O Reino Unido continuará aqui ao lado
Um Reino Unido forte, estável e cooperante com a Europa é o que mais interessa à União e ainda mais a um pequeno país como Portugal. A História não acabou e o papel dos britânicos na arbitragem ou no equilíbrio dos conflitos de interesses das potências continentais também não.
O último dia do ano marca o fim de uma era na União Europeia e no Reino Unido. Ainda vamos investir muito tempo a discutir as entrelinhas do acordo que, finalmente, concretiza o “Brexit”. Ou a indagar sobre se é melhor ter um parceiro externo confiável e empenhado ou um Estado-membro duvidoso a criar ruído permanente no seio das instituições europeias. Ou até a reconhecer que a história do “Brexit” foi escrita por instintos soberanistas que, como observou a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, não fazem sentido no século XXI.
Como balanço rápido, um consenso: se o Reino Unido foi o elo mais fraco nas negociações e acabou por ser o grande perdedor do acordo, também a União Europeia fica mais frágil sem os pergaminhos democráticos, a força da ciência, o músculo financeiro ou o poder militar dos britânicos.
Chega por isso a hora de esquecer as feridas do “Brexit” e lançar pontes para que a nova relação entre as duas orlas do canal seja intensa, amigável e proveitosa para todos. Longe do mercado único ou do Parlamento Europeu, o Reino Unido não deixará de ser um actor crucial da História do continente.
Se o “Brexit” foi um compêndio de mentiras, se a sua fonte são miragens de uma liberdade reconquistada, se as suas fragilidades ficaram expostas nos termos finais do acordo, convém que no futuro se evitem novos conflitos, sejam judiciais, administrativos ou políticos. Se ao nível interno a realidade britânica vai ser difícil, pela perda do fulgor do seu mercado financeiro, pelo expectável recuo da economia ou pelas tensões separatistas cada vez mais evidentes na Escócia, a União Europeia deve empenhar-se em providenciar ajuda, em vez de acreditar que a punição é a justa recompensa para a arrogância de Londres.
Um Reino Unido forte, estável e cooperante com a Europa é o que mais interessa à União e ainda mais a um pequeno país como Portugal. A História não acabou e o papel dos britânicos na arbitragem ou no equilíbrio dos conflitos de interesses das potências continentais também não. Se a União funcionou como um bloco nas negociações para o “Brexit”, se a Alemanha e a França perceberam que o saudosismo dos impérios passados é um anacronismo na era global, o último século é a prova de que a proximidade britânica é sempre positiva para a Europa.
De resto, o mundo dá muitas voltas e pode ser que os britânicos queiram a médio prazo regressar à família europeia que integram por direito próprio. Ajudar a que tenham sucesso nesta nova etapa é também o primeiro passo para lá chegar. Não vai ser fácil.