Governo chama autarquias para grupo de trabalho sobre venda de barragens no Douro
Movimento Cultural Terra de Miranda estranha a opção do Executivo. Para garantir os impostos devidos pelo negócio, basta fazer cumprir a lei, notam.
O Ministério do Ambiente e da Acção Climática criou um Grupo de Trabalho com representantes do Governo e dos dez municípios afectados pela venda da concessão de várias barragens da EDP em Trás-os-Montes. A decisão surge na sequência de pressões recentes, por parte de um movimento de cidadania e destas autarquias, para que seja garantido o cumprimento de uma norma do Orçamento de Estado que beneficia, com os impostos do negócio, a região.
Em causa está a transmissão dos Títulos de Utilização de Recursos Hídricos relativos aos aproveitamentos hidro-eléctricos de Miranda, Picote, Bemposta, Baixo Sabor, Feiticeiro e Foz Tua, todos na bacia hidrográfica do Douro, por parte da EDP aos franceses da Engie. O negócio já foi validado pela Agência Portuguesa do Ambiente, mas o Movimento Cultural Terra de Miranda e os municípios, que recentemente se associaram a ele, exigem que o Governo só aprove a transacção a partir de 1 Janeiro de 2021, altura em que entra em vigor o OE e a norma, aprovada por parte da oposição contra o PS, que estipula a criação de um fundo autónomo, a ser gerido localmente, no qual entrariam os impostos decorrentes da venda, e desde logo o imposto de selo, calculado em mais de cem milhões de euros.
O grupo de trabalho é anunciado poucos dias depois de o Ministro do Ambiente ter reagido, em declarações à TSF, à reivindicação feita pelo autarca de Miranda, do direito aos impostos do negócio. Matos Fernandes estranhou o valor que vem sendo referido. “Eu não faço ideia de onde vêm esses cem milhões de euros nem quem os prometeu”, dizia àquela estação de rádio, referindo que o artigo do OE em causa “não refere valor nenhum”.
Já esta semana, o ministério tutelado por Matos Fernandes explica, em comunicado, que “o grupo de trabalho analisará e aprofundará os impactos desta operação e apurará os reais benefícios de que aqueles municípios poderão beneficiar, bem como elencará eventuais medidas que permitam, da melhor forma, executar a norma acolhida na Lei do Orçamento de Estado para 2021”.
Na mesma nota, adianta que o grupo, que terá uma primeira reunião a 28 de Dezembro, em Miranda do Douro, integrará ainda representantes dos Ministérios das Finanças e da Modernização do Estado, de organismos da administração pública e dos municípios de Alijó, Alfândega da Fé, Carrazeda de Ansiães, Macedo de Cavaleiros, Miranda do Douro, Mirandela, Mogadouro, Murça, Torre de Moncorvo e Vila Flor. Os seus membros terão de apresentar um relatório final no prazo de 90 dias, o prazo estipulado na proposta aprovada pelo Parlamento para regulamentação dos mecanismos de cumprimento da norma que determina a criação do fundo autónomo.
A ser concretizado, este fundo vem garantir o cumprimento de uma reivindicação antiga: a de que a riqueza gerada no território contribua para o desenvolvimento local e regional, e não escoe para Lisboa. Para além da proposta inscrita no OE, e aprovada, os autarcas e o movimento cívico sabem já que Engie pretende criar uma sociedade, a sediar em Miranda, para gerir estes empreendimentos, o que aumentará as receitas fiscais do município.
Atento às movimentações políticas em torno desta questão, o Movimento Cultural Terra de Miranda estranhou a decisão do Ministério do Ambiente, considerando que, para o cumprimento da legislação aprovada, “não seria necessário criar nenhum grupo de trabalho nem fazer estudos. Basta fazer o que o Estado exige a todos os cidadãos comuns, cumprir a Lei”. “Miranda é credora da parte correspondente aos mais de 110 milhões de euros produzidos pelas três barragens do Douro Internacional, e este Movimento exigi-los-á até ao fim”, insistem num comunicado enviado à imprensa.
“Cabe ao Governo garantir que sejam cobrados todos os impostos que a Lei estabelece para o negócio da venda das barragens, nomeadamente o Imposto do Selo e o IMT. E cabe igualmente ao Governo garantir a efectiva aplicação da Lei aprovada pela Assembleia da República, regulamentar a organização do Fundo e transferir para ele todas as receitas previstas, a fim de serem investidas na promoção do desenvolvimento económico das populações onde a riqueza é criada”, repetem, vincando que o prazo de 90 dias previsto na lei “deve ser escrupulosamente cumprido”.