente pode demitir o Governo quando estiver em causa aquilo a que a Lei Fundamental chama “o regular funcionamento das instituições”, mas só nomeia e exonera ministros por proposta do primeiro-ministro. Mas há precedentes de pressões de Presidentes para a saída de ministros. A mais conhecida é a demissão de Armando Vara, em Dezembro de 2000, de ministro da Juventude. Jorge Sampaio queria ver Vara fora do Governo depois de ter vindo a público que tinha criado uma polémica Fundação para a Prevenção e Segurança no tempo em que era secretário de Estado da Administração Interna. Jorge Reis Novais, constitucionalista e então consultor do Presidente contou os bastidores dessa polémica, há três anos, no lançamento do segundo volume da biografia de Jorge Sampaio, de José Pedro Castanheira. “Pediu-me que fizesse um esboço de uma declaração a pressionar a demissão de Vara para ser divulgada a seguir à audiência [com o então primeiro-ministro António Guterres]. Mas para surpresa de Sampaio, Guterres já vinha com uma proposta nesse sentido”. Sampaio disse no final da audiência ao seu conselheiro: “Se não houver demissões não estou em condições de ficar calado porque há comportamentos inaceitáveis num Estado de Direito”. No dia seguinte, estava Sampaio em campanha eleitoral para o segundo mandato, recebe o telefonema de Guterres a comunicar a demissão de Armando Vara e de Luís Patrão, que era na altura o secretário de Estado da Administração Interna – e que este ano foi indicado pelo PS para o conselho fiscalizador das secretas, mas acabou por retirar a candidatura.
Conclusão
A frase é só parcialmente verdadeira. Se a Constituição é explícita, é politicamente insustentável um ministro manter-se no cargo se o Presidente “não ficar calado”, como ameaçou Sampaio – ou seja, revelar publicamente a sua falta de confiança no governante.