Só com uma pandemia que fechou meio país em casa é que Portugal poderá conseguir, eventualmente, atingir as metas de redução da sinistralidade rodoviária inscritas no Plano Estratégico Nacional de Segurança Rodoviária em vigor, o PENSE 2020. No último ano “normal”, o de 2019, mais 626 pessoas morreram nas nossas estradas e ruas, e se isso significa uma diminuição das vítimas mortais, face a 2018 o próprio presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária recorda que estes números são equivalentes à queda de três aviões A320. E, na verdade, o número de acidentes com vítimas continuou a subir. 

Quase a terminar 2020, a ANSR publicou esta segunda-feira o relatório anual de 2019, com dados nacionais e vítimas a 30 dias. Como se estimava, o número de mortos anunciado no início do ano (472, contados com base nas estatísticas das primeiras 24h após os sinistros) pecava por defeito. O obituário é bem mais longo e foram afinal 626 as mortes contabilizadas ao final de um mês, o que significa que as sequelas de atropelamentos, choques e despistes, entre outros eventos rodoviários, foram fatais para mais 154 pessoas.

Acidentes com vítimas aumentam

Aliás, ao mesmo tempo que se registou uma quebra no número de mortes anuais (que foram menos 9% que as 675 vítimas mortais de 2018), quanto a feridos graves o panorama acabou mesmo por piorar (foram 2168, mais 9%) e o mesmo aconteceu com os números de feridos ligeiros (mais 4%). Aliás, “após uma descida ao longo das últimas três décadas, desde 2013 que o número de acidentes com vítimas em Portugal Continental tem vindo a aumentar de forma quase constante”, assinala a ANSR. 

Segundo esta autoridade, “Em 2017 registou-se um aumento mais expressivo, compensado por uma ligeira diminuição em 2018. O ano de 2019 não foi excepção, registando-se um aumento de 4% no número de acidentes com vítimas face a 2018, num total de 35.704 acidentes, e um aumento de 3% no número de acidentes com vítimas mortais e/ou feridos graves (2.421)”. A ANSR estima que o custo económico e social destas mortes e do tratamento dos sobreviventes ronde os 3,7 mil milhões de euros, o que equivale a 1,6% do Produto interno Bruto português.

Olhando para os últimos 25 anos, a ANSR assinala que “Entre 1995 e 2019, os investimentos em infra-estruturas e em veículos mais seguros, juntamente com uma política integrada de segurança rodoviária, foram decisivos para salvar 26 mil vidas e evitaram 187 mil feridos graves, que, em termos de custos económicos e sociais da sinistralidade rodoviária, representam mais de 4,5 vezes o valor investido em infra-estruturas rodoviárias mais seguras”.

Um cada cinco mortos era peão

Os dados indicam ainda que entre 2000 e 2018 Portugal reduziu 58% o número de vítimas mortais por milhão de habitantes, posicionando-se em 11.º lugar na lista dos países que mais reduziram o número de vítimas mortais. Ainda assim o país continua, neste indicador, quatro pontos percentuais acima da média da UE a 28 países. E a menos que a pandemia tenha continuado a fazer regredir o número de acidentes e respectivas consequências para lá do que seria expectável, Portugal ainda se arrisca a falhar duas das metas mais ambiciosas e alegadamente “exequíveis” do PENSE 2020. 

Na estratégia, o país deveria em 2020 reduzir para 41 o número de mortes nas estradas, por milhão de habitantes – em 2019 essa taxa foi de quase 61 mortes por milhão. Propunha-se também conseguir baixar os números anuais de feridos graves para 178 vítimas por milhão de habitantes, mas este indicador cifrou-se nos 210 por milhão, no ano passado.

Detalhando a circunstância das vítimas face aos sinistros, a ANSR explica que 61% das vítimas mortais eram condutores (383), 17% passageiros (109) e 21% peões (134). Nos feridos graves, 64% das vítimas mortais são condutores (1.391), 19% peões (409) e 17% passageiros (368). Comparativamente a 2018, o número de peões vítimas mortais baixou de 156 para 134 (-14%), nota a autoridade, dando conta que “os mais idosos, acima dos 75 anos, continuam a ser os mais afectados pelos acidentes tanto ao nível das vítimas mortais como feridos graves”.