Ventura e Le Pen juntos contra o islamismo e o fluxo de imigrantes
Líder do Chega convidou a presidente do Rassemblement National para o arranque da campanha e os dois políticos não se pouparam em elogios mútuos.
André Ventura e Marine Le Pen juntaram nesta sexta-feira a voz contra a imposição de Bruxelas aos Estados-membros para abrirem as portas da Europa aos imigrantes e suas famílias, e pelo combate ao islamismo, que classificaram de ideologia “totalitária” que quer pôr em causa a construção europeia. Os dois líderes de partidos da extrema-direita – embora Ventura recuse tal classificação para ambos – alinharam na crítica às políticas de imigração e de asilo europeias, com Marine Le Pen a deixar farpas a António Costa por defender a entrada de imigrantes para ajudar a resolver o problema demográfico do envelhecimento europeu. “Os europeus devem mobilizar-se contra a imigração”, pediu a controversa política francesa.
Numa conferência de imprensa conjunto realizada num hotel no topo da Avenida da Liberdade, Le Pen não se cansou de elogiar Ventura pela ascensão meteórica do Chega, e o candidato português retribuiu. Considerou-o um “chefe político forte e talentoso que em dois anos soube criar um movimento político promissor”; ele disse que “Le Pen tem sido uma lutadora pela Europa que acreditamos que é possível, de matriz cultural e cristã e de identidade, contra a imigração descontrolada.”
André Ventura assinalou o simbolismo da vinda de Marine Le Pen para o arranque da sua campanha. Os partidos que lideram – o Chega e o Rassemblement National (até 2018 designava-se Frente Nacional) estão filiados no Partido Identidade e Democracia (ID Party) europeu – têm “projectos e ideias comuns para a Europa, que seja essencialmente dos europeus, de quem trabalha, de quem se quer integrar, de quem paga impostos, dos que se esforçam para manter a identidade europeia e não dos que vêm para a Europa apenas para beneficiar do sistema económico e de segurança social sem aceitar qualquer tipo de integração”, descreveu o deputado português.
Que fez questão de assinalar que os estão a construir um “projecto europeu contra o pacto das migrações, contra uma imigração descontrolada, contra subsidiodependências, contra o aumento da criminalidade generalizada em alguns Estados europeus e contra a destruição da matriz cultural cristã da Europa”.
Marine Le Pen fez questão de vincar que o Chega e o RN são partidos “parceiros e aliados, mas não clones nem cópias”. Salientou que os milhares de portugueses que foram para França trabalhar “honraram Portugal pelo seu civismo, trabalho e espírito empresarial” que tanto contribuiu para a economia francesa, e falou de reconhecimento e afeição por muitos terem escolhido tornar-se franceses e “enriquecerem a economia e sociedade”. Uma hora depois, no entanto, haveria de defender que não cabe à escola francesa ensinar a língua portuguesa – essa é uma “tarefa da família”, a da transmissão da cultura, enquanto a escola é para “aprender a escrever e ler em francês”.
A política e eurodeputada francesa disse trazer, nesta sua primeira vinda a Portugal, uma “mensagem de fraternidade, paz, convicção partilhada de esperança” e considerou o Chega um “grito do coração e exaltação à razão; um sinal do céu” porque acabou com a “incongruência” que era manter Portugal “à margem das grandes aspirações” nacionais, enquanto as forças nacionais se levantavam nos outros países europeus.
Avisou que numa altura em que Portugal vai presidir à União Europeia durante este semestre, “os patriotas portugueses não podem ignorar que o seu voto vai ter grande significado”. E recordou que António Costa defende a necessidade de abrir as portas da Europa a imigrantes que ajudem a resolver o problema da demografia, com medidas como a relocalização dos migrantes e o reagrupamento familiar. “Os europeus devem mobilizar-se contra a imigração”, avisou, lembrando que é um acto de soberania cada país decidir sobre quem deixa entrar. “Amigos portugueses, não deixem que isso aconteça; defendam o vosso país, a vossa História, as vossas crianças e a Europa”, apelou.
Questionada por jornalistas franceses, Marine Le Pen defendeu um projecto de luta contra o islamismo que o seu partido vai apresentar no Parlamento francês. Porque é uma “ideologia totalitária que avança com a esperança de tomar conta da nossa república”, argumentou, acrescentando que o direito de asilo em França tem sido usado como “uma nova via de entrada de imigração”. Na sua maioria “são falsos pedidos de asilo e quando não lhes é concedido ficam em França em vez de serem reenviados para o seu país”.
André Ventura saiu em defesa de Le Pen alegando que não se pode “confundir” os refugiados com a “ameaça do islamismo que quer destruir sobre a Europa”. E aproveitou para falar num alegado caso de um terrorista com mandado que foi preso em Portugal quando estava a levantar o cheque da segurança social.
Questionados sobre a invasão do Capitólio e sobre o apoio que chegaram a dar a Donald Trump, os dois dirigentes foram cautelosos. Ventura condenou qualquer “acto de violência sobre instituições, incluindo esta no Capitólio” por acreditar na “democracia pelo voto e pela escolha dos eleitores”. Mas admitiu que Joe Biden pode ser um “perigo” para o mundo porque pretende reforçar a relação com a China em vez da Europa e trará à superfície as “velhas questões étnico-raciais” que têm minado a América. “Temos experiências de governos liberais, socialistas e até na Grécia, com o Syriza, em que a lógica da esquerda muito libertária não ajudou à reconstrução dos países.”
Marine Le Pen fez questão de garantir que “nunca” admirou Trump ainda que a sua reeleição fosse melhor para os interesses da França. “Condeno de forma firme a intrusão e pilhagem no Capitólio. Há direito de contestar nos tribunais mas não se pode usar a violência para forçar o funcionamento democrático.”
Depois da conferência de imprensa - marcada por um boicote das televisões e parte dos jornalistas franceses por falta de distanciamento social dentro do auditório -, Marine Le Pen e André Ventura foram levar uma coroa de flores à estátua que homenageia os mortos portugueses na Primeira Guerra, sob os olhares de alguns apoiantes - incluindo a actriz Maria Vieira. Já na calçada da Avenida da Liberdade, Ventura recusou que o Chega e o RN se revejam no conceito de extrema-direita e criticou os que assim os apelidam mas não chama extrema-esquerda aos partidos comunistas. Em defesa de Le Pen lembrou que há luso-descendentes nas fileiras do RN. E ofereceu-se já para “ir a França apoiar Marine Le Pen e fazer trabalho junto das comunidades emigrantes portuguesas para que ela seja a próxima Presidente francesa”.