Há um Otro Vítor Sobral para provar em Lisboa, entre perfumes e cocktails
O Otro abriu a dois passos da Avenida da Liberdade em ambiente de luxo e perfumes. Em plena pandemia, o cozinheiro estreou mais duas novas casas em Lisboa: o Dom Roger, na Avenida da República, e uma Padaria da Esquina, no CCB.
São 12h30, de um dia de semana, mas quando abrimos a porta do restaurante e vemos as escadas de mármore escuro debruadas a dourado, assim como todo o ambiente ponteado com veludos verde-esmeralda, conseguimos imaginá-lo à hora do jantar, quando não for preciso estar a olhar para o relógio, com medo que batam as 22h30, hora em que, para já, a magia se quebra e regressamos à realidade da pandemia.
O Otro, mesmo por trás da Avenida da Liberdade, em Lisboa, é daqueles espaços que gritam por vermos e sermos vistos, de preferência bem vestidos. Daqueles em que a música pode estar alta e dificultar a conversa, já a pensar nas noites futuras em que chegamos e bebemos um cocktail antes de jantar, ou bebemo-lo depois, antes de continuarmos a festejar noutro sítio. Mas, naquele início de tarde, com o restaurante aberto intencionalmente para receber os jornalistas, a música está um pouco mais baixa para que possamos ouvir Vítor Sobral.
À mesa, uma equipa da La French Radio pergunta ao chef qual é o conceito deste novo espaço. Em francês, Vítor Sobral sintetiza: “C'est pour le nouveau riche”, brinca o cozinheiro. Os espelhos foscos, os candeeiros dourados, assim como os talheres, os copos Riedel, os pratos - um diferente para cada escolha feita pelo cliente -, e os perfumes que podem chegar à mesa numa cápsula de fumo para serem comprados, tudo confirma as palavras do cozinheiro. Mas a jornalista corrige-o: “É um espaço trendy.”
Trendy e luxuoso, assim é o conceito do grupo Otro, que alia a arquitectura e design de interior ao segmento de perfumaria de nicho e à alfaiataria. Hugo Banha, o empresário à frente deste grupo, decidiu aliar-se a Vítor Sobral, responsável pela ementa e formação da equipa de cozinha deste novo espaço, que abriu em Outubro. Um restaurante em que todas as mais-valias dos outros ramos de negócio do grupo foram usadas. O mais óbvio é a decoração do espaço, os perfumes estão expostos junto ao lavatório com torneiras douradas, na casa de banho; e há pormenores como as fardas elegantes dos empregados.
Foie gras no bacalhau
Vítor Sobral orgulha-se da carta que criou para este espaço onde os produtos são de uma qualidade superior. O comunicado de imprensa garante que “os ingredientes mais nobres do mundo” estão concentrados na carta do restaurante: “do caviar ao foie gras e à trufa, assim como os portugueses – dos carabineiros aos lavagantes aos camarões tigre ou ao queijo do Pico”.
Depois do couvert (pão de trigo, pão de alfarroba e bolota, azeitonas de piso marinadas e queijo de ovelha em azeite virgem extra e alecrim, 3,80 euros), chega à mesa um carpaccio de novilho, legumes marinados, vinagrete de trufas e cogumelos (19,50 euros). Segue-se um bacalhau fresco confitado, com foie gras, puré de batata e trufas (25 euros). A equipa da rádio francesa grava um vídeo e pergunta ao chef se o que gosta é de trabalhar os peixes, afinal a carta está dominada pelos produtos do mar.
O prato que mais sai é o arroz de carabineiros, línguas de bacalhau, tomate assado, poejo (38 euros), revela Sobral, mas é o bacalhau que domina a carta. Entre as entradas há pastéis de bacalhau, ovas de salmão e emulsão de salsa (14,50 euros), moqueca de línguas de bacalhau, malagueta fresca, gengibre, lima (16 euros). Depois, pelos pratos principais as propostas são: bacalhau no Forno, lavagante, mandioca, coco e especiarias (35 euros); tranche corada de bacalhau fresco, pimenta verde e alcaparras, puré de espinafres e wasabi (23,50 euros); bacalhau com todos (25 euros) e lombo de bacalhau, molho de caldeirada, batata-doce e hortelã (26 euros).
O segredo para fazer a carta do Otro é respeitar o seu público. “Um cozinheiro tem de ter a capacidade de se adaptar ao público”, diz Vítor Sobral , que já editou 24 livros de cozinha, um deles com 50 receitas de bacalhau, acrescentando que é mais “apologista da mão de vaca com grão do que do bacalhau com foie gras”. “Se o público quer comer mão de vaca, moelas... não é aqui. Aqui é para vir à noite, ouvir música, beber um cocktail... E comer bem!”
Mas também há carne, experimentamos uma maturada com batatas que são cozidas a vapor durante 40 minutos e depois fritas. Sobral orgulha-se da sua salada de tomate, aquele é descascado – “como a minha mãe e a minha avó faziam” – e a cebola roxa fica a marinar em sal e vinagre durante meia hora. Esta é uma carta que, além da cozinha portuguesa, procura homenagear a lusófona, do Brasil a África, passando pela Ásia, enumera Sobral, quando pede para trazerem à mesa cacau de São Tomé e Príncipe.
E entramos nas sobremesas: mousse de chocolate com pistácio, cacau torrado (6,50 euros), pudim de chá verde, creme de maracujá e gengibre (7,50 euros), creme queimado, champanhe e fava tonka (8,50 euros) e queijo amanteigado do Pico, mel trufado, amêndoas torradas (9,50 euros). O café é Delta biológico.
E a concorrência? São os restaurantes mais luxuosos da Avenida da Liberdade? Vítor Sobral contorna a pergunta da Fugas: “É onde se come bem!”