Covid-19: medidas de contenção atingiram cultura mais do que previsto, alerta a UNESCO
Documento da UNESCO é um guia prático para ajudar os governos a enfrentar os desafios que os artistas e os profissionais culturais enfrentam e oferece conselhos sobre como reforçar a resiliência das indústrias criativas no futuro.
A UNESCO alertou esta segunda-feira que as medidas de combate à covid-19 atingiram o sector da cultura mais duramente do que o esperado, depois de ter avaliado a actuação dos governos para responder ao impacto da pandemia.
A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO, na sigla em inglês) avaliou as restrições impostas pelos governos para fazer face à covid-19 nos profissionais da cultura e no sector como um todo, e concluiu que o impacto terá sido mais severo do que anteriormente assumido, de acordo com os dados recolhidos pela organização e vertidos num novo guia de políticas.
Na indústria cinematográfica, estima-se que em 2020 se tenham perdido dez milhões de postos de trabalho, enquanto um terço das galerias de arte terá reduzido o seu pessoal para metade durante a crise.
Um encerramento de seis meses poderá custar à indústria musical mais de 10 mil milhões de dólares em patrocínios perdidos, enquanto no mercado editorial mundial é esperada uma diminuição de 7,5% devido à crise provocada pela pandemia.
Em resposta à crise, que levou ao encerramento de muitos cinemas, teatros e livrarias e privou artistas de oportunidades profissionais, a UNESCO desenvolveu ferramentas para os decisores, que foram publicadas em formato de guia de políticas a adoptar, intitulado “Cultura em Crise: Um Guia de Políticas para um Sector Criativo Resiliente”.
O documento é simultaneamente um guia prático para ajudar os governos a enfrentar os desafios que os artistas e os profissionais culturais enfrentam, mas que oferece também conselhos sobre como reforçar a resiliência das indústrias criativas no futuro. “O sector, que representa 30 milhões de empregos, está a lutar pela sobrevivência e precisa da nossa ajuda. A cultura tem-nos ajudado a sair da crise. Agora temos de ajudar a cultura e apoiar a diversidade à qual a cultura deve a sua força”, afirmou a directora-geral da UNESCO, Audrey Azoulay.
Como lembra a organização, os artistas são frequentemente empregados informalmente e deixados para trás, e as mulheres, que detêm a maior proporção de empregos precários nos sectores das artes e da cultura, são particularmente vulneráveis à insegurança social e económica.
A UNESCO, que promove acções específicas para alcançar a igualdade de género nestas áreas, apresenta 15 medidas-chave para abordar o impacto da covid-19 no sector cultural.
O guia apresenta os três principais tipos de acções adoptadas pelos governos de todo o mundo: apoio directo aos artistas e profissionais da cultura, apoio indirecto às indústrias culturais e criativas, e reforço da competitividade das indústrias culturais e criativas.
Como exemplo, refere o Uruguai e o Zimbabué, que estabeleceram fundos para apoiar artistas, as Filipinas, que forneceram assistência financeira individual a centenas de trabalhadores culturais afectados pelas restrições da quarentena, ou a Alemanha e os Emirados Árabes Unidos, que encomendaram e adquiriram obras de arte como forma de alívio e criação de rendimentos para os artistas.
“Não só devemos apoiar financeira e politicamente a cultura, como também devemos dar-lhe um lugar à mesa das negociações políticas”, considerou o director do teatro Omar Abiazar, no webinar da UNESCO ResiliArt Líbano, de 10 de Setembro.
Desde o pico do surto pandémico, têm sido realizados concertos e festivais online. Estudos demonstram que a covid-19 acelerou esta mudança, reduzindo, em estimativa, para três meses, desenvolvimentos que de outra forma teriam levado cinco anos.
No entanto, o guia da UNESCO alerta que cerca de 46% da população mundial não tem acesso a ligação à Internet, privando quase um em cada dois indivíduos do acesso às artes durante o confinamento.
Em resposta à pandemia, a UNESCO lançou um exercício de monitorização global para avaliar, entre outras coisas, o impacto da pandemia no sector cultural, com uma ferramenta sob a forma de um boletim semanal intitulado “Cultura & Covid-19: impacto e resposta”.
A organização também facilitou uma conversa global entre profissionais e artistas, com mais de 220 debates ResiliArt em mais de 75 países, incluindo consultas com ministérios da cultura, sociedade civil e sector privado. Todos estes constituíram a base do guia para os decisores.